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YOSHIAKI NAKANO
Verdades que incomodam
A política econômica em vigor divide o país, e um país dividido não tem identidade e não pode ter crescimento
O PRESIDENTE Lula havia
anunciado como meta de governo destravar o crescimento e alcançar a taxa de 5% ao ano a partir de 2007. O anúncio havia despertado alguma esperança, já
que, reeleito com votação expressiva, não seria nenhuma ousadia buscar uma taxa de crescimento que
ainda fica abaixo da média da América Latina. Diante das primeiras dificuldades, Lula parece ter desistido
da meta de crescimento e postergou
para janeiro o anúncio do programa
para os próximos quatro anos.
Afinal, o que se espera do presidente e o que trava o Brasil? A resposta é simples: o governo precisa
governar o aparelho de Estado e dar
um rumo para o país, e o presidente
eleito precisa assumir a função de
presidente da República. Precisamos começar fazendo o básico.
O Estado apropria mais de 45% de
tudo o que o país produz e entrega
(?) à população serviços públicos de
qualidade muito ruim e despesas
que causam revolta ou aumentam o
sentimento de injustiça na população: previdência pública privilegiada, salários astronômicos, escândalos e corrupção. Em outras palavras,
impõe sobre os setores produtivos
uma tributação sufocante para financiar despesas que não atendem
as demandas da população e colocam a sociedade contra o Estado.
Assistimos diariamente a um espetáculo em que o público é convertido em privado e a instituição da representação popular é convertida
no seu oposto, premiando a ética do
levar vantagem e massacrando os
conceitos de cidadania e de nação.
A política econômica em vigor divide o país. De um lado, o setor produtivo e os consumidores transferem uma parte excessiva do valor da
produção e de seus rendimentos para o setor financeiro, pagando as taxas de juros mais altas do mundo. De
outro, os setores exportadores
transferem parte do valor da produção para os consumidores de importados, por meio da taxa de câmbio
valorizada.
Um país dividido não adquire
identidade, não há sentimento de
destino comum e não é possível levar adiante um projeto comum de
crescimento. Os perdedores ficam
com a sensação de país sem rumo,
onde impera o arbítrio, pois o fisco
torna-se ameaçador e suas demandas são ignoradas pelas autoridades
públicas. Infelizmente, os perdedores são os empresários dos setores
produtivos e os trabalhadores, exatamente os responsáveis diretos pelos investimentos, pela produção e
pelo crescimento. Os ganhadores
não querem mudanças e utilizam
todos os meios para bloqueá-las.
Aqueles que ousam propor mudanças são convertidos em hereges e
aloprados e são crucificados pela
imprensa.
O governo precisa assumir o comando do aparelho de Estado e fazê-lo trabalhar em benefício da população e do bem público -e não em
beneficio próprio. Cabe ao governo
promover o reencontro do Estado,
burocrático e predador, com a população, delimitando claramente o que
é público e o que é privado, recompondo a capacidade de planejar, tomar decisões e agir antecipando-se
aos problemas e, dessa forma, restabelecer a confiança. É preciso garantir a cidadania, dando poder ao povo
para responsabilizar os governantes
e, assim, fundar uma nova moralidade na gestão da coisa pública. O presidente tem de descer do palanque e
governar a República. Como líder,
deve começar apresentando um
projeto nacional capaz de trazer benefícios a todos os segmentos da população e, dessa forma, reconciliar
os interesses e dar rumo ao Brasil.
YOSHIAKI NAKANO, 62, diretor da Escola de Economia de
São Paulo da FGV (Fundação Getulio Vargas), foi secretário da Fazenda do Estado de São Paulo no governo Mario
Covas (1995-2001).
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