São Paulo, domingo, 31 de janeiro de 1999

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Taxa aumenta 223% em oito anos

da Reportagem Local

A marca dos anos 90 no Brasil será o desemprego. Em nenhum outro período da história recente do país a taxa cresceu tanto e tão rápido. Apenas entre 1989 e 1997, o número de desempregados cresceu 223% no país.
Incorporando-se a estimativa de 1998, esse aumento vai a 263%. E, dependendo do tamanho da recessão de 1999, o crescimento do desemprego na década pode oscilar entre 301% e 460%. Por comparação, nos anos 80 o desemprego cresceu apenas 6% no país.
O motivo dessa explosão do desemprego, segundo Marcio Pochmann, é a desestruturação do mercado de trabalho no Brasil. O fenômeno, iniciado nos anos 80, se agravou rapidamente nos 90.
O economista da Unicamp explica que, após a Segunda Guerra Mundial, os países desenvolvidos iniciaram um processo de estruturação do mercado de trabalho. Em 1970, de cada 10 trabalhadores, 9 eram assalariados registrados.
O Brasil seguiu a mesma tendência, mas em menor grau. De 1/3 de trabalhadores assalariados com registro em carteira na década de 40, o país chegou a 2/3 de trabalhadores registrados em 1980.
Nesse período, a cada 10 postos de trabalho criados no Brasil, 8 eram de assalariados. E desses 8, 7 tinham carteira assinada. A partir de 1980, entretanto, a tendência muda e começa a desestruturação.
O resultado é que, apesar do crescimento da PEA, há menos trabalhadores com carteira assinada hoje (22,8 milhões) do que em 1980 (23 milhões).
O que aconteceu nesse período foi a chamada precarização dos postos de trabalho: nos anos 90, a cada 10 novas ocupações, 8 eram de não-assalariados (autônomos, biscateiros etc.). E os 2 postos assalariados não tinham carteira de trabalho assinada.
As causas desse processo, segundo Pochmann, foram basicamente duas. De um lado, houve uma estagnação econômica que já dura duas décadas. A renda per capita brasileira em 1998 é praticamente igual a de 1980. 'È sem crescimento econômico não dá para pensar em emprego", diz o economista.
Por outro lado, a década de 90 marcou a mudança do modelo econômico. Mesmo crescendo entre 1993 e 1997, o país não conseguiu produzir mais empregos.
O motivo, afirma Pochmann, foi a abertura às importações em um contexto competitivo desfavorável às empresas nacionais: juros mais altos do que os internacionais e sobrevalorização do câmbio.
Um bom exemplo prático disso foi o que aconteceu com o setor de bens de consumo duráveis. Entre 1993 e 1997, o setor cresceu 66%, quase três vezes mais do que o PIB. Mas, mesmo assim, não puxou o crescimento do nível de emprego.
No segmento automobilístico, as empresas que estavam na parte anterior da cadeia produtiva foram desnacionalizadas ou fechadas, provocando a importação de autopeças. Não se produziu assim mais empregos para metalúrgicos nem na produção de aço.
E na parte posterior da cadeia, não houve investimentos públicos em infra-estrutura (construção de estradas) que originassem mais empregos na construção civil.
Diretor-executivo da Fundação Seade, Pedro Paulo Martoni Branco acrescenta outros pontos à explicação de Pochmann sobre o aumento do desemprego na década.
Ele lembra que, em 1990, houve a recessão provocada pelo confisco do Plano Collor, ao que se seguiu uma política de abertura às importações que provocou muitas falências. Esse quadro prosseguiu até o final de 1992, elevando a taxa nacional de desemprego de 3% (1989) para 6,9%.
Com o impeachment do ex-presidente, houve um aumento da confiança dos agentes econômicos e uma retomada do crescimento. Mas este foi insuficiente para a recuperação do nível de emprego da década anterior por causa da ameaça da inflação.
Em 1994 vem o Plano Real, o fim da inflação e uma redistribuição de renda que reacendem o consumo. Esse processo de recuperação conduz a uma pequena queda do desemprego, que cai a 6,4% em 1995.
A partir daí, entretanto, o efeito da segunda onda de abertura às importações se estende a outros setores da economia além da indústria: os bancos demitem e o comércio se reestrutura, cortando funcionários. O desemprego chega a 7,2% em 1996.
No ano seguinte, as restrições externas e o desequilíbrio cambial provocam uma nova alta dos juros que, combinadas à reestruturação produtiva, elevam o desemprego a 8,2%. Desde então, esses problemas só se agravaram.
Martoni Branco e Pochmann têm a mesma conclusão: a retomada do crescimento não será o bastante para diminuir o desemprego.
"Sem políticas sociais compensatórias, como a bolsa-escola, não tem jeito", diz o diretor do Seade.
"Além das políticas sociais, é preciso mudar o modelo e fazer as reformas agrária e tributária", diz Pochmann.
(JRT)



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