São Paulo, domingo, 29 de agosto de 2004

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IMPASSE

Professor diz que, com poder dividido, será necessária costura política para formar diretorias a fim de evitar fissura institucional

Racha na cúpula ameaça estrutura da Fiesp

SANDRA BALBI
DA REPORTAGEM LOCAL

O racha na liderança dos industriais paulistas, na eleição para a nova diretoria da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) e do Ciesp (Centro das Indústrias do Estado de São Paulo), ameaça a atual estrutura da federação. "Na arquitetura da entidade, parte do poder e da visibilidade política está concentrada em cerca de dez diretorias técnicas, ou departamentos, cujos titulares são indicados pelo presidente da Fiesp e do Ciesp", afirma Alvaro Bianchi, professor de ciência política da Unicamp.
Bianchi defendeu, em abril deste ano, tese de doutorado em que analisa a estrutura das duas instituições e suas eleições. No ano de 1980, por exemplo, foi eleita a chapa de oposição, mas nesse caso ela assumiu tanto a Fiesp como o Ciesp. No pleito deste ano, a oposição ficou só com a federação. "Na época, manteve-se a unidade, enquanto agora há dois presidentes. Quem vai escolher as diretorias partilhadas?", indaga.
Para evitar uma nova fissura, desta vez institucional, será necessária uma costura política entre os dois presidentes -Paulo Skaf, da Fiesp, e Claudio Vaz, virtual presidente do Ciesp. "Sem isso, terá de ocorrer uma "reforma constitucional" nas entidades, já que a estrutura existente não prevê a duplicidade de poder", diz Bianchi.
Skaf, que contesta o resultado da votação no Ciesp no comitê eleitoral, diz que vai "abrir os braços da Fiesp para a sociedade", o que inclui a possibilidade de partilhar as diretorias técnicas com os ex-adversários. "Todos vão ser muito bem recebidos e muito úteis", diz o empresário. Vaz diz que vai discutir com os industriais que o apoiaram quais departamentos interessam ao Ciesp ocupar e proporá à nova diretoria da Fiesp um trabalho coordenado. "Os cargos podem ser duplicados ou coordenados; se não houver possibilidade de acordo, ele [Skaf] faz os [departamentos] dele, e eu, os meus", diz.

Projeto
A composição das diretorias técnicas é importante, segundo Bianchi, pois é nela que se revela a força de cada setor industrial dentro da Fiesp. "Historicamente, as chapas eleitas representam uma fração do empresariado paulista, nem sempre homogênea", diz.
No período analisado pelo cientista político, as décadas de 1980 e 1990, os industriais que disputaram o comando da federação manifestavam uma multiplicidade de projetos de alcances diferenciados, sem que fosse possível desenhar um "projeto empresarial" para o país, segundo Bianchi.
Carlos Eduardo Moreira Ferreira, que comandou a Fiesp por duas gestões, tinha apoio dos setores internacionalizados -papel e papelão e multinacionais. "Ele caracterizou-se pela adesão ao projeto neoliberal do governo Fernando Henrique Cardoso e foi um defensor do programa de reformas e privatizações."
Já o atual presidente, Horacio Lafer Piva, originário do setor de papel e papelão, representaria também os setores voltados para o mercado interno, como metalurgia, metal-mecânico e eletroeletrônico. "Piva teve uma posição crítica ao neoliberalismo e às reformas estruturais e cobrava do governo um projeto industrial em que o Estado tivesse uma ação indutora do desenvolvimento", diz.
Skaf, por sua vez, representaria os setores mais atingidos pela abertura do mercado nas últimas décadas, como têxteis e brinquedos, e os exportadores. "Mas ainda não deixou claro qual o seu projeto de país", diz Bianchi.
Josué Alencar, presidente da Coteminas e filho do vice-presidente da República, José Alencar, que apoiou a eleição de Skaf, define esse projeto. "O objetivo é a defesa das classes produtoras que têm sido menos valorizadas nas últimas décadas. O país tem dado muita relevância às atividades-meio [setor financeiro], e não às atividades-fim [os setores produtivo]. Até o que se convencionou chamar de risco-país não mede o risco do país. Há uma distorção de valores", afirma Alencar.


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