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LIÇÕES CONTEMPORÂNEAS
No banco dos réus
ALOIZIO MERCADANTE
É fantástico. O Banco Central
do Brasil contratou uma empresa de marketing por R$ 15 milhões para "melhorar sua imagem". No mesmo momento, fechou integralmente a fiscalização em todo o Norte e Nordeste e
em mais alguns Estados, sob o
argumento de que não tem recursos para contratar novos fiscais.
Não temos nada contra fortalecer as atividades centralizadas
de supervisão e fiscalização bancária, mas não podemos aceitar
o completo desmantelamento
da fiscalização em regiões tão
vastas e, algumas, marcadas pelas atividades de lavagem de dinheiro do crime organizado e do
narcotráfico.
A fiscalização do sistema financeiro é uma grande questão
nacional. E, pela primeira vez, o
Congresso Nacional, por meio
da Câmara dos Deputados, derrotou a liderança do governo e
aprovou um projeto de urgência
de decreto legislativo que desautoriza a diretoria do Banco Central e o Conselho Monetário Nacional a desestruturarem a fiscalização financeira nas diversas regiões do país.
Essa é uma questão relevante
porque no atual governo, entre
1994 e 1999, nada menos que 188
instituições financeiras foram
submetidas a regimes especiais
pelo BC. Foram quase R$ 100 bilhões no socorro a instituições
públicas e privadas!
Esse é um dos custos da omissão das diretorias do Banco
Central na fiscalização do sistema financeiro e na previsão de
risco. Mais grave é que parte importante desses recursos de socorro foi para financiar a desnacionalização acelerada do sistema financeiro nacional.
Mas não foi só. No ataque especulativo contra o real, deflagrado a partir da crise financeira promovida pela moratória
russa, os prejuízos foram ainda
maiores.
Nesse episódio, muito mais
grave do que a nossa denúncia
dos casos Marka e FonteCindam
foi o comportamento de grandes
bancos internacionais como
Chase Manhattan e o grupo J.P.
Morgan e Morgan Guaranty
Trust, entre outros, que compraram grandes valores em dólar às
vésperas da desvalorização e depois dirigiram o ataque especulativo contra o real.
Quando analisamos o
"spread" dos bancos, no último
estudo do Banco Central, verificamos que o lucro líquido declarado pelos bancos em alguns
produtos, como o cheque especial, chega a 53% ao ano! Não
há nada comparável em toda a
economia internacional.
O lado mais obscuro dessa política monetária está na conta
CC-5. A CC-5 (carta-circular nº
5) permitiu a compra de dólares
internamente e a remessa para o
exterior. Essa permissão data de
1969, mas era de uso muito restrito, basicamente pela diplomacia brasileira. No governo
Collor, gestão Marcílio-Armínio
Fraga, a carta-circular nº 2.259/
92 aprofundou o processo de liberalização, permitindo aos
bancos estrangeiros manter contas no país por meio das quais
podiam comprar dólares no
mercado flutuante e remetê-los
para o exterior. A ausência de
controle por parte do Banco
Central fez com que essas contas
se transformassem em verdadeiras "barrigas de aluguel", já que
os bancos estrangeiros passaram
a aceitar depósitos em moeda
nacional e remeter dólares para
o exterior.
Em abril de 1996, o governo
FHC, este mesmo governo que
foi agora na Itália pedir controle
sobre as finanças internacionais, com a circular nº 2.677/96,
ampliou esse mecanismo, dispensando qualquer tipo de comprovação nas transferências para o exterior e legalizando, de fato, o mercado paralelo. Para
concluir o processo, nesse mesmo período o Banco Central
concedeu autorização especial
para as agências bancárias de
Foz de Iguaçu receberem depósitos em espécie, sem identificar a
origem. Agora, só falta a propalada conversibilidade plena da
moeda.
A CPI do Narcotráfico já descobriu a lavagem de R$ 15 milhões na CC-5 e em Foz de Iguaçu, vinculados a um dos esquemas do narcotráfico investigados pelos parlamentares. Ocorre
que a CC-5 já remeteu para o
exterior cerca de US$ 125 bilhões
a partir de 1992, sendo cerca de
US$ 70 bilhões recursos de poupança nacional remetidos para
fora por brasileiros.
A Comissão de Justiça e Paz da
Igreja Católica, tendo à frente
seu secretário-executivo, Francisco Whitaker, começa a exigir
a investigação da CC-5. A diretoria do Banco Central convive
passivamente com todo esse processo e tem dinheiro sobrando
para contratar uma agência de
propaganda, mas diz não ter para contratar fiscais, auditores e
analistas.
O Congresso Nacional tem de
apoiar integralmente a CPI do
Narcotráfico, cuja principal tarefa é enfrentar os esquemas de
lavagem do tráfico, mergulhando e desmantelando a CC-5. Paralelamente, devemos exigir que
o Banco Central contrate novos
profissionais para fortalecer as
atividades de supervisão e fiscalização bancária. Mas, principalmente, o governo e sua base
parlamentar precisam permitir
a regulamentação do artigo 192
da Constituição Federal, que estabelece a responsabilidade do
Poder Legislativo em normatizar o sistema financeiro. O Banco Central é poderoso demais
para continuar sem mecanismos democráticos e transparentes de controle social.
Nessa perspectiva, é positivo
que o BC se disponha a rediscutir a questão da fiscalização. Até
porque um enfoque mais adequado nessa área certamente
ajudará a evitar situações que
possam levar membros da direção da instituição ao constrangimento de sentarem no banco
dos réus.
Aloizio Mercadante Oliva, 45, economista e professor universitário licenciado da
PUC e da Unicamp, foi candidato a vice-presidente da República com Lula em 1994,
é deputado federal, presidente da Comissão de Economia, Indústria e Comércio da
Câmara Federal e vice-presidente nacional
do PT.
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