São Paulo, quinta-feira, 17 de janeiro de 2008
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

esporte

Remar é preciso

Uma hora e meia de treino pode consumir 1.200 calorias; em atletas, o gasto chega a 5.000 calorias por dia

AMARÍLIS LAGE
DA REPORTAGEM LOCAL

Quando pediu a seu médico a sugestão de um esporte bom para a saúde, o estudante Paulo Henrique Moreira Kantovitz, que já praticava natação, ouviu a seguinte resposta: melhor que nadar, só remar.
Quatro anos atrás, resolveu seguir a dica e trocou a piscina pela raia olímpica da USP (Universidade de São Paulo). Cinco vezes por semana, sai de casa às 5h30, chega à raia antes das 6h, entra no barco e vê o sol nascer refletido nas águas. A dedicação compensa. Embora a natação detenha a fama de "esporte completo", ela divide esse pódio com o remo: a atividade exige tanto força quanto resistência aeróbica e trabalha 85% dos músculos do corpo, incluindo as regiões peitoral e abdominal, braços e pernas. O atleta Jairo Klug, 23, que participou do Pan-2007, brinca que nem a musculatura facial fica de fora: "A gente rema fazendo careta por causa do esforço!".
"O que caracteriza o remo como atividade completa é que ele usa quase todos os grupos musculares com um efeito localizado -como a musculação. Só que, enquanto a musculação quase não tem efeito cardiorrespiratório, o remo também traz o benefício aeróbico, desde que seja feito no ritmo e na velocidade adequados", afirma o médico Turíbio de Leite Barros, professor de fisiologia da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).
Isso faz com que o remo seja uma das melhores opções para quem quer emagrecer -apenas o ski e o ciclismo de longas distâncias se aproximam do remo em relação a gasto energético, segundo especialistas ouvidos pela Folha. Como exige um ritmo constante e trabalha todo o corpo, uma sessão de 1h30 de remo gera um gasto de até 1.200 calorias. Atletas de alta performance, como Jairo Klug, gastam até 5.000 calorias nas três horas de um dia de treino.
Além disso, trata-se de uma atividade considerada segura. O atleta fica sentado e flexiona as pernas sobre um "carrinho" dentro do barco -ao esticá-las contra o suporte, gera o impulso necessário para contrair os braços, movimentando os remos dentro d'água. Como não há nenhum tipo de impacto sobre as articulações, o risco de lesões é muito baixo.
Esse foi um dos fatores que levaram o engenheiro João Luis Melone, 58, a escolher o remo como exercício quando precisou se recuperar de um acidente de moto. Após 11 meses usando muleta, ele precisava recuperar a massa muscular sem sobrecarregar a área que havia sido fraturada.
"Minha perna estava atrofiada, e minha capacidade cardiorrespiratória estava fraca. Eu poderia nadar ou remar, e meu fisioterapeuta disse que, das duas opções, o remo atuaria mais na musculatura. Em três meses de remo, senti mudanças significativas e logo entrei em forma", conta ele, que já havia praticado o esporte quando tinha 20 anos.
Desde 2001, João Luis participa das competições de remo para masters (acima de 27 anos) -aliás, uma percepção comum na área é a de que grande parte dos praticantes é formada por adultos e idosos.
"Os masters são muito ativos no remo", afirma o engenheiro Candido Leonelli, 60, que rema há 40 anos ("todos os dias"). Ele já ganhou um campeonato mundial e, atualmente, treina para as Olimpíadas Master, que serão realizadas em 2009, na Austrália.
"Conheço o Amyr Klink, e ele fez umas contas mostrando que eu já remei o suficiente para dar três voltas ao redor do mundo", gaba-se. "Credito ao remo ter chegado a essa idade com a saúde tão boa."

