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GESNER OLIVEIRA
Brasil 2007-10
Na segunda, a atenção passa do programa dos candidatos para o de governo. No lugar de promessas, providências
GRANDES DISTÂNCIAS separam
o programa de um candidato,
de um governante e o que
acontece de fato durante seu mandato. Os temas da campanha presidencial não empolgaram. A menos
de 24 horas da decisão do segundo
turno, há quem esteja mais preocupado com a polêmica sobre se o pãozinho deve ser vendido por peso ou
por unidade do que em saber o que
vai acontecer no país. Mas o economista, assim como o vidente, não
pode fugir da bola de cristal.
O programa de um candidato não
costuma ajudar muito nas previsões
do futuro. As propostas tendem a ser
genéricas o suficiente para não assustar grupos específicos. Lembre-se da campanha de Mário Vargas
Llosa no Peru em 1990, que explicitou a dimensão do ajuste que seria
necessário para a economia peruana. Para o bem da literatura, o escritor foi derrotado pela plataforma
populista do então candidato Alberto Fujimori. Uma vez no poder, esse
último implementou ajustes ainda
mais radicais do que os originalmente propostos por Vargas Llosa.
Assim, temas cruciais para a competitividade das economias latino-americanas se tornam assuntos
proibidos durante as campanhas
eleitorais. O que fazer em países nos
quais as economias clandestinas representam cerca de 40% do PIB, como no Brasil, ou até quase 60% do
PIB, como no caso do Peru, não faz
parte do cardápio dos debates eleitorais. A política é uma menina má.
E a ficção é mais poderosa do que a
economia.
Além disso, o debate eleitoral neste segundo turno foi marcado pela
falsa polêmica da privatização. Não
havia uma proposta concreta de privatizar essa ou aquela empresa. Apenas uma acusação de que o candidato da oposição privatizaria os grandes ícones estatais.
Algo fora da
agenda real, mas que virou o centro
da discussão e foi eficaz eleitoralmente. Enquanto isso, outros temas
foram esquecidos como o projeto de
fortalecimento das agências reguladoras que continua parado no Congresso.
A partir de segunda-feira, a atenção passará dos programas dos candidatos para o possível programa de
governo. Eliminam-se os recursos
de sedução. Não há mais promessas.
Apenas providências a serem tomadas e limitações orçamentárias a serem enfrentadas.
A verdade é que não há script detalhado. Não parece razoável esperar grandes mudanças. Mas uma
coisa é certa: uma guinada na política econômica, uma trajetória como
de Chávez na Venezuela, parece
completamente fora do horizonte.
Lula não tem DNA tenentista.
Preservados o conservadorismo
na política macro e o distributivismo assistencialista na política social, as circunstâncias vão ditar o rumo da política econômica. Os excessos de gastos e as dificuldades de
segmentos específicos do agronegócio estão a exigir medidas urgentes.
Mas não há apetite por parte do Executivo por mudanças profundas
nem condições de formação de ampla coalizão política no Congresso
nessa direção.
Seria difícil imaginar, portanto,
como haveria uma elevação da taxa
de investimento em cerca de quatro
pontos percentuais do PIB como
prevista pelo ministro da Fazenda.
Isso não quer dizer que o processo
de modernização institucional será
paralisado. Isso nunca ocorreu independentemente do governo. Lembre-se de que nos últimos quatro
anos foi editada uma nova legislação
de falências e aprovada a reforma do
Judiciário. Apenas significa que
continuará baixa a velocidade das
mudanças necessárias para ampliar
a infra-estrutura e melhorar as condições de investimento.
Depois das festas de final de ano,
as atenções vão migrar novamente;
desta vez da montagem do novo governo para o desenrolar do segundo
mandato. Aí ocorrerá novo choque
de realidade. Os resultados dependerão da situação da economia
mundial. Tudo indica que o ambiente externo não será tão favorável
quanto nos últimos quatro anos.
Tampouco parece haver um choque
externo no horizonte.
Profissão de vidente não é fácil.
Jucelino Nóbrega da Luz que o diga.
Os economistas são mais cautelosos; preferem trabalhar com probabilidades. A combinação de ausência
de choque externo e continuidade
da política econômica parece o cenário mais provável para 2007-10.
GESNER OLIVEIRA, 50, é doutor em economia pela Universidade da Califórnia (Berkeley), professor da FGV-EAESP, presidente do Instituto Tendências de Direito e
Economia e ex-presidente do Cade.
Internet: www.gesneroliveira.com.br
gesner@fgvsp.br
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