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s.o.s. família rosely sayão
Pais e professores não educam com ameaça
Muitos pais estão assustados tantas são as
ameaças que as crianças e os adolescentes têm a enfrentar. É a violência -anônima e dos colegas-, que deixa a criançada sempre
alerta; é o trânsito maluco, com os condutores
dos veículos agindo como se os carros fossem armas ou um bem do mais alto valor. É o medo de não se sair bem na escola, é o receio de
não arrumar amigos, namoradas e namorados, de não ter o corpo perfeito etc. De um jeito ou de outro, eles vão enfrentando, mas pagam um preço caro. Hoje tem muita criança
sofrendo de enxaqueca, com estresse, com
distúrbios de alimentação e outras doenças
que, antes, eram coisa de gente grande.
Mas, como se não bastassem tantas ameaças, eles ainda têm de conviver com outras, absolutamente evitáveis e inúteis: as que os pais
-e professores também, infelizmente- fazem, na tentativa de controlar a criançada. "Se
você não estudar, não vai ter futuro!"; "Se você
não fizer a lição de casa, não vai brincar com
os amigos"; "Se você não tiver boas notas, vou
tirar você dessa escola"; "Se você não obedecer
a mamãe, eu vou ficar triste", "Se não fizer o
combinado, vai ficar sem jogