São Paulo, quarta-feira, 29 de março de 2006

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Setor público zera dívida em moeda estrangeira e reduz vulnerabilidade

NEY HAYASHI DA CRUZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O fluxo de capital externo para o Brasil tem se mantido em níveis recordes nos últimos meses, e o efeito dessa abundância já é sentido nas contas públicas: no mês passado, pela primeira vez, o setor público (conjunto formado por União, Estados, municípios e estatais) pôde zerar suas dívidas em moeda estrangeira.
Isso significa que, somadas, as aplicações cambiais feitas pelo governo superam todos os seus compromissos assumidos em outras moedas. A conseqüência imediata disso é a menor dependência das contas públicas a eventuais turbulências no mercado de câmbio. Isso porque, mesmo que a cotação do dólar dispare, a dívida não será -pelo menos por enquanto- afetada.
Em números: no mês passado, a dívida líquida do setor público era de R$ 1,022 trilhão, o equivalente a 51,7% do PIB (Produto Interno Bruto). Desse endividamento total, R$ 32,7 bilhões se referem a compromissos corrigidos pelo câmbio. O restante da dívida é calculada em reais.
Essa dívida cambial, por sua vez, é mais do que compensada pelas operações feitas pelo Banco Central no mercado de derivativos. Nessas transações, o BC vende a bancos os chamados contratos de "swap" reverso. Esses papéis funcionam como uma aplicação financeira corrigida pelo câmbio e, por isso, reduzem a exposição da dívida pública a oscilações do dólar.
Em fevereiro, circulavam no mercado R$ 37,7 bilhões em contratos de "swap" reverso. Ou seja, pelos dados do mês passado, os ativos do governo em dólar superavam o valor de suas dívidas em moeda americana.
Isso torna as contas do governo menos vulnerável a oscilações no mercado financeiro, embora essa vantagem não seja permanente: numa eventual crise, o governo pode, rapidamente, optar por voltar a se endividar em dólar para conter uma possível desvalorização do real.

Operações do BC
Em 2002, quando houve eleição presidencial, o BC começou a vender contratos de "swap" para tentar conter a disparada que o dólar registrava naquela ocasião por causa da força da candidatura Lula, cuja imagem nos mercados era muito pior que a atual. A idéia era relativamente simples: por meio desses papéis, o BC se comprometia a pagar aos bancos toda a variação do dólar que ocorresse em determinado período. O objetivo era desestimular a compra de dólares, o que poderia conter a alta da cotação, que acabou disparando.
No ano passado, a situação se inverteu. Os juros altos provocaram uma desaceleração da economia, reduzindo também a procura por mercadorias importadas. Com a economia mundial crescendo a taxas recordes, as exportações brasileiras tiveram forte expansão. Combinados, esses fatores produziram um saldo recorde da balança comercial, o que resultou num forte ingresso de dólares no país.
Diante desse ingresso de recursos, o BC começou a tomar medidas para tentar evitar que o real se valorizasse excessivamente. Uma das iniciativas foi a compra direta de dólares no mercado de câmbio. No ano passado, foram adquiridos US$ 21,5 bilhões, dinheiro esse que foi depositado nas reservas internacionais.
As reservas são uma espécie de poupança em moeda estrangeira de onde o governo tira o dinheiro necessário para os pagamentos da dívida externa. Com o aumento dessas reservas, o BC e o Tesouro Nacional decidiram antecipar o resgate de boa parte de seu endividamento no exterior.
Além disso, o BC passou a vender contratos de "swap" reverso. Ao contrário do "swap" tradicional, esses papéis fazem com que os bancos se comprometam a pagar ao BC a variação que for registrada pelo dólar em certo espaço de tempo. De 2005 para cá, foram colocados no mercado mais de R$ 70 bilhões em contratos de "swap" reverso.


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