São Paulo, quinta-feira, 01 de fevereiro de 2007
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criança

1 brinquedo, 10 lições

Repartir, conservar, ordenar, imaginar e se expressar estão entre os diversos ensinamentos do brinquedo à criança; pais e cuidadores não devem limitar a criação de novos usos

TATIANA DINIZ
DA REPORTAGEM LOCAL

B rinquedos são muito mais que objetos capazes de distrair as crianças. Em cada um deles, um arsenal de aprendizados está guardado e prestes a ser despertado pelo contato. Repartir, conservar, ordenar e imaginar são apenas algumas das lições comuns a uma boneca, um carrinho ou uma caixa de papelão.
E, antes de se meter na brincadeira, vale saber que o melhor é não limitar a exploração e a criação livre de novos usos para o mesmo objeto. Dessa ação, nascem traços como criatividade e autonomia, importantes por toda a vida.

1. Organização
Guardar os brinquedos é o primeiro contato com a necessidade de organizar. Mais do que a imposição da ordem, vale a valorização da funcionalidade dela. Organizar é preciso para depois saber onde os brinquedos estão. A própria criança pode ajudar a escolher o lugar que acha mais apropriado para cada coisa -a prateleira dos jogos e a caixa dos bonecos, por exemplo

2. Partilha
Crianças aprendem rápido que brincar com outras é mais legal do que brincar sozinhas. Atitudes de compartilhamento e de troca surgem espontaneamente dessa descoberta. Brinquedos velhos ou excesso de brinquedos podem ainda servir para a introduzir outras partilhas: é possível repassá-los a crianças menores, doá-los a que não tem brinquedos até cedê-los à escola

3. Conservação
O que é bem cuidado dura mais. Essa lição pode ser reforçada a partir da manutenção dos brinquedos. Participar do conserto de um brinquedo ensina que nem tudo que se quebra está perdido. Colar partes e reunir pedaços encaixáveis são reparos que as crianças podem dominar. Vale lembrar aqui que conservar é diferente de guardar o que não serve mais

4. Identidade (imitação, símbolos)
O brinquedo é uma ferramenta para a imitação dos modelos reais. Entre as crianças mais velhas, essa imitação se torna carregada de conteúdo símbólico. No brinquedo, a criança se projeta e projeta outras pessoas que conhece e experimenta fantasiar as tarefas cotidianas dela. Exercita papéis diversos, brincando de ser o outro e apredendo mais sobre si mesma

5. Criatividade e imaginação
Criar e imaginar perpassam a atividade lúdica. É a fantasia que permite transformar uma boneca em um bebê, um punhado de terra em um bolo ou uma caixa de sapato em um carrinho. É importante que pais e cuidadores não subestimem a criação de hipóteses nem reduzam a experiência de explorar livremente o brinquedo. A habilidade nascida disso fará diferença no futuro

6. Sociabilização
Basta ir a um parquinho ou à praia para observar como as crianças se valem dos brinquedos como meio de sociabilização. Recorrendo a eles, desenvolvem abordagens de aproximação. Negociam e conduzem atividades coletivas. O ideal é interferir minimamente nesses contatos. E, até na confusão por um brinquedo, todos têm argumentos que merecem ser ouvidos

7. Autonomia
Com o brinquedo na mão, a criança escolhe o que quer fazer (ou faz o que combinou com os amigos). O contato com o objeto é instigante e gera motivação para que ela o explore e ganhe habilidade para utilizá-lo. Essa capacidade de auto-gestão vai ser reproduzida até mesmo nas situações em que tem de se distrair, mas não há nenhum brinquedo por perto

8. Linguagem
A comunicação é uma das molas-mestras na construção da brincadeira. Ela é necessária para a expressão e para a compreensão das outras crianças. O brinquedo ajuda a desenvolver a elaboração da linguagem oral e, entre as crianças não-alfabetizadas, chega a assumir a carga de um texto. A troca de informações amplia o vocabulário e aperfeiçoa a fala

9. Regra
Qualquer brinquedo desencadea relações com regras de uso, desde as regras pré-existentes de um jogo às regras combinadas entre as próprias crianças. É preciso decidir quem será quem na brincadeira de casinha, decidir quem vai pedalar no velocípede primeiro, quem espera a vez e por quanto tempo espera. Essas vivências ensinam que regras são necessárias

10. Solução de problemas
Enquanto brincam, as crianças embarcam numa busca contínua por novas respostas. Deparam-se com situações imprevistas e são instigadas a solucioná-las. Aprendem a ajudar quem sabe menos e compartilham dicas para que o participante novo possa entrar na brincadeira que ainda não conhece. Essa habilidade de solucionar contribui para o bom esempenho escolar


Fontes: ÁDERSON LUIZ COSTA JÚNIOR, professor de psicologia da saúde e de desenvolvimento humano do Instituto de Psicologia da UnB (Universidade de Brasília) GLÁUCIA PALMIERI, professora de educação infantil da Escola Teia Multicultural, em São Paulo e MARIA ANGELA BARBATO, coordenadora do Núcleo de Cultura, Estudos e pesquisas do Brincar da PUC-SP (Pontíficia Universidade católica de São Paulo)


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