São Paulo, quinta-feira, 07 de fevereiro de 2008
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No ritmo da malhação

As revistas e sites de exercícios físicos adoram perguntar aos leitores sobre suas canções favoritas na hora de malhar, enquanto apresentam sugestões ou listas de músicas de celebridades. O site self.com oferece uma "lista de sucessos dos anos 80", que inclui "Wake me Up Before You Go-Go", do Wham!, um clássico brega. Na fitnessmaga-zine.com, a cantora Rihanna revela suas canções de exercícios favoritas -e imodestamente inclui quatro de suas gravações, "para quando você precisa acelerar o ritmo na esteira".
Essa obsessão com listas de músicas tem base científica. Estudos demonstraram que ouvir música pode melhorar os resultados, tanto em termos de motivação (as pessoas se exercitam mais, e mais vigorosamente) quanto como distração contra fatores negativos, a exemplo da fadiga. Mas será que algumas canções são mais efetivas do que outras?
Em termos gerais, existem fatores científicos envolvidos na escolha da canção certa para o exercício, segundo Costas Karageorghis, professor associado de psicologia esportiva da Universidade Brunel, na Inglaterra, que estuda os efeitos da música sobre o desempenho físico há 20 anos.
Karageorghis criou o Brunel Music Rating Inventory, um questionário para avaliar as qualidades motivacionais da música no contexto do esporte e do exercício. Por quase uma década, ele vem aplicando questionários a painéis que representam diferentes grupos demográficos. Os participantes ouvem uma canção por 90 segundos e avaliam suas qualidades motivacionais para diversas atividades físicas.
Um dos elementos mais importantes, constatou o pesquisador, é a dinâmica rítmica de uma canção, que deve ser de entre 120 a 140 batidas por minuto (BPM). Esse ritmo coincide com a da maior parte dos títulos de dance music comercial e há muitas canções de rock que ficam próximas desse nível, o que leva as pessoas a "desenvolver uma apreciação estética por essa batida", ele diz.
O número também corresponde ao ritmo cardíaco de uma pessoa normal durante uma sessão de exercício de 20 minutos, em ritmo de esportista casual.
Karageorghis diz que "Push It", de Salt-N-Peppa, e "Drop It Like It’s Hot", de Snoop Dogg, estão nessa faixa, da mesma maneira que o remix dance de "Umbrella", de Rihanna (o que indica que a estrela pop talvez soubesse o que estava dizendo).
Para um exercício de alta intensidade, como uma corrida forte, ele sugere "The Heat Is On", de Glenn Frey. As preferências musicais são tão idiossincráticas quanto as rotinas de exercício, evidentemente.
Allison Goldberg, 39, corredora amadora, usa "American Idiot", do Green Day, como seu disco de corrida, porque "não há como desacelerar ouvindo Green Day".
Haile Gebrselassie, o atleta olímpico etíope que conquistou o ouro nos 10 mil metros, muitas vezes pede que "Scatman", uma canção techno com cerca de 135 BPM, seja executada pelo sistema de som do estádio durante suas provas.
Goldberg também incluiu em sua lista "Don’t Phunk With my Heart", do Black Eyed Peas, com 130 BPM; "Mr. Brightside", do Killers, com 150 BPM; e "Dancing Queen", do Abba. O estilo musical que parece mais confiável em termos de BPMs é a dance music, diz Richard Petty, fundador da Power Music, empresa que produz compilações de música para exercícios usadas por instrutores e entusiastas da ginástica há duas décadas. "Uma canção de rock não tem a mesma consistência", diz Petty, um ex-DJ que usa o metrônomo como ferramenta para produzir música para exercícios. Ele escolhe uma canção de sucesso com melodia contagiante e produz um remix cujo BPM é adaptado ao nível de experiência e ao tipo de exercício da pessoa que está usando a música.
Para as pessoas que gostam de caminhar em velocidade de cerca de 5 km/h, a música tem entre 115 e 118 BPM; para quem anda em passo de marcha, a cerca de 7,5 km/h, a contagem sobe a entre 137 e 139 BPM; e para um corredor fica entre 147 e 160 BPM.
As compilações, dirigidas principalmente a mulheres que preferem exercícios cardiovasculares, levam títulos como "Shape Walk -Remixes de Sucessos dos Anos 70", sem pausas entre as canções. A batida incansável permite que uma pessoa sincronize seus movimentos à música, diz Kate Gfeller, professora de música da Universidade de Iowa.
"A música dá um indicador de tempo", diz a professora Gfeller, que depois de fazer uma aula de aeróbica na qual a música escolhida pelo instrutor não combinava com os exercícios, se inspirou a estudar os componentes da música mais importantes para uma sessão de exercícios produtiva. "A música nos ajuda a nos movimentarmos de maneira mais eficiente, e isso propicia maior resistência".
Em outras palavras, as melhores canções de exercício têm tanto um BPM elevado quanto ritmo que auxilie na coordenação de movimentos. Isso deve resultar na eliminação de qualquer forma de música com mudanças abruptas na assinatura rítmica, como o jazz moderno ou o punk pesado, bem como canções que tenham muita variação de intensidade, a exemplo de boa parte do rock indie. E também descarta o que o escritor e neurologista Oliver Sacks define como "música sem a força rítmica adequada".
"Estou pensando em Wagner", disse Sacks, cujo mais recente trabalho, "Alucinações Musicais", discute a conexão entre ritmo e movimento.
Sacks gosta de nadar e diz que a cadência um-dois-três de suas braçadas muitas vezes o conduz a "tocar" uma valsa em sua cabeça. "Neurologicamente, não faz diferença que você esteja ouvindo música ou apenas imaginando", afirmou. "Uma imaginação vívida é capaz de acionar partes motoras."
Boa parte das pesquisas realizadas sobre música e exercícios se dirige a atividades aeróbicas como ginástica cardiovascular. Mas, como sabe qualquer pessoa que já tenha ouvido Metallica bem alto em uma sala de levantamento de peso, a música também pode motivar nos exercícios de força. "A vasta maioria dos halterofilistas aprecia o heavy metal, se não na vida pessoal ao menos na academia", disse Shawn Perine, redator da revista "Flex". Música alta e agressiva, ele afirma, "mantém o pique, especialmente entre as séries".
Perine prefere se exercitar ouvindo hip-hop. "Depois de uma série cansativa de agachamentos, o fôlego desaparece, mas, se começa a tocar ‘Mama Said Knock You Out’, de L. L. Cool J, a música segura a energia lá em cima."
No entanto, será que existe uma canção perfeita para o exercício, que transcenda as modalidades e as preferências pessoais? Um título mencionado com muita freqüência é "Gonna Fly Now", o tema dos filmes "Rocky". Em um livro sobre música e esportes para o qual ele contribuiu e que será lançado em breve, Karageorghis escreve que a canção "evoca um estado de otimismo e excitação no ouvinte", e Goldberg diz que foi essa a música que a ajudou a superar sua primeira maratona. A fanfarra da Bishop Loughlin Memorial High School costuma tocar no percurso na maratona de Nova York e há 30 anos executa o tema de "Rocky".


Tradução de PAULO MIGLIACCI

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