São Paulo, quinta-feira, 01 de junho de 2006
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Adolescência

Estudo mostra que relógio biológico de adolescentes não condiz com aulas antes das 8h; pesquisador chama a diferença de "jet lag social"

Relógio descompassado

ANDREA MURTA
THIAGO MOMM
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Mariana de Freitas Barreiro, 19, está fora do seu fuso horário. Aluna do cursinho Anglo, ela às vezes cochila em sala e, quando o sono persiste, tenta compensá-lo nos intervalos de dez minutos entre as aulas: "Em segundos, eu durmo profundamente e chego a sonhar".
Alessandra Weinmann, 17, acorda às 5h e chega ao mesmo cursinho, com o mesmo sono, às 7h. À tarde, fica na sala de estudos porque, se for para casa, acaba dormindo.
A dificuldade para ficar acordado pela manhã é comum aos adolescentes, segundo o pesquisador Till Roenneberg, da Universidade Ludwig-Maximilians, em Munique, Alemanha. Roenneberg, que estuda o relógio biológico, defende horários mais flexíveis e afirma que nenhum colégio deveria começar suas atividades antes das 8h. "Aulas mais tarde levariam os adolescentes a uma melhora de aprendizado, memória e desempenho", afirmou o cronobiologista à Folha.
A defesa de que a rotina deve se adaptar à necessidade de sono da população, e não o contrário, faz parte de um estudo coordenado por Roenneberg com 40 mil voluntários, publicado neste ano na revista científica "Chronobiology International". Segundo a pesquisa, 50% das pessoas sofrem de "jet lag social" -como se estivessem permanentemente sob os efeitos de uma mudança brusca de fuso horário.

Corujas e cotovias
O "jet lag social" se deve ao descompasso entre o relógio biológico e os horários dos compromissos sociais. Segundo especialistas ouvidos pela Folha, adolescentes têm mais necessidade de sono. Nesse grupo, que tem também maior dificuldade para dormir e acordar cedo, o desajuste é pior: acordar às 6h equivale a sair da cama à meia-noite, afirma Roenneberg. Biologicamente, é como se os alunos estivessem estudando de madrugada.
Adolescentes são o que o pesquisador chama de "corujas": pessoas que naturalmente sentem sono mais tarde que as outras, geralmente entre meia-noite e 4h. Em tese, deveriam também acordar mais tarde. No outro extremo, estão as "cotovias", pessoas propensas a dormir por volta das 20h e acordar em torno das 4h.
Segundo Roenneberg, para evitar que as "corujas" sofram, horários devem ser adaptados de acordo com a faixa etária. Quem tem menos de 14 anos deve começar as aulas às 8h. Quem tem entre 14 e 17 anos deve iniciar às 9h. Para jovens de 18 a 21 anos, o horário ideal é entre 9h30 e 10h.
Ele cita o exemplo de uma experiência na cidade de Minneapolis (EUA). Estudantes de sete escolas públicas de segundo grau foram acompanhados antes e depois da mudança do horário escolar, em 1997 -quando o início das aulas passou de 7h15 para 8h40.
Os alunos relataram diminuição na sensação de depressão, menos sono e aumento da freqüência às aulas. Agora, o exemplo está sendo seguido em pelo menos duas escolas, na Suíça e na Alemanha.

Adultos
Adultos também sofrem do "jet lag social". De acordo com o neurologista Flávio Alóe, do laboratório de sono do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da USP, os efeitos começam a ser sentidos, especialmente com tarefas que exigem criatividade, a partir de três dias com uma hora de sono a menos do que o necessário.
Para mitigar esses efeitos, especialistas recomendam a exposição à luz do sol pela manhã, ainda que seja no trajeto casa-trabalho. A luz do ambiente natural é de 50 a 1.000 vezes mais clara do que a luz interna dos escritórios e escolas.

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Segundo a pesquisa, 50% das pessoas sofrem de "jet lag social" permanentemente

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