São Paulo, terça-feira, 29 de janeiro de 2008

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VINICIUS TORRES FREIRE

O monstro da serra elétrica


Semana apresenta primeiros dados mais frescos da crise, mas no Brasil ainda há estranhíssima calmaria

OS DADOS mais diretos sobre o nível da atividade econômica "real" envelheceram muito depois do pânico de janeiro. Muitos números de dezembro já virão à luz algo moribundos, quando não natimortos. Tais informações refletem decisões de investimento e consumo tomadas faz meses. Claro, há indicadores antecedentes que medem confiança e expectativas de empresários e consumidores, mas tais números são meio erráticos. Ainda não indicavam piora significativa em relação ao clima do final do ano passado. Mas houve janeiro.
Os participantes globais do mercado financeiro anteciparam violentamente um cenário de recessão nos últimos dez dias, um futuro próximo de papéis mais podres, bancos descapitalizados, crédito apertado e de lucros menores nas empresas.
Foram sinais gritantes dessa pré-temporada recessiva o fato de as Bolsas terem rastejado na lama e que o BC dos EUA, o Fed, tenha reagido em aparente pânico diante desse pântano, dando um talho histórico nos juros. Esse tipo de antecipação pessimista, de resto, pode ele mesmo acabar de entornar o caldo, por provocar desvalorização em cadeia de ativos financeiros, o que, entre outros problemas, acaba por bater nas finanças dos bancos, já mal das pernas nos EUA.
A novidade recente não esteve no balanço dos bancos, que todos estimavam podres, mas no temor de colapso de "seguradoras" de títulos financeiros, "seguradoras" cujo "resgate" do brejo, ora em negociação, propiciou algum alívio à finança. Porém, bancões que até metade de janeiro previam alta em torno de 1,3% do PIB americano para este ano começaram a rumorejar que cortariam suas previsões pela metade -ou para zero. No entanto, ainda não apareceu uma série de dados suficiente para se pensar o tamanho da queda na atividade. Alan Greenspan diz que não se caminha para uma recessão -se pula para dentro dela.
Nesta semana, saem dados de confiança do consumidor (de janeiro), a prévia do PIB do trimestre final de 2007, de consumo e de criação de empregos (de janeiro). Não vai dar para ouvir do outro lado da linha "desculpe, foi engano, não era a recessão". Mas os números refletirão ao menos meio ano de crise bancária e o susto de janeiro: uma avaliação menos "financista" da crise.
Não vai se saber ainda do efeito desse rolo no Brasil. Para nós, macerados em décadas de crise, ainda há calmaria estranhíssima. O Banco Central compra dólares em meio ao tumulto, coisa inédita. O investimento direto ainda foi ótimo em janeiro, a saída de dólares caiu ao longo de janeiro. Nas últimas semanas, os juros de mercado deram um saltinho, para logo se comportar.
Bancos estrangeiros recomendam comprar ativos ligados a "commodities" e ações brasileiras. O Bradesco diz que sua carteira de crédito deve crescer mais de 20% neste ano, com pelo menos 25% de alta no crédito para pessoas físicas. E não se ouviu nenhum disparate maior do governo, apesar do temor de que façam alguma besteira fiscal. O clima é daqueles finais de filmes "B", em que o monstro da serra elétrica ou o "brinquedo assassino" parecem mortos, pela segunda vez. Pode ter morrido.
Podem ressuscitar pela terceira vez e serrar o braço de alguém ainda.

vinit@uol.com.br


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