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OPINIÃO ECONÔMICA
Crescer ou morrer
PAULO RABELLO DE CASTRO
Amanhã, reúnem-se , no
Rio, cerca de 2.000 empresários em torno de mais um Enaex,
o 21º Encontro Nacional do Comércio Exterior.
O Enaex tem sido o foro mais
destacado de debates e demandas
em torno das atividades do comércio exterior brasileiro.
Meses passados, o presidente
Fernando Henrique Cardoso redescobriu a exportação: "É exportar ou morrer", disse ele, para, em
seguida, esclarecer que a alternativa da morte seria apenas em
sentido figurativo.
Não precisava fazer a ressalva.
Para o Brasil, é exportar ou morrer, mesmo. O país tem déficit de
comércio exterior, quer dizer, não
se trata apenas de exportar mais,
mas também de importar mais e
gerar divisas para saldar os seus
compromissos financeiros crescentes.
Todo ano, no dia 1º de janeiro, o
Brasil acorda devendo mais de
US$ 20 bilhões em suas transações correntes com o exterior. O
economista atento diria que é até
muito mais, porque nesse déficit
corrente não entram as necessidades de capital para rolar as
amortizações (cerca de US$ 40 bilhões em 2002) da dívida externa
brasileira. Tem gente que acredita que o país já desperta meio bêbado no primeiro dia do ano por
causa do tamanho do seu "contas
a pagar"...
Mas isso é bobagem, pois o que
não falta aqui é vontade de produzir e de exportar. O brasileiro
já demonstrou, um montão de vezes, que sabe correr atrás do prejuízo. Porém, quando faltam os
ingredientes básicos da colaboração governamental, fica tudo
mais difícil.
As exportações da China teriam
crescido cerca de 25 vezes, no último quarto do século, saindo de
US$ 10 bilhões para US$ 250 bilhões, enquanto nossas exportações, que eram de US$ 12 bilhões,
por volta de 1978, cresceram cinco
vezes, alcançando US$ 60 bilhões,
marca respeitável, pelas dificuldades dos nossos exportadores,
mas insuficiente para dar cabo
dos compromissos de dívida por
nós assumidos.
Explicações, há. A China precisa gerar empregos, renda e mobilidade social ascendente para
mais de 1 bilhão de chineses. As
exportações, crescendo num múltiplo de 25 vezes, nos últimos 25
anos, transformaram a China
numa imensa plataforma de produção e progresso. E nós?
Nós, verdade seja dita, ficamos
para trás porque nossas políticas
não foram mais de crescimento, e
sim de inflacionamento e de endividamento.
Portanto crescer e exportar são
quase sinônimos, e a razão disso,
para os economistas, não é novidade: as exportações são como
poupança realizada pela sociedade. Um país poupa quando exporta e quem poupa mais pode
investir e crescer mais.
O chefe da Camex -nossa Câmara de Comércio Exterior-,
Roberto Giannetti da Fonseca,
apontava, há dias, em artigo também assinado por P. Yang e Luiz
Panelli César, que o Brasil é singular na sua incapacidade de mobilizar pequenas e médias empresas (PMEs) para exportar. São
números do Sebrae que mostram
isso: aqui as PMEs são grandes no
emprego da mão-de-obra (67%),
mas só respondem por 1,7% do
volume total exportado pelo Brasil. Por quê? Na Espanha, em Taiwan, na Índia e no Canadá, segundo os autores, as PMEs respondem, respectivamente, por
41%, 48%, 35% e 10% dos seus
fluxos de exportações. Nos EUA,
essa proporção é 30%.
Infelizmente, o artigo não
aponta em sua conclusão, de modo inequívoco, as razões da inibição das nossas pequenas e médias
empresas, em relação às exportações: juros elevadíssimos, crédito
absolutamente escasso, tributação agressiva e fiscalização desatenta aos direitos dos contribuintes (!!), carência de promoção comercial e exigências burocráticas
talebãs.
Diante desse rosário de empecilhos, em que o achaque dos tributos de toda natureza talvez seja o
pior deles, nossos pequenos e médios empresários também podem
ser enquadrados como pobres. Há
empresas pobres no Brasil, e são
essas a grande maioria. O pauperismo também pode atingir pessoas jurídicas!
Trata-se de uma pobreza diferente da carência no plano individual. Mas é pobreza, sim. Empresas pobres, que empregam brasileiros mais pobres ainda. É uma
pobreza institucional, cozinhada
no caldeirão de maldades da política econômica das últimas duas
décadas.
Por tudo isso, uma reflexão se
impõe quando os políticos de
qualquer tendência começam a se
mobilizar para "salvar os pobres"
nos períodos pré-eleitorais.
Pobres somos todos nós, que temos um país ainda incapaz de recuperar uma taxa sustentada de
crescimento de pelo menos 3% ao
ano, quando deveríamos crescer a
5%, quem sabe mais.
Qual será a política antipobreza
dos próximos inquilinos do poder? Redistribuir a pobreza, taxando ainda mais fortemente
centenas de milhares de pequenas
e médias empresas, fazendo-as
mais indigentes e aos seus empregados mais miseráveis ainda?
É preciso redistribuir a riqueza,
não a pobreza. Esse é o desafio, e,
para isso, "crescer ou morrer" deveria ser o lema presidencial.
Paulo Rabello de Castro, 52, doutor em
economia pela Universidade de Chicago
(EUA), é vice-presidente do Instituto
Atlântico (RJ). Escreve às quartas-feiras,
a cada 15 dias, nesta coluna.
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