São Paulo, domingo, 31 de janeiro de 1999

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PARA COMPARAR
Ao custo de 20 milhões de desempregados, região acerta contas externas; ajuste não depende das exportações
Ásia acha equilíbrio após forte recessão

MARCIO AITH
enviado especial a Seul e a Bancoc

O único remédio eficaz parece ser o mais amargo.
Um ano e meio depois do início da crise econômica na Ásia, a recessão brutal pela qual passaram as economias da região em 1998 colocou em perfeita ordem suas contas externas, ao custo de 20 milhões de empregos.
O ajuste não foi feito com base no bom desempenho das exportações, diferentemente do que os governos desejavam depois do colapso de suas moedas e o FMI (Fundo Monetário Internacional) prometia à época.
Ele resulta de quedas recordes das importações e do consumo, causadas pelos juros altos e pelo aperto monetário praticados no primeiro semestre.
Capitalizados, alguns desses países já começam a melhorar a parte "real" de suas economias. Outros não conseguem fazer ressuscitar seu setor privado.
A Coréia do Sul desponta como o país com a melhor recuperação da região. Por causa de uma queda de 37% em suas importações durante o ano, conseguiu acumular um superávit externo de US$ 38 bilhões, o maior de sua história, e reservas de US$ 57 bilhões.
Isso num ano em que 20 mil pequenas e médias empresas quebraram e 1,5 milhão de sul-coreanos perderam os empregos.
Valorização
O dinheiro forte chamou a atenção dos investidores. A Bolsa de Seul atrai desde setembro US$ 1,5 bilhão todo mês, o que fez o valor das ações atingir níveis próximos aos de antes da crise. O won valorizou-se 30% no segundo semestre e o governo esporadicamente intervém para derrubar sua própria moeda, com o objetivo de manter o ritmo de suas exportações.
"É duro dizer isso, mas o aperto monetário deu resultado", disse Jang-yung Lee, economista-chefe da federação dos bancos sul-coreanos. "Tínhamos que estabilizar a moeda e acumular reservas. Sabíamos que haveria recessão, mas aceitamos o jogo."
Juros
Lee, um assessor informal do FMI, acha que os juros poderiam ter sido baixados logo no segundo trimestre de 1998. "Talvez tenhamos exagerado na dose, mas o remédio está correto."
O mais curioso é que a Coréia do Sul voltou a atrair investimentos externos mesmo sem reformar significativamente os grandes conglomerados do país, os chaebols. Sob a ótica do investidor, a reforma desses conglomerados tinha, para a Coréia do Sul, a mesma importância que a reforma fiscal no Brasil.
Um exemplo disso foi a tentativa frustrada da Hyundai Motors, maior montadora do país, de demitir 1.600 empregados ociosos (entre os quais 160 garçonetes). A empresa desistiu das demissões por pressões do próprio governo. Outro exemplo foi a venda "caseira" da Asia Motors para a Hyundai, numa concorrência que os mercados queriam que fosse vencida por uma montadora estrangeira. Mas o mercado não deu importância aos dois episódios.
Preferência
"Estou cada vez mais propenso a achar que o investidor gosta de países que reformam suas economias, mas o que eles adoram são governos com balanças externas superavitárias", disse Suphat Suphatchalasai, professor de economia da Universidade de Thamasat, em Bancoc.
"A lentidão das reformas no setor privado sul-coreano poderia servir como motivo para uma fuga de investidores. Mas eles não fogem porque sabem que o país está acumulando divisas."
Suphat explicou que a Tailândia, embora também esteja acumulando divisas e atraindo capitais, não consegue passar esses dividendos para o setor privado com a mesma facilidade verificada na Coréia do Sul, cujas exportações deram sinal de vida nos dois últimos meses.
"A Tailândia passou por duas fases distintas e duras para os exportadores. Quando o baht se desvalorizou, os exportadores receberam pedidos do mundo inteiro, mas não tinham dinheiro para comprar matéria-prima nem financiar as exportações. Agora, com a moeda forte, os pedidos desapareceram", disse ele. As exportações, em dólar, caíram 7% em 1998. A produção industrial, 15%.
No setor financeiro, a venda dos ativos das 58 instituições financeiras nacionalizadas logo depois da crise foi considerada um fracasso e os bancos restantes ainda não conseguiram se recapitalizar.
Caso a parte
A Malásia é considerada um caso a parte na análise dos especialistas. Quase cinco meses depois de isolar-se do mercado financeiro mundial ao implantar controles rígidos sobre o fluxo de capitais, sinais de recuperação surpreendem.
Desde setembro, as taxas de juro caíram de 11% para 5,9%, as exportações cresceram 2% em dólar e as reservas pularam de US$ 20 bilhões para US$ 23 bilhões. É praticamente um sucesso, mas todos querem saber o que vai acontecer quando, em outubro, acabar o prazo do "congelamento" de um ano aplicado por Mahathir sobre os investimentos estrangeiros em Bolsa. Em tese, mais da metade do dinheiro aplicado em ações poderá sair do país.
Segundo o primeiro-ministro Mahathir Mohamad, a Malásia está provando que, ao contrário do que apregoa o mercado, fechar as fronteiras financeiras é um bom negócio para países em desenvolvimento retomarem o crescimento depois de crises cambiais.



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