São Paulo, sábado, 30 de novembro de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

ONDE O POVO ESTÁ

Rede inaugura no bairro com pior índice de condição de vida de São Paulo sua maior loja

Casas Bahia chega ao Jardim Ângela

José Nascimento/Folha Imagem
Personagem da Casas Bahia na inauguração da maior loja da rede, no Jardim Ângela, em SP


DA REPORTAGEM LOCAL

Parecia dia de festa. Tinha bandinha de música e fila para pegar pipoca em carrinho. Do outro lado da rua, separado por não mais que dez metros do ponto do concorrente, duas caixas de som despejavam música do argelino Khaled, que fez sucesso por aqui em 99, e "hits" como "Ragatanga", do Rouge.
Foi assim, em um corpo a corpo, que a Casas Bahia inaugurou ontem a maior loja de sua rede, no bairro com pior posição no ranking de condição de vida de São Paulo, segundo levantamento da PUC-SP: o Jardim Ângela.
O Jardim Ângela é um extremo dentro das diversas realidades abrigadas na cidade. Em 2000, despontava como o recordista em homicídios na capital. Caiu para o sexto lugar no ranking de 2001 -com a taxa de 91,45 homicídios para cada 100 mil habitantes, enquanto a média paulistana é de 57,45 homicídios. Em uma área onde vivem 243 mil pessoas, a renda do chefe de família não passa de R$ 568 por mês -a média da cidade é de R$ 1.480.
Nada disso pesou no momento em que Michael Klein, 52, sócio-proprietário da Casas Bahia e filho do fundador, Samuel Klein, decidiu instalar a loja de 2.900 m2, para concorrer de frente com a Marabraz, especializada em vendas de móveis e que tem 85 lojas no Estado.
"Fizemos um acompanhamento pelo CEP para o qual dirigimos as entregas e constatamos que havia um grande número de compradores naquela região. É simples, vou para mais próximo dele", argumenta Klein.
Outro fator é estritamente financeiro, como explica Michael Klein: o preço do metro quadrado comercial no "centro" do Jardim Ângela, na estrada do M'Boi Mirim, está em cerca de R$ 250. Em Santo Amaro ou no centro de São Paulo, para onde seus potenciais compradores se dirigiriam, não sairia por menos de R$ 2.500. "Vindo para cá, consigo ter uma loja maior e expor muito mais mercadoria", diz.
E expôs: além de móveis, na filial do Jardim Ângela predomina a linha branca, aparelhos de som e televisores. O item mais caro à venda é justamente uma TV de 34 polegadas: R$ 4.338 à vista, não por acaso posicionada numa das entradas do prédio. "Serve para puxar vendas. Eu queria ter um BMW. Não posso. Então me contento com um Astra. Se não pode comprar essa TV, o cliente se esforça e compra uma de R$ 1.000", diz o gerente, Joarez Gomes.
Para garantir a segurança durante o dia, contratou três fiscais (desarmados) e instalou duas câmeras filmadoras perto dos caixas. À noite, dois vigias permanecem dentro da loja -que fica próxima a um posto da PM.
Klein ratifica a crença de que "pobre é bom pagador". Pelo menos 80% das compras na rede, que conta com 320 lojas em oito Estados e prevê faturar R$ 4 bilhões este ano, são por meio de crediário. "A inadimplência na periferia não passa de 8%. No centro, é um pouco maior."

Personagens
Os clientes da Casas Bahia são pessoas como o vigia José Ribamar da Silva, que chegou à loja por volta do meio-dia, acompanhado da mulher e da neta. "Emendaram", nas palavras de Célia, sua mulher, um crediário no outro. Primeiro compraram um aparelho de som. Quando faltavam quatro prestações, abriram novo financiamento, incorporando as restantes, para comprar uma geladeira. Ontem, ""emendaram" o crediário da geladeira (faltavam quatro parcelas de R$ 100,13) com o de uma cômoda, adquirida por R$ 600. Vão pagar dez prestações de R$ 100,56.
(JOSÉ ALAN DIAS)


Texto Anterior: Supremo Tribunal Federal julgará constitucionalidade de medida
Próximo Texto: Mercado financeiro: Bolsa sobe 3,3% no mês e cai 22,6% no ano
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.