São Paulo, domingo, 28 de agosto de 2005

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Após carreira "no grito", operador tenta vaga em corretoras

DA REPORTAGEM LOCAL

"Vejo com muita tristeza isso que está acontecendo. É um pedaço da minha história que vai ser enterrada." Luiz Spósito, 66, é o símbolo do desconsolo por que passam operadores de diferentes épocas que ganharam a vida "no grito" por muito tempo.
Spósito começou a trabalhar no mercado em 1960. Hoje é um dos pouco mais de 40 operadores que pouco têm o que ainda fazer no pregão da Bovespa. Futuro?
"Na minha idade, não sei de que forma serei reaproveitado na corretora em que trabalho. Como já sou aposentado, nem acho que meu caso seja o mais grave. Mas tem gente aí muito assustada, com uns 40 anos, temerosa de perder o emprego. E é difícil se recolocar no mercado nessa idade."
Para Ramiro Lopes, diretor-executivo do Simc (Sindicato dos Trabalhadores do Mercado de Capitais de São Paulo), o fim do pregão viva-voz vai gerar mais desemprego entre os profissionais da área.
"Muitos profissionais foram demitidos e hoje têm que atuar como autônomos, pois durante mais de 20 anos viveram dentro do mercado e só sabem fazer isso", disse Lopes.
Além de fazer sua vida no mercado, Spósito viu dois de seus filhos seguirem o mesmo caminho. Mas os filhos do operador -possivelmente o profissional com mais tempo de mercado- já não atuam no pregão viva-voz, mas dentro das corretoras.

Saudades
Spósito mostra grande nostalgia ao relembrar momentos que passou no pregão da Bolsa. "Quando havia um fato novo, como a descoberta de um poço da Petrobras, a correria era imensa. Já vi gente perder sapato, derrubar mesa, cair no chão, tudo na tentativa de fechar um negócio."
Segundo o conselheiro da Bovespa e diretor da corretora Bradesco, Aníbal Santos, a desativação do viva-voz atende ao desejo das próprias corretoras. Além disso, o sistema tem hoje uma representatividade muito pequena no total de negócios.
Santos afirma, porém, que muitos dos operadores que atuavam no viva-voz foram realocados pelas corretoras, passaram a atuar no pregão da quase vizinha BM&F ou foram absorvidos pela própria Bovespa no programa de popularização do mercado de ações "Bolsa Vai até Você".
O diretor do Simc afirma, porém, que os operadores que saíram do pregão para participar do programa da Bolsa paulista reduziram "significativamente" seus rendimentos. "Mas não adianta querer lutar contra uma tendência mundial. Não tem como ser contra o avanço do sistema eletrônico", conclui Santos.
Para Spósito, aposentar símbolos da Bolsa de Valores como o telefone sem fio sempre à mão (com o qual se entra em contato com a mesa de operações da corretora) não vai ser uma tarefa simples. "Minha história se confunde com quase 40% da história da própria Bovespa", afirma.

Rotina ainda viva
Na BM&F, onde ainda há um pregão viva-voz bem ativo, o dia-a-dia do operador é dividido em duas etapas: a primeira vai das 10h às 13h, e a segunda, das 14h às 16h. "O ideal é não deixar o pregão no horário de negociação. Mesmo uma emergência, como precisar ir ao banheiro, é melhor ser adiada o quanto for possível", afirma Masato Hishijima, operador da BM&F. "Sair do pregão pode significar deixar de fechar um negócio rentável."


Colaborou a Folha Online


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