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OPINIÃO ECONÔMICA
Devagar com o andor que o santo é de barro
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
O otimismo , quase militante, de alguns dos principais
analistas econômicos que frequentam a mídia, nestes tempos
de Lula ídolo dos mercados, tomou um banho de água fria com
a divulgação dos dados do crescimento do PIB no terceiro trimestre do ano.
Com o crescimento dos índices
de preços convergindo para a meta de inflação fixada para 2004 e
a redução importante da taxa Selic durante os últimos meses, esperava-se que estivéssemos prontos
para que as portas do Paraíso fossem abertas para nossa economia. Alguns mais açodados chegaram mesmo a se preocupar
com um eventual superaquecimento da atividade econômica e
tiveram pesadelos com uma possível volta da inflação...
Para quem acompanha com
isenção e cuidado o pulsar de nossa economia, a má notícia dada
pelo IBGE sobre a atividade econômica já podia ser antecipada
quando o Banco Central divulgou, dias antes, as informações
sobre o mercado de crédito em
outubro. Elas mostravam, de maneira clara, que a demanda de
crédito no primeiro mês do último trimestre do ano -foco agora
do otimismo inconsequente de
muitos- pouco tinha mudado
em relação aos meses anteriores.
O BC mostrou também que a
redução dos juros, nas operações
com empresas e consumidores, fora marginal e insuficiente para
provocar um estímulo significativo na demanda via crédito mais
barato e mais farto.
O principal erro, que os otimistas incorreram em suas análises
apressadas sobre a intensidade
da volta do crescimento da economia, deriva de uma forma incorreta de relacionar juros e crédito
com o nível de atividade de uma
economia que sofre um longo período de estagnação, como acontece no Brasil. Essa armadilha
ocorre com frequência para aqueles que acreditam que o futuro será sempre uma repetição monótona do passado. Como não levam em conta, em seus modelos
econométricos, as características
específicas de cada momento histórico que se vive, acabam não incorporando fenômenos diversos
que ocorrem ao longo do tempo.
Isso está acontecendo agora no
Brasil e nos Estados Unidos. No
país do Tio Sam, aqueles que têm
procurado reproduzir nos últimos
meses as lições do período 1995/
1994 estão em maus lençóis com
suas previsões incorretas sobre
emprego, renda e juros; aqui no
Brasil, acontece o mesmo com
quem entende estarmos vivendo
uma repetição da retomada do
crescimento, em 2000, e replicam
de uma forma simplista os mesmos acontecimentos.
No caso da maior economia do
planeta, a influência de um mundo global, mais integrado e eficiente, e de uma nova e musculosa China tem feito os modelos
econométricos parecerem mais
biruta de aeroporto do que obras-primas do gênio humano. A já
chamada "jobless recovery" mostra a todos que o fenômeno econômico tem hoje características
novas, as quais as análises e previsões precisam incorporar.
O caso brasileiro é mais simples
e exige apenas um cuidado analítico mais tradicional. A grande
diferença entre a situação atual e
a que caracterizava a recuperação econômica de 2000 está no nível de renda disponível do consumidor, medido tanto no agregado
como no individual.
A carga tributária, o volume de
juros pagos pelo governo na rolagem da dívida pública e o crescimento da participação das despesas essenciais na cesta de consumo do brasileiro reduziram de
forma brutal a renda disponível
para o consumo mais supérfluo.
O desemprego maior amplificou
esses efeitos sobre a renda disponível agregada do consumidor. As
estatísticas recentes mostram que
esse quadro não se alterou em outubro!
Ora, o consumo representa quase 70% do PIB no Brasil. Mesmo
que esse número tenha se reduzido por conta do crescimento das
exportações, ele ainda define a intensidade de nossa atividade econômica. Temos aí a primeira
grande diferença entre o período
que vivemos e o ano de 2000. A
reativação do consumo e, portanto, da atividade econômica vai
acontecer de maneira mais lenta
e não há razão nenhuma para
que o aumento do PIB, no próximo ano, possa repetir a "performance" do tão citado ano de
2000.
Por outro lado, a parcela da receita de impostos, que está sendo
reciclada via pagamento de juros
na dívida do governo, é hoje
maior do que em 2000. Essa renda está ainda mais concentrada
no setor financeiro, interno e externo. O entesouramento desses
recursos, também em proporção
do PIB maior do que o verificado
em 2000, reduz a velocidade de
recuperação da atividade à medida que não sejam reciclados via
investimentos produtivos.
Por tudo isso, repito aqui um
conselho sábio que ouvia dos
mais velhos no início de minha
carreira profissional: "Devagar
com o andor que o santo é de barro"!.
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 61,
engenheiro e economista, é sócio e editor do site de economia e política Primeira Leitura. Foi presidente do BNDES e
ministro das Comunicações (governo
FHC).
Internet: www.primeiraleitura.com.br
E-mail - lcmb2@terra.com.br
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