Riscos
Isso não significa que os riscos não existam. Um problema que pode atingir os praticantes de remo são lombalgias causadas por uma postura errada durante a atividade. "O erro de execução do movimento pode lesionar a região lombar", afirma Júlio Noronha, diretor técnico da Confederação Brasileira de Remo (CBR). O próprio Leonelli passou por uma cirurgia de hérnia de disco. "Se o problema foi ou não causado pelo remo, é difícil saber. Acho que é mais relacionado ao fato de que, quando comecei, não tínhamos tanto cuidado com alongamento e com postura", afirma.
Já atletas de alta performance podem sofrer inflamação do nervo ciático, por ficarem muito tempo sentados no banquinho duro do barco, e fissuras por estresse na costela.
"Isso pode ocorrer porque o grande dorsal [músculo ligado à rotação do ombro] se apóia nas costelas. Não é algo grave, mas é muito incômodo", afirma Fernando Mello, treinador do Esporte Clube Pinheiros, em São Paulo. Jairo Klug já passou pelo problema: "Tive de passar três meses sem remar -um deles totalmente parado. Quando eu respirava fundo, dava aquela fisgada na costela". Mas Mello ressalta que quem pratica remo por lazer e com orientação dificilmente terá problemas de saúde devido à atividade.

Acesso
O principal problema do remo é a infra-estrutura exigida. Em São Paulo, todos os cursos estão concentrados na raia olímpica da USP (zona oeste), onde os clubes têm garagens para os barcos, que podem ser individuais ou com capacidade para duas, quatro ou oito pessoas. As represas de Guarapiranga (zona sul) e Billings (Grande SP) também são adequadas à atividade, mas, para isso, é preciso transportar os barcos, que são grandes e de estrutura delicada.
Ricardo Linares, professor de remo do Cepeusp (Centro de Práticas Esportivas da Universidade de São Paulo), lembra que a atividade era mais popular quando era realizada no rio Tietê. Ele mesmo começou a remar no local, aos 16 anos, depois de assistir a competições ali realizadas.
"A localização estimulava as pessoas a participarem." As águas do rio, conta, já eram poluídas. O que inviabilizou a prática, na sua opinião, foi a construção das marginais -a mudança não permitia o transporte dos barcos até o rio.

Além disso, há o custo do equipamento. Um barco individual usado custa em média de US$ 3.500 a US$ 4.500 (de R$ 6.144,25 a R$ 7.899,75), segundo o físico Wanderley Pires de Sá, 48, que treina em seu próprio barco. A maioria dos praticantes, porém, usa os barcos dos clubes . Segunda Noronha, da CBR, a entidade pretende oferecer um curso de construção naval no segundo semestre deste ano, para estimular a produção nacional de barcos e facilitar o acesso ao equipamento no país. O segundo passo da proposta, afirma, é desenvolver programas que associem o remo ao turismo. "Foi assim que o esporte começou na Europa. Era um meio de transporte que as pessoas usavam quando iam fazer piqueniques."
A prefeitura e o governo do Estado de São Paulo também têm programas que levam o remo a alunos de escolas públicas: o Revelar (na represa de Guarapiranga) e o Navega São Paulo (no litoral e no interior do Estado), respectivamente.
Além disso, já existem em academias aparelhos que si-mulam os movimentos do remo. "É difícil saber se os efeitos desses aparelhos são similares ao do esporte", afirma Turíbio Leite de Barros. Ainda assim, ressalta, uma vantagem é que esse é um dos poucos equipamentos que permitem o trabalho aeróbico dos braços. "Geralmente, as academias só têm exercícios de força para os braços. E, no dia-a-dia, são poucas as atividades ocupacionais para os braços. Por isso, eles acabam atrofiando rapidamente, daí a necessidade de atividades aeróbicas em que eles sejam envolvidos."



ONDE PRATICAR
Em São Paulo
Cepeusp (Centro de Práticas Esportivas da Universidade de São Paulo) www.cepe.usp.br
Tel.: 0/xx/11/3091-3361

Clube Espéria
www.esperia.com.br
Tel.: 0/xx/11/6223-3300

Sport Club Corinthians Paulista
www.corinthians.com.br
Tel.: 0/xx/11/6195-3000

No Guarujá (SP)
Rapanui
www.rapanuibrazil.com.br
Tel.: 0/xx/13/8145-3481

No Rio de Janeiro
Botafogo de Futebol e Regatas
www.botafogonocoracao.com.br
Tel.: 0/xx/21/2226-6672

Clube de Regatas do Flamengo
www.flamengo.com.br
Tel.: 0/xx/21/2159-0167



Texto Anterior: Neurociência - Suzana Herculano-Houzel: O sono, o açúcar e o diabetes adulto
Próximo Texto: Dia-a-dia: em casa
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.