São Paulo, quinta-feira, 09 de novembro de 2006
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saúde

Mais que dor nas costas

Terapia biológica permite frear a evolução da espondilite anquilosante, doença auto-imune que pode provocar deformidades na coluna; diagnóstico precoce é a chave para evitar complicações sérias, diz médico

TATIANA DINIZ
ENVIADA ESPECIAL A BERLIM

Dor nas costas, geralmente originada na região da bacia, crônica e persistente por meses e acompanhada de dificuldades para se movimentar após os períodos de descanso -com grande rigidez depois de acordar, por exemplo.
Esses costumam ser os primeiros sinais da espondilite anquilosante, uma doença auto-imune que atinge mais homens do que mulheres e que costuma se revelar durante a juventude: entre 20 e 40 anos de idade.
A boa notícia é que uma nova geração de medicamentos vem sendo aplicada no combate à progressão dos sintomas, e os tratamentos desse tipo começam a se popularizar no país.
Batizada de terapia biológica, a abordagem é feita com medicamentos do tipo "inteligente", que simulam o papel de um componente do organismo humano para frear o distúrbio.
Facilmente confundida com lombalgia ou dor ciática, a espondilite pede atenção redobrada e diagnóstico precoce. Sem tratamento adequado, cerca de dez anos são suficientes para levar a desdobramentos sérios. Incapacidade produtiva e surgimento de deformidades na coluna atingem de 30% a 40% dos portadores, alertam os especialistas.

Auto-ataque
Assim como acontece na artrite reumatóide e nos demais distúrbios auto-imunes, a espondilite anquilosante se desenvolve a partir do funcionamento inadequado do sistema imunológico, em que o organismo passa a atacar suas células.
As causas desse "descompasso" seguem desconhecidas pela ciência, mas sabe-se que há relação com predisposição genética e estilo de vida e suspeita-se que episódios estressantes possam atuar como "gatilhos".
Sem cura, as doenças auto-imunes não levam à morte, mas chegam a inviabilizar a realização de atividades cotidianas como caminhar, trabalhar ou alimentar-se sozinho.
Nas terapias biológicas, a chave para inibir o auto-ataque é anular a atuação do TNF (fator de necrose tumoral, na sigla em inglês), proteína que atua como "comunicador" no sistema imunológico, apontando a presença de "invasores". Num quadro auto-imune, o TNF manda uma mensagem inadequada. Os remédios biológicos inibem a atividade da proteína, acoplando-se a ela ou simulando serem receptores dela.

Diagnóstico precoce
A estudante Laura Koziol, 26, é um dos três milhões de europeus que sofrem de espondilite anquilosante. Diagnosticada há dois anos, ela trilhou um longo caminho até descobrir que doença tinha. As dores nas costas foram se somando à perda progressiva dos movimentos. Em dois anos, não conseguia mais ir à universidade, abandonou o trabalho de garçonete e parou de jogar tênis.
"Fiquei extremamente deprimida. A parte mais dura foi me tornar dependente dos outros para fazer qualquer coisa", contou há duas semanas em um evento realizado pelo laboratório Abbott, em Berlim, que reuniu portadores de doenças auto-imunes, médicos, pesquisadores e jornalistas. Koziol fez parte de um estudo clínico para uso de Humira, um medicamento biológico desenvolvido pelo Abbott cuja liberação para tratar espondilite anquilosante no Brasil aguarda aprovação da Anvisa. Além dele, o Remicade (Schering-Plough) e o Enbrel (Wyeth Pharma) completam a lista dos remédios biológicos disponíveis no Brasil. Na semana passada, o Ministério da Saúde incluiu o Enbrel na relação dos remédios a serem fornecidos pelo SUS (Sistema Único de Saúde) para tratar a artrite reumatóide.
"Embora ainda sejam alternativas caras, representam um avanço muito significativo. Há alguns anos, tínhamos poucas opções. Os tratamentos eram baseados em antiinflamatórios que, a longo prazo, revelavam alta toxicidade digestiva", comenta o reumatologista Eduardo de Souza Meirelles, do Hospital das Clínicas de São Paulo. Um mês de terapia biológica pode custar até R$ 6.000.
O diagnóstico ainda na fase inicial da doença é o caminho mais eficiente para evitar complicações. "O papel dos médicos de todas as especialidades é grande aqui. Não há exames específicos para detectar a espondilite. Reconhecê-la é um verdadeiro quebra-cabeça. Une ressonância magnética, medição do processo inflamatório em exame de sangue, avaliação dos sintomas físicos e relato do paciente", observa Meirelles.
Para compartilhar informações sobre a espondilite anquilosante, foi criada, há dois anos, a Abrespan (Associação Brasileira de Portadores de Espondilite Anquilosante), que se reúne em São Paulo e no Rio de Janeiro. É possível se filiar pelo site www.abrespan.com.br ou pelo telefone 0/xx/11/3081-5999.


A jornalista Tatiana Diniz viajou a Berlim a convite do laboratório Abbott


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