São Paulo, quarta-feira, 28 de novembro de 2001

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OPINIÃO ECONÔMICA

Crescer ou morrer

PAULO RABELLO DE CASTRO

Amanhã, reúnem-se , no Rio, cerca de 2.000 empresários em torno de mais um Enaex, o 21º Encontro Nacional do Comércio Exterior.
O Enaex tem sido o foro mais destacado de debates e demandas em torno das atividades do comércio exterior brasileiro.
Meses passados, o presidente Fernando Henrique Cardoso redescobriu a exportação: "É exportar ou morrer", disse ele, para, em seguida, esclarecer que a alternativa da morte seria apenas em sentido figurativo.
Não precisava fazer a ressalva. Para o Brasil, é exportar ou morrer, mesmo. O país tem déficit de comércio exterior, quer dizer, não se trata apenas de exportar mais, mas também de importar mais e gerar divisas para saldar os seus compromissos financeiros crescentes.
Todo ano, no dia 1º de janeiro, o Brasil acorda devendo mais de US$ 20 bilhões em suas transações correntes com o exterior. O economista atento diria que é até muito mais, porque nesse déficit corrente não entram as necessidades de capital para rolar as amortizações (cerca de US$ 40 bilhões em 2002) da dívida externa brasileira. Tem gente que acredita que o país já desperta meio bêbado no primeiro dia do ano por causa do tamanho do seu "contas a pagar"...
Mas isso é bobagem, pois o que não falta aqui é vontade de produzir e de exportar. O brasileiro já demonstrou, um montão de vezes, que sabe correr atrás do prejuízo. Porém, quando faltam os ingredientes básicos da colaboração governamental, fica tudo mais difícil.
As exportações da China teriam crescido cerca de 25 vezes, no último quarto do século, saindo de US$ 10 bilhões para US$ 250 bilhões, enquanto nossas exportações, que eram de US$ 12 bilhões, por volta de 1978, cresceram cinco vezes, alcançando US$ 60 bilhões, marca respeitável, pelas dificuldades dos nossos exportadores, mas insuficiente para dar cabo dos compromissos de dívida por nós assumidos.
Explicações, há. A China precisa gerar empregos, renda e mobilidade social ascendente para mais de 1 bilhão de chineses. As exportações, crescendo num múltiplo de 25 vezes, nos últimos 25 anos, transformaram a China numa imensa plataforma de produção e progresso. E nós?
Nós, verdade seja dita, ficamos para trás porque nossas políticas não foram mais de crescimento, e sim de inflacionamento e de endividamento.
Portanto crescer e exportar são quase sinônimos, e a razão disso, para os economistas, não é novidade: as exportações são como poupança realizada pela sociedade. Um país poupa quando exporta e quem poupa mais pode investir e crescer mais.
O chefe da Camex -nossa Câmara de Comércio Exterior-, Roberto Giannetti da Fonseca, apontava, há dias, em artigo também assinado por P. Yang e Luiz Panelli César, que o Brasil é singular na sua incapacidade de mobilizar pequenas e médias empresas (PMEs) para exportar. São números do Sebrae que mostram isso: aqui as PMEs são grandes no emprego da mão-de-obra (67%), mas só respondem por 1,7% do volume total exportado pelo Brasil. Por quê? Na Espanha, em Taiwan, na Índia e no Canadá, segundo os autores, as PMEs respondem, respectivamente, por 41%, 48%, 35% e 10% dos seus fluxos de exportações. Nos EUA, essa proporção é 30%.
Infelizmente, o artigo não aponta em sua conclusão, de modo inequívoco, as razões da inibição das nossas pequenas e médias empresas, em relação às exportações: juros elevadíssimos, crédito absolutamente escasso, tributação agressiva e fiscalização desatenta aos direitos dos contribuintes (!!), carência de promoção comercial e exigências burocráticas talebãs.
Diante desse rosário de empecilhos, em que o achaque dos tributos de toda natureza talvez seja o pior deles, nossos pequenos e médios empresários também podem ser enquadrados como pobres. Há empresas pobres no Brasil, e são essas a grande maioria. O pauperismo também pode atingir pessoas jurídicas!
Trata-se de uma pobreza diferente da carência no plano individual. Mas é pobreza, sim. Empresas pobres, que empregam brasileiros mais pobres ainda. É uma pobreza institucional, cozinhada no caldeirão de maldades da política econômica das últimas duas décadas.
Por tudo isso, uma reflexão se impõe quando os políticos de qualquer tendência começam a se mobilizar para "salvar os pobres" nos períodos pré-eleitorais.
Pobres somos todos nós, que temos um país ainda incapaz de recuperar uma taxa sustentada de crescimento de pelo menos 3% ao ano, quando deveríamos crescer a 5%, quem sabe mais.
Qual será a política antipobreza dos próximos inquilinos do poder? Redistribuir a pobreza, taxando ainda mais fortemente centenas de milhares de pequenas e médias empresas, fazendo-as mais indigentes e aos seus empregados mais miseráveis ainda?
É preciso redistribuir a riqueza, não a pobreza. Esse é o desafio, e, para isso, "crescer ou morrer" deveria ser o lema presidencial.


Paulo Rabello de Castro, 52, doutor em economia pela Universidade de Chicago (EUA), é vice-presidente do Instituto Atlântico (RJ). Escreve às quartas-feiras, a cada 15 dias, nesta coluna.


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