São Paulo, quinta-feira, 30 de junho de 2005

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CRISE NOS ANDES

Medida visa "cumprimento estrito da lei" e inclui auditoria nas áreas financeira e operacional das firmas

Governo boliviano fará devassa em empresas

Aizar Raldes - 10.jul.04/France Presse
Técnico da Petrobras observa chaminé de fábrica na Bolívia


CLÁUDIA TREVISAN
ENVIADA ESPECIAL A BRASÍLIA

CAROLINA VILA-NOVA
DA REDAÇÃO

O governo boliviano vai fazer uma devassa nas empresas de petróleo que atuam no país, incluindo a Petrobras.
Decreto publicado no país na segunda-feira prevê a realização de "auditorias especiais" nas áreas financeira, operacional, jurídica e técnica nas companhias que passaram a atuar na Bolívia em razão do processo de privatização ou por meio de contratos de risco, que é o caso da estatal brasileira.
As auditorias serão realizadas pela Controladoria Geral da República e deverão estar concluídas no prazo de 180 dias. O objetivo é garantir o "cumprimento estrito" das leis do país.
A devassa agrega mais um fator de incerteza à situação das petroleiras, principal alvo dos protestos que ocuparam as ruas e estradas da Bolívia nos últimos meses.
A percepção generalizada da opinião pública local é que as empresas que investiram no país nos últimos dez anos foram beneficiadas de forma injusta e tiveram lucros exorbitantes.
Essa visão é reforçada pela extrema pobreza em que vivem dois terços da população boliviana, excluídos da riqueza gerada pela exploração de gás e petróleo. A Bolívia tem a segunda maior reserva de gás da América Latina, atrás apenas da Venezuela.
A hostilidade em relação às petroleiras se materializou na promulgação da nova Lei de Hidrocarbonetos, em maio.
O texto transfere ao Estado boliviano a propriedade sobre o petróleo e gás extraídos no país, cria um imposto de 32% para o setor de petróleo e gás e determina a modificação dos contratos assinados a partir de 1996.
Na segunda-feira, o Executivo boliviano divulgou três decretos que regulamentam a nova lei. No dia seguinte, a imprensa local interpretou que um dos decretos nacionalizava os setores de gás e petróleo, o que significaria a expropriação das atividades das empresas que atuam no país.
O embaixador do Brasil em La Paz, Antonino Mena Gonçalves, contestou essa interpretação e afirmou que o decreto apenas regulamenta a lei aprovada no mês passado. "Não há fatos novos", declarou o embaixador.

Exército
Gonçalves também desmentiu a informação de que tropas do Exército haviam ocupado campos de gás. "Isso não é verdade. O Exército tomará medidas para proteger os campos, se elas forem necessárias", observou.
No mês passado, em protesto pela nacionalização dos hidrocarbonetos, grupos indígenas chegaram a ocupar sete campos de exploração de gás natural e de petróleo das empresas Chaco e Andina, de propriedade da britânica British Petroleum e da espanhola Repsol, respectivamente.
A Câmara Boliviana de Hidrocarbonetos afirmou que não recebeu nenhuma informação sobre a ocupação de empresas de petróleo pelo Exército.
De qualquer modo, consultores ouvidos pela Folha ponderaram que o artigo 7º do decreto 28.224 é ambíguo e dá margem a diferentes interpretações.
O texto afirma que os ministérios de Hidrocarbonetos, de Governo e de Defesa devem coordenar "tarefas e ações a fim de assegurar o domínio do Estado nas jazidas de hidrocarbonetos, outorgando as condições de conservação e segurança necessárias (...), segundo corresponda".
"Não está claro se a intenção do governo é tomar os campos ou apenas velar pela sua segurança", disse o consultor Carlos Alberto López. Ele próprio opta pela segunda opção, a exemplo das empresas ouvidas pela Folha e do embaixador Mena Gonçalves.
Na opinião de López, o problema é a lei promulgada no mês passado. Segundo ele, há um grande debate dentro das empresas sobre a constitucionalidade de várias de suas determinações, especialmente a alteração dos contratos e a elevação de tributos.
O consultor afirmou que as petroleiras ainda estão decidindo se irão contestar na Justiça a nova lei ou pedir a intervenção de árbitros estrangeiros, como prevêem os contratos. Em sua opinião, não haverá uma atuação em grupo e cada petroleira tomará uma decisão individual.
A Petrobras é a maior empresa da Bolívia, contribui com o maior volume de arrecadação de impostos e responde por 15% do PIB.


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