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Estrangeiros avançam no álcool brasileiro
Após expansão eufórica e crise aguda, múltis aproveitam dificuldades para adquirir grandes usinas e já têm quase 20% da produção
Venda da tradicional usina Santelisa para franceses do Dreyfus é o último lance da crescente concentração e internacionalização do setor
MAURO ZAFALON
DA REDAÇÃO
A internacionalização do setor sucroenergético brasileiro
deu mais um grande passo ontem. A tradicional empresa
paulista Santelisa, com 70 anos
e que tinha no comando as famílias Biagi e Junqueira Franco, passou para as mãos do grupo francês Louis Dreyfus, que
já detinha a LDC Bioenergia.
Da união das empresas, com 13
usinas no total, surge a LDC
SEV, da qual 60% serão do gigante francês.
A transferência de mais um
grupo para as mãos de estrangeiros -somada aos novos negócios que estão sendo avaliados- eleva para próximo de
20% a participação externa na
produção do setor, um percentual que veio antes do que se
imaginava e de forma diferente.
Se, no auge da euforia do setor, em 2007, quando o presidente Lula chamou os usineiros de "heróis nacionais e mundiais", imaginava-se que os estrangeiros viriam para investir
em novas fábricas e aumentar a
produção, hoje eles se aproveitam da crise aguda do setor para apenas adquirir ativos tradicionais, como a Santelisa.
E há novos negócios na mira
das multinacionais, como a
compra da Moema pela Bunge.
"Essa é apenas a primeira onda de investimentos estrangeiros", acredita João Sampaio,
secretário da Agricultura de
São Paulo. A segunda será ainda maior e virá com as petrolíferas estrangeiras, que já avaliam o setor. "A segunda onda
virá com investimentos pesados dessas empresas, na compra das atuais ou na formação
de outras", diz Sampaio.
Concentração
Está se concretizando mais
cedo no setor sucroenergético
o que o ex-ministro da Agricultura Roberto Rodrigues costuma definir como "o futuro do
agronegócio brasileiro": concentração e internacionalização. Ao menos dez grupos estrangeiros já estão na produção
brasileira desse setor, entre
eles alguns dos mais atuantes
no segmento de commodities,
como Cargill, Bunge, Teréos,
Adecoagro, Noble Group e até a
petrolífera britânica BP.
Assim, o setor sucroenergético brasileiro toma um rumo
bem diferente do da carne, em
que a associação de empresas
ocorreu dentro do país e, após
criar musculatura, os frigoríficos foram comprar outras empresas no exterior.
No caso do setor sucroenergético, as perspectivas eram
boas tanto no mercado interno
como no externo. Mas a segunda opção não se concretizou no
curto prazo, principalmente
para o álcool.
Embora as empresas ainda
acreditem que essas perspectivas são favoráveis no médio
prazo, a passagem dos últimos
anos foi muito difícil. A Santelisa, formada pela união da Santa
Elisa com a Vale do Rosário e
que tinha planos de expansão,
foi um caso emblemático.
A empresa foi atropelada pela crise vivida não só pelo setor
sucroenergético mas também
pelo estrangulamento do crédito provocado pela crise financeira internacional. Esse estrangulamento veio em um
momento em que muitas delas
estavam muito endividadas.
No caso da Santelisa, a saída
era a venda ou a associação com
outros grupos. Após várias propostas, inclusive da líder Cosan, o negócio foi fechado com
a Dreyfus, criando-se a LDC
SEV, a segunda maior empresa
mundial no setor de energia renovável. A Cosan é a primeira.
Frustração
"Os sentimentos [sobre essa
transferência da empresa] são
muitos", diz André Biagi. E
frustração é um deles. "Parecia
que o álcool ia dominar o mundo. Fizemos várias parcerias,
empurrados pelos investimentos, pelo mercado e pelas perspectivas. Veio a crise, e a empresa foi pega no contrapé. Hoje, vemos que foi uma coisa
muito arrojada", diz ele.
Apesar de sentir frustração
por não ter atingido os objetivos iniciais da Santelisa, Biagi
diz que vê com conforto a saída
menos traumática do que se
imaginava há um ano. "Ganharam o setor, o mercado e os colaboradores", diz ele.
Mas o acordo final não foi fácil. Foram sete meses de negociações e muita dificuldade para chegar a um acerto devido ao
grande número de participantes envolvidos.
A nova empresa tem capacidade de moagem de 40 milhões
de toneladas de cana, 2,7 milhões de toneladas de açúcar e
1,5 bilhão de litros de álcool.
Para se manter entre as líderes do setor, a LDC SEV tem
um plano agressivo de expansão, diz o presidente-executivo,
Bruno Melcher. Por isso, recebeu uma injeção de capital de
R$ 800 milhões do grupo Dreyfus e de investidores financeiros, além de converter dívidas
em patrimônio líquido.
O valor da nova empresa está
estimado em R$ 8 bilhões, e a
companhia se prepara, também, para o lançamento de
ações internamente, assim que
o mercado apresentar condições mais favoráveis.
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