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MARCOS CINTRA
Privatização virou palavrão
A privatização evita o loteamento político de cargos e reduz a corrupção
e o tráfico de influência
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UMA PESQUISA publicada na
quinta-feira no jornal "Valor
Econômico" mostrou que a
privatização é rejeitada por 70% dos
eleitores. Trata-se de uma lamentável constatação, e que pode ter sido
decisiva no desfecho da sucessão
presidencial. Há quem acredite que
essa percepção seja fruto da mentalidade patrimonialista e assistencialista que muitos dizem ser características dominantes na cultura brasileira. Não creio que seja verdade.
Antes, essa concepção atrasada do
setor público pode ser fruto do modo como o tema foi tratado na recente campanha presidencial.
Infelizmente, a dinâmica eleitoral
causou um grande desserviço ao
país. Transformou a privatização
em palavra maldita, e reforçou na
mente do brasileiro a crença equivocada de que cabe ao governo desempenhar funções mesmo que o livre
mercado possa delas se desincumbir
com maior eficiência. Durante a disputa eleitoral criou-se o fato de que
o candidato de oposição privatizaria
o que sobrou das estatais, inclusive o
Banco do Brasil, a Petrobras, os Correios e a Caixa Econômica Federal.
Estranhamente, o candidato do
PSDB não defendeu de imediato o
processo de desestatização que seu
partido comandou a partir de meados dos anos 90, através do PND
(Programa Nacional de Desestatização). Pior ainda foi não ter se manifestado enfaticamente em favor da
privatização, já que quando era vice-governador ele foi o coordenador do
PED (Programa Estadual de Desestatização) no Estado de São Paulo
entre 1995 e 2000. O PED paulista
rendeu R$ 32,9 bilhões.
Com certeza, a posição defensiva
do candidato de oposição não deve
ter sido motivada por convicção,
mas por oportunismo, ou, quem sabe, falta de firmeza. Tanto o PT como o PSDB passaram a impressão
de que a privatização é ruim, que
não gera benefícios para a sociedade. Isso não é verdade, mas pode ter
impressionado a opinião pública.
Além de gerar recursos para o governo, a privatização aumenta os investimentos, estimula a competitividade, melhora a qualidade dos serviços oferecidos, evita o loteamento
político de cargos e reduz a corrupção e o tráfico de influência. Com
certeza, os Delúbios e os Marcos Valérios (aliás, onde andam esses esquecidos personagens?) teriam tido
muito mais dificuldades no desempenho de suas tenebrosas atividades
se a política de privatização tivesse
prosseguido no atual governo.
Vale lembrar alguns fatos.
O PND foi criado em 1990. O caso
mais bem-sucedido de privatização
foi o das telecomunicações. Entre
1990 e 2002, o setor foi responsável
por um terço do resultado de US$
105,5 bilhões (receitas de vendas
mais dívidas transferidas) do PND.
Desde 1998, o setor de telecomunicações investiu mais de R$ 130 bilhões. A quantidade de telefones fixos saltou de 20 milhões para mais
de 42 milhões em meados de 2006.
No caso dos celulares, a expansão no
mesmo período foi de 7,4 milhões de
aparelhos, para mais de 91 milhões.
Os telefones públicos mais do que
dobraram e ultrapassam 1,3 milhão
de terminais. Na internet, o Brasil é
hoje o líder na América do Sul, com
4,6 milhões de acessos, 6,5 vezes
mais do que o registrado em 2002.
Antes da privatização, a oferta de
linhas telefônicas era restrita, os
custos eram exorbitantes e a espera
era longa. Os mais pobres nem pensavam em possuí-las. O mercado paralelo era pujante -e abusivo.
Cumpre lembrar que, em outros
setores, como o de energia elétrica,
que representou um terço dos resultados do PND, a falta de uma boa regulamentação ainda limita seu desempenho. É preciso retomar as
transferências para empresas privadas do que ainda resta da produção e
da distribuição de energia sob o controle do governo. Essa é a questão
que ainda precisa ser equacionada, e
que os candidatos ignoraram.
É necessário retomar sem constrangimentos a discussão sobre a
continuidade da desestatização. Seria oportuna a retomada da privatização como as dos bancos de Santa
Catarina e do Piauí, e do IRB. E por
que não dar início a um amplo debate sobre a privatização dos grandes
bancos estatais, da Petrobras, da
previdência ou dos sistemas de
transportes sobre trilhos e de saneamento nas grandes capitais? Se forem tabus, que sejam desacreditados, e que se analise a conveniência,
ou não, de sua privatização sem preconceitos ou receios de patrulhamento ideológico.
MARCOS CINTRA CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE , 60,
doutor pela Universidade Harvard (EUA), professor titular
e vice-presidente da Fundação Getulio Vargas, foi deputado federal (1999-2003). É autor de "A verdade sobre o Imposto Único" (LCTE, 2003). Escreve às segundas-feiras, a
cada 15 dias, nesta coluna.
Internet: www.marcoscintra.org
mcintra@marcoscintra.org
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