São Paulo, domingo, 29 de janeiro de 2006

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OPINIÃO ECONÔMICA

Salário mínimo e emprego

JOSÉ ALEXANDRE SCHEINKMAN

Um leitor da imprensa brasileira nas últimas semanas poderia concluir que a restrição orçamentária do poder público é o único impedimento para maior aumento do salário mínimo.
Sem dúvida, o aumento proposto terá conseqüências fiscais. O acréscimo das pensões dos aposentados que ganham até um salário mínimo vai alargar o déficit da Previdência. A Confederação Nacional dos Municípios estimou que o aumento anunciado provocará um gasto extra de R$ 1,1 bilhão para as prefeituras e que municípios pequenos terão dificuldades para satisfazer a Lei de Responsabilidade Fiscal.
Mas há pouca discussão sobre o impacto do novo mínimo no emprego. O salário mínimo é muito baixo e o ideal seria se a economia brasileira pudesse sustentar um mínimo muito maior do que R$ 350. Mas a verdade é que o custo do trabalho pouco qualificado já é muito alto para uma firma formal e por isso a maioria dos empregos novos para trabalhadores pouco educados é gerada no setor informal. É provável que os aumentos do salário mínimo tiveram até agora um papel limitado nesse processo de informalização. Os tributos sobre a folha salarial, incluindo a contribuição previdenciária, e os impostos em geral tiveram um impacto maior, mas o aumento do salário mínimo tem também um resultado negativo sobre o emprego formal, principalmente nas regiões mais pobres.
Por outro lado, um corte na contribuição previdenciária do empregado e do empregador teria efeito positivo na renda dos trabalhadores menos educados que têm emprego formal e geraria novos empregos formais. O governo poderia, por exemplo, isentar todos os tributos e contribuições sobre a folha que correspondam ao primeiro meio salário mínimo de cada trabalhador. Uma proposta nesse sentido já constava do documento "A Agenda Perdida", escrito por um grupo de economistas em 2002.
A perda de receita conseqüente pode ser razoavelmente estimada e não há nada mágico na meta de meio salário mínimo. Dependendo da avaliação de custos, o governo poderia aplicar uma isenção maior ou menor ou diminuir o benefício para os trabalhadores com mais renda. A queda da receita poderia ser compensada por corte de despesas correntes, que no Brasil já ultrapassam, sem contarmos os juros, 30% do PIB; fração muito elevada para um país com o nosso nível de desenvolvimento.
Como as firmas formais são mais eficientes do que as informais, a redução dos tributos sobre a folha salarial aumentaria a produtividade no país. Mas essa diminuição dará também uma contribuição importante para a justiça tributária. O trabalhador típico com pouca qualificação vai mudar muitas vezes de emprego e ao longo de sua vida vai permanecer desempregado ou trabalhar no setor informal por um bom tempo. Dificilmente conseguirá a aposentadoria por tempo de trabalho e optará por se aposentar com um salário mínimo, ao alcançar uma determinada idade. Para esse contribuinte, pagamentos à Previdência são um imposto sobre o trabalho, já que não acarretam benefício nenhum.
A taxação do trabalho pouco qualificado é um dos aspectos mais regressivos da nossa estrutura tributária.
A boa política econômica exige objetivos claros e instrumentos adequados para atingi-los. Se o intento for aumentar as aposentadorias mais modestas e beneficiar aqueles que conseguirem manter um emprego formal, o aumento do mínimo é uma medida apropriada. Mas, se a meta é melhorar a renda dos trabalhadores menos qualificados e aumentar a produtividade da economia, a redução do imposto sobre o trabalho é a melhor ferramenta.


José Alexandre Scheinkman, 58, professor de economia na Universidade Princeton (EUA), escreve quinzenalmente aos domingos nesta coluna.
E-mail - jose.scheinkman@gmail.com


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