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ANÁLISE
Mercado imobiliário deve continuar volátil em 2010
Ano de 2009 deve marcar início de uma nova era de instabilidade no preço dos imóveis; é a primeira vez que isso acontece em tantos países ao mesmo tempo
ROBERT J. SHILLER
ESPECIAL PARA O PROJECT SYNDICATE
Instabilidade é um fenômeno conhecido há muito no mercado da habitação, mas até agora ela jamais se havia manifestado ao mesmo tempo em tantos lugares do mundo. De fato,
o ano de 2009 pode até se tornar um marco para o início de
uma nova era de instabilidade.
Desde 2000, temos encontrado os mais dramáticos indícios de bolhas especulativas
nos mercados de casas utilizadas para moradia. Os preços
das casas explodiram, de 2000
para a frente, na América do
Norte, Europa e Ásia, e em muitos outros locais isolados em
todo o mundo. Os mercados
chegaram a um pico em 2007 e
depois caíram acentuadamente
em muitos desses locais, com o
início da crise financeira mundial. Surpreendentemente,
houve certa recuperação de
preços em 2009.
Nos Estados Unidos, o índice
S&P/Case-Shiller para os preços da habitação em dez grandes cidades registrou sua maior
inversão desde que o indicador
foi criado, em 1987, com alta de
5% (15% em termos anualizados) entre abril e agosto de
2009, depois de cair 7% (21%
em termos anualizados) nos
quatro meses entre dezembro
de 2008 e março de 2009. Altas
recentes no preço dos imóveis
também foram vistas na Austrália, Reino Unido, Hong
Kong, Coreia do Sul, Cingapura
e Suécia. E há rumores otimistas em diversos outros mercados.
Os preços das casas estão em
uma verdadeira montanha russa, e talvez jamais consigamos
compreender os seus movimentos, a não ser em termos de
volatilidade. De fato, em um
mercado instável e especulativo, no qual as pessoas compram
e vendem porque estão tentando antecipar outros movimentos de preços, a história confirma que os movimentos de preços serão difíceis de explicar,
até mesmo em retrospecto.
Eles refletem alterações na psicologia dos investidores, que
são difíceis de discernir, e também novas informações, que
podem ser amorfas ou ambíguas.
Essa alta na volatilidade parece refletir uma nova atitude
em relação à casa como ativo.
Costumávamos ver as casas como parte da mesma categoria
que os automóveis: ativos em
depreciação que acarretam manutenção dispendiosa e terminam substituídos. Agora nós as
consideramos como bens escassos em um mundo que cresce rapidamente e cujos preços
têm o potencial de disparar a
qualquer hora.
A ideia comum sempre foi a
de que o valor de uma casa estava primordialmente na estrutura, e não no terreno. Isso se
tornará cada vez mais verdadeiro à medida que condomínios verticais se tornarem mais
e mais comuns. Em certos casos, cem casas podem ser, na
prática, empilhadas umas sobre as outras. Com uso de terra
tão intensivo, as restrições que
a questão dos terrenos impunha à construção de casas se
tornam cada vez menores. Essa
tendência deve ser mantida, reduzindo ainda mais a importância dos terrenos como componente no valor das casas.
Mas as recentes bolhas especulativas na verdade ampliaram a proporção dos terrenos
no valor das casas. Ainda que
boa parte de seus efeitos sejam
temporários, hoje tendemos a
pensar em casas mais como terrenos do que como estruturas.
Os economistas computam o
valor de terrenos urbanos subtraindo o custo estimado de
construção da casa do valor de
venda, de modo que o valor do
terreno é inferido como resíduo. Os economistas o fazem
porque na maioria dos lugares
vendas diretas de terrenos urbanos desocupados são raras, e
em geral envolvem lugares ou
circunstâncias incomuns, o que
torna essas vendas pouco representativas. Assim, o componente da bolha nos preços das
casas é atribuído a uma alta nos
preços dos terrenos, ainda que
os preços dos terrenos distantes das áreas urbanas de mercado mais movimentado sejam
imensamente inferiores.
Muita gente parece acreditar
que altas no preço das casas refletem a crescente escassez de
terrenos. Esses observadores
entendem o recente colapso da
bolha imobiliária como simples
efeito de uma crise financeira
temporária.
Esse raciocínio pode estar influenciando a recente recuperação nos preços das casas. Mas
o fato é que provavelmente deve ser mais preciso encarar os
altos e baixos dos mercados
mundiais de habitação como
reflexo das mudanças em nosso
pensamento sobre a habitação
como investimento.
Se for esse o caso, a instabilidade nos preços das casas desde 2000 resultou de raciocínio
incorreto e não foi efeito natural do crescimento econômico
mundial, que vem mantendo
níveis relativamente estáveis já
há décadas. O raciocínio incorreto, por sua vez, encorajou
práticas frouxas pelas instituições de crédito hipotecário, e
levou os bancos centrais a não
agir enquanto as bolhas de habitação se desenvolviam.
Em muitos países, os governos responderam ao colapso
das bolhas de habitação, em
2009, instituindo políticas que
tinham por objetivo sustentar
esses mercados especulativos.
O resultado, porém, foi levar as
pessoas a adicionar outro componente, político, à sua avaliação dos preços das casas, o que
os afastou ainda mais dos fundamentos econômicos.
Um fato básico costuma ser
esquecido: o moderno setor de
construção tem plena capacidade de construir grande número de casas modernas, entre
as quais muitos apartamentos
em edifícios altos, por preços
muito inferiores aos atingidos
atualmente pelas casas em
muitas áreas urbanas. Isso deve
servir de freio à longa escalada
dos preços das casas.
Os especuladores da habitação parecem muitas vezes
apostar em um equilíbrio político que restrinja a oferta de
imóveis, e na continuação, por
prazo indefinido, das medidas
artificiais de sustentação adotadas na crise. Mas, em uma
economia globalizada, com fluxos crescentes de população e
um compromisso aberto para
com a liberdade econômica,
torna-se difícil para os governos restringir a oferta no longo
prazo.
É por isso que parece mais
seguro prever alta volatilidade
em 2010 do que uma alta nos
preços das casas.
ROBERT SHILLER é professor de economia na
Universidade Yale e economista-chefe da MacroMarkets; ele é autor de "The Subprime Solution: How Today's Global Financial Crisis Happened, and What to Do about It".
Tradução de PAULO MIGLIACCI
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