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COMIDA NATURAL
À mesa com o monge
Chef especializado na culinária budista conta como equilibra cinco sabores em cada
refeição
MARIANA VERSOLATO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Os temperos são suaves, a lista de ingredientes é restrita e os
legumes são literalmente "divinos" nesta milenar
culinária de inspiração budista.
Os adeptos dessa cozinha,
nascida na China e introduzida
no Japão no século 5, creem
que a comida natural purifica o
espírito. Não usam carnes ou
peixes -comê-los significaria
"roubar vida". O Brasil, que
pouco conhece essa gastronomia, recebeu nesta semana um
de seus chefs mais notórios.
Toshio Tanahashi, 49, é diretor do curso de arte culinária e
design da Universidade de Kyoto. Em sua primeira visita ao
país, conversou com a Folha
sobre a culinária "Shôjin Ryôri", nome que une os significados de dois ideogramas: espírito e progresso, representando a
prática budista do desenvolvimento espiritual e da gratidão.
"O importante é ter sentimento e inspiração em relação
à gastronomia", diz. Antes de
cozinhar, ele pratica um ritual:
limpa o ambiente e purifica seu
corpo jogando água sobre si
mesmo. "São procedimentos
para ter um encontro com a
verdura, que é divina."
Apesar de seguir as regras,
Tanahashi diz que sua cozinha
não é tão tradicional. "Dentro
da limitação de ingredientes,
tenho a liberdade de cozinhar
como quero. Se tenho vontade
de usar um alimento, uso. Não
gosto de coisas prefixadas."
Em cada prato que cria, o
chef tenta equilibrar cinco sabores: doce, salgado, azedo,
amargo e picante. "Uma refeição deve ter altos e baixos; não
pode ser homogênea."
Há cinco temperos riscados
da sua lista de compras por serem considerados muito fortes,
capazes de esconder o sabor
das verduras, que ele define como delicado. São alho, cebola,
cebolinha, nirá e nobiru, dois
temperos japoneses. Também
evita o sal, que, segundo ele,
pode uniformizar os sabores.
Confessou que achou a comida
brasileira muito salgada. "O sal
não é o único tempero. Pode-se
usar outros, como shoyu, vinagre, missô e até saquê."
O chef passou a se interessar
por culinária budista aos 27,
quando viu um programa de
TV sobre um templo em Shiga,
perto de Kyoto. "Na época, eu
me questionava sobre minha
identidade japonesa e tive a
ideia de ir até lá para saber
mais sobre a cultura do meu
país." Tratava-se do templo
Gesshinji, famoso por sua cozinha. Lá, trabalhou como aprendiz por três anos. Hoje, dedica-se à gastronomia budista como
chef, professor e divulgador.
Em casa, ele diz não cozinhar
tão bem. "Não me dedico muito
a mim mesmo. Eu me inspiro
em minha mãe: nem sabíamos
quando ela comia. Ela pensava,
antes de tudo, em satisfazer os
filhos", lembra.
[...]
Dentro da limitação de ingredientes, tenho a liberdade de cozinhar como quero. Se tenho vontade de usar algum alimento, uso. Não gosto de coisas prefixadas
TOSHIO TANAHASHI,
chef japonês
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