São Paulo, quinta-feira, 02 de agosto de 2001
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Jovem deve iniciar vida sexual em casa?

rosely sayão

"É correto permitir que um adolescente tenha vida sexual em seu quarto ou ele deve procurar outro lugar?" Essa pergunta veio provavelmente da mãe de um adolescente que deve estar se sentindo entre a cruz e a espada a respeito desse assunto. É, nos tempos atuais, os pais são colocados diante de situações desconcertantes e impertinentes! Então vamos pensar na questão dessa mãe, pois tanto a resposta afirmativa quanto a negativa não dão conta de tanta complexidade.
É na adolescência que o filho começa a deixar a situação que caracteriza a infância, que é a de total dependência dos pais, para atingir o estado de autonomia que caracteriza a vida adulta. Claro que isso leva um bom tempo para acontecer -o tempo da adolescência- e pede o acompanhamento de perto pelos pais.
É esse o tempo que o filho tem para se acostumar a deixar de ser filho no sentido infantil, ou seja, a deixar de contar sempre com os pais para que cuidem dele, se responsabilizem por ele, decidam por ele e façam as escolhas de vida por ele; é esse o tempo que o filho tem para aprender a assumir sua vida com liberdade, consequência e independência. Não esperem os adultos que isso ocorra sem percalços, pois é preciso experimentar muitas coisas e errar para então aprender. Foi assim que aconteceu com os pais, não se pode esquecer disso!
Bem, a chegada da sexualidade na forma adulta, que busca um parceiro para se expressar e se realizar, faz parte desse pacote de mudanças que surgem no fim da infância. Nesse momento, é bom lembrar que a prática sexual com outra pessoa simboliza o fim da infância: ao ter um relacionamento sexual, o jovem torna real a possibilidade de ser pai ou mãe, e isso só é possível deixando de se ver e se sentir como filho. Não é à toa que os jovens têm tantas angústias quando iniciam a vida sexual.
Agora podemos voltar à questão inicial e pensar no que ela pode significar. Quando os pais autorizam ou permitem que o filho -mais raramente a filha, por causa dos preconceitos- tenha vida sexual em casa, eles podem atrapalhar, sem ao menos perceber, o acesso desse filho à maturidade. Por quê? Porque essa atitude familiar pode significar para o filho que ele continua a ocupar aquele lugar de dependência dos pais, ou seja, o lugar de criança. Não é assim que os pais agem com o filho quando ele é criança? Precisa ir a algum lugar? Os pais levam. O filho quer um amiguinho para brincar? Os pais buscam, deixam dormir em casa... e assim por diante.
Mas, para que o jovem tenha a chance de iniciar bem a vida sexual adulta, ele precisa se responsabilizar sozinho por ela, precisa avaliar os riscos que ela supõe e arcar com as decisões que toma. Quando os pais facilitam isso para o filho, permitindo que ele traga a namorada ou o namorado para casa -que é dos pais-, acabam se responsabilizando junto com o filho por aquilo que ele faz, e isso só retarda a maturidade.
Um grande sinal de maturidade é o jovem assumir os riscos que um relacionamento sexual supõe, mesmo tomando todas as precauções. Mas, na visão deles, um dos maiores problemas quando iniciam a vida sexual é o risco de gravidez, mesmo quando eles usam um método contraceptivo seguro. A coisa pega porque eles buscam, de todos os modos, garantias de que podem transar sem correr o risco de uma gravidez indesejada. Esse pode ser o mais importante sinal de que estão começando o sexo genital precocemente. Afinal, quem tem a ilusão de que há garantias na vida são as crianças...
Não se pode negar que o mundo está muito violento, que os riscos que os filhos correm fora de casa são enormes. Mas, gostemos ou não, esse é o mundo que os espera na vida adulta. Mas, queiramos ou não, ficar em casa e permanecer no lugar de criança também é um grande risco.


ROSELY SAYÃO é psicóloga, consultora em educação e autora de "Sexo É Sexo" (ed. Companhia das Letras); e-mail: roselys@uol.com.br



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