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"Tinha medo de tocar nas pessoas"
EDITORA-ASSISTENTE DO EQUILÍBRIO
Quando perguntava por que
tomava remédios, Karina Ferreira da Cruz, 22, ouvia da avó
que era porque tinha problema
de crescimento. "Ela me dizia
que eu tinha bebido água do
parto e por isso tinha problema
para crescer", lembra.
Um dia, aos nove anos, ouviu
a avó contar a uma mulher que
sua neta tinha Aids. "Falei: "Vó,
já que a senhora sabe o que é
Aids, me explica porque eu não
sei". Ela arregalou os olhos, sem
saber o que fazer", lembra.
Karina foi criada por essa
avó. Sua mãe morreu quando
tinha sete anos e seu pai, que
era usuário de drogas, foi assassinado quando ela tinha 16.
Quando "caiu na real" sobre
o que era a doença, a menina
acabou se isolando. "Tinha medo de tocar nas pessoas e passar
a Aids. Para eu ficar com alguém era o caos", diz. Perdeu
esse receio com a ajuda de terapia, que fez "desde que se entende por gente" até os 17 anos.
Antes de sua doença ser descoberta, vivia internada. Depois que começou a usar os antirretrovirais, melhorou e quase não teve mais infecções
oportunistas na infância.
Karina chegou a tomar 12 remédios por dia. Mas, dos 14 aos
18 anos, parou de seguir o tratamento. "Minha avó parou de
me dar os remédios e eu fiquei
rebelde. Eu fingia que tomava,
mas jogava na privada, cuspia."
O fato de não ter dor contribuía. "Não me sentia doente."
Voltou a se tratar depois que
o médico disse que estava esgotando todas as combinações
disponíveis de remédios e que,
se continuasse assim, só poderia tomar medicamentos para
controlar a dor, e não a doença.
Karina conta que teve que lidar com a superproteção da avó
desde nova. "Ela não me deixava fazer nada: podia tomar apenas um sorvete quando fizesse
muito sol. Tinha que voltar para casa às seis da tarde. Até hoje
ela é muito zelosa comigo."
Quando quis namorar, aos 15
anos, a avó não deixou. Namorou escondido, mas teve problemas com a mãe do menino,
que descobriu que ela tinha
Aids. Quando o namorado perguntou por que ela não havia
contado a ele, Karina começou
a chorar. "Falei que não me
sentia preparada. Ele era meu
primeiro namorado, tinha muito medo de perdê-lo."
A relação durou mais de um
ano, mas não resistiu. A mãe
dele chegou a expulsá-lo de casa. "Ela disse que não queria
um filho aidético. Ele tinha 18
anos, não conseguiu emprego.
Acabamos terminando."
Depois disso, e com a morte
do pai, ela entrou em depressão. Recuperou-se com a ajuda
da avó. "Ela me dava força. Dizia: "você tem que viver, a vida
continua"." Fez teatro, atividade que adorou.
Hoje, é casada com Júnior,
19, auxiliar administrativo,
com quem mora na casa da avó.
Eles se conheceram em um
grupo para jovens que vivem ou
convivem com o HIV -Júnior
é filho de mãe soropositiva,
mas não tem o vírus.
Karina é evangélica. Quer ter
filhos, mas, no momento, batalha a casa própria. Pensa em estudar psicologia ou sociologia e,
enquanto não cria coragem para enfrentar o vestibular, quer
tentar um curso técnico de
massoterapia. "Tenho mão boa
para massagem."
É muito engajada em projetos ligados ao HIV e trabalha
em dois deles, como agente de
prevenção e monitora.
(FM)
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