São Paulo, quinta-feira, 02 de julho de 2009
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depoimento

Após 15 anos, uma surpresa

BEATRIZ PERES
EDITORA DO EQUILÍBRIO

Na primeira metade dos anos 1990, as crianças contaminadas no parto se dividiam em dois grupos: os bebês, que tinham resultados positivos para o vírus, mas poderiam ter apenas os anticorpos anti-HIV da mãe, e as um pouco mais velhas, que não conseguiriam mais obter um exame negativo.
Os voluntários que trabalhávamos na casa de apoio a crianças soropositivas recebemos Thompson já no segundo grupo. Aos sete anos, convivia com um diagnóstico que projetava um futuro incerto e enfrentava um mundo de preconceito do qual não podíamos protegê-lo.
O que dizer a um menino que volta da escola reclamando do bebedouro exclusivo que os colegas lhe haviam reservado? E o que responder quando ele contava que os outros não queriam tocá-lo, apesar de seus argumentos sobre a impossibilidade de transmitir o vírus pelo abraço?
Entre os vários remédios administrados diariamente e as idas constantes ao hospital por conta das doenças oportunistas, tentávamos estabelecer uma rotina possível: ir à escola, fazer as tarefas, ouvir e contar histórias, jogar bola, empinar pipa, conhecer o circo e celebrar os aniversários com festinhas.
E eu evitava pensar no que aconteceria nos anos seguintes -porque nem as minhas expectativas mais otimistas incluíam a surpresa de, após 15 anos sem nenhum contato, ver Thompson adulto entrando na Redação do jornal, para contar à repórter em busca de um personagem tudo o que já fez e o que ainda pretende realizar.


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