São Paulo, quinta-feira, 01 de abril de 2010
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COMIDA NATURAL

À mesa com o monge

Chef especializado na culinária budista conta como equilibra cinco sabores em cada refeição

MARIANA VERSOLATO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Os temperos são suaves, a lista de ingredientes é restrita e os legumes são literalmente "divinos" nesta milenar culinária de inspiração budista.
Os adeptos dessa cozinha, nascida na China e introduzida no Japão no século 5, creem que a comida natural purifica o espírito. Não usam carnes ou peixes -comê-los significaria "roubar vida". O Brasil, que pouco conhece essa gastronomia, recebeu nesta semana um de seus chefs mais notórios.
Toshio Tanahashi, 49, é diretor do curso de arte culinária e design da Universidade de Kyoto. Em sua primeira visita ao país, conversou com a Folha sobre a culinária "Shôjin Ryôri", nome que une os significados de dois ideogramas: espírito e progresso, representando a prática budista do desenvolvimento espiritual e da gratidão.
"O importante é ter sentimento e inspiração em relação à gastronomia", diz. Antes de cozinhar, ele pratica um ritual: limpa o ambiente e purifica seu corpo jogando água sobre si mesmo. "São procedimentos para ter um encontro com a verdura, que é divina."
Apesar de seguir as regras, Tanahashi diz que sua cozinha não é tão tradicional. "Dentro da limitação de ingredientes, tenho a liberdade de cozinhar como quero. Se tenho vontade de usar um alimento, uso. Não gosto de coisas prefixadas."
Em cada prato que cria, o chef tenta equilibrar cinco sabores: doce, salgado, azedo, amargo e picante. "Uma refeição deve ter altos e baixos; não pode ser homogênea."
Há cinco temperos riscados da sua lista de compras por serem considerados muito fortes, capazes de esconder o sabor das verduras, que ele define como delicado. São alho, cebola, cebolinha, nirá e nobiru, dois temperos japoneses. Também evita o sal, que, segundo ele, pode uniformizar os sabores. Confessou que achou a comida brasileira muito salgada. "O sal não é o único tempero. Pode-se usar outros, como shoyu, vinagre, missô e até saquê."
O chef passou a se interessar por culinária budista aos 27, quando viu um programa de TV sobre um templo em Shiga, perto de Kyoto. "Na época, eu me questionava sobre minha identidade japonesa e tive a ideia de ir até lá para saber mais sobre a cultura do meu país." Tratava-se do templo Gesshinji, famoso por sua cozinha. Lá, trabalhou como aprendiz por três anos. Hoje, dedica-se à gastronomia budista como chef, professor e divulgador.
Em casa, ele diz não cozinhar tão bem. "Não me dedico muito a mim mesmo. Eu me inspiro em minha mãe: nem sabíamos quando ela comia. Ela pensava, antes de tudo, em satisfazer os filhos", lembra.

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Dentro da limitação de ingredientes, tenho a liberdade de cozinhar como quero. Se tenho vontade de usar algum alimento, uso. Não gosto de coisas prefixadas
TOSHIO TANAHASHI,
chef japonês



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