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VINICIUS TORRES FREIRE
Sobre leite, batatas e juros
Não há alta geral de preços, há ainda dúvida sobre "excesso" de consumo e sobre a duração da carestia da comida no país
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O ESPECTRO da inflação da agricultura, "agflation", está à
solta no mundo. Mexicanos
reclamam da tortilha cara, franceses,
da baguete, e italianos, do macarrão.
A agrinflação permeia também o debate brasileiro sobre preços e juros.
A comida teve o peso mais importante na alta da inflação brasileira de
2006 para 2007, é sabido. "Leite e
derivados" vão à frente, com "tubérculos, raízes e legumes" e "aves e
ovos" no segundo posto, embora o
leite tenha pesado cerca de três vezes
mais que cada um desses outros grupos de produtos. No Brasil, o caso
pior é o da lactoinflação.
Embora a exportação brasileira de
leite e derivados seja pequena, além
de o leite não ser um produto negociado como grãos no mercado global,
o preço mundial desses produtos subiu 40% neste ano, segundo dados
elaborados pelo Dieese. No Brasil, os
lácteos ficaram 35% mais caros, contra 2% em 2006.
Discute-se o fator mais relevante
no aumento do leite (e comida em
geral), se a alta do consumo mundial,
o tempo ruim ou o desânimo do produtor nacional com os preços dos últimos anos, que contiveram o ritmo
de aumento da produção.
O aumento do consumo dos mais
pobres no Brasil decerto deve ter tido papel importante. Também devem ter influenciado o preço de "tubérculos, raízes e legumes", em alta
de 21,5% no ano (queda de 34% em
2006). Sim, trata-se de abóbora, batata, chuchu, cebola e mandioca.
Aves e ovos subiram menos, 9%,
mas pesam mais na cesta de consumo e, pois, no IPCA. As exportações
nacionais de frango são importantes.
O preço médio da venda externa desse produto cresceu 21% no ano e o
das vendas brasileiras de milho subiu 36%. O milho dispara devido à alta de consumo global, influenciada
pelo ineficiente álcool americano,
feito com o grão. As carnes, que na
média mundial consistem de grãos
sobre quatro patas, são o próximo
item do ranking do aumento da inflação de 2006 para 2007 -e o Brasil
exporta cada vez mais carne.
Por que a minúcia sobre frangos,
chuchus e milho? Parece evidente
que grãos mais caros no mundo e o
povo a comer mais, até no Brasil, tendem a pressionar a inflação.
O quanto, e por quanto tempo, é o
nó da questão. Nem todo preço dispara, nem mesmo o da comida, nem
em serviços. Sim, a média de aumentos elevou-se de 2006 para 2007; o
preço da comida depende ainda de
custos como salários.
Mas, apesar dos recordes globais,
ainda não se conhece o efeito de preços maiores sobre o aumento da
produção, e há analistas no mercado
mundial que já estimam queda forte
no preço do trigo (sim, estimativas
econômicas são o que se sabe). O
preço doméstico do leite se aquieta
um pouco, e é esperada mais reação
dos produtores. É mais complicada
a situação de trigo e milho, que não é
só insumo de carnes, mas da cadeia
industrial de muitos alimentos.
O Banco Central ressaltou no seu
relatório trimestral que a inflação da
comida tende a contaminar com
mais força a expectativa geral de inflação. Mas ainda há dúvida sobre
"excesso" generalizado de consumo.
Uma pausa de uns três meses no
corte de juros, de mísero 0,25 ponto
percentual, não vai fazer lá grande
diferença. Porém, espraiar a fobia de
inflação também não é razoável.
vinit@uol.com.br
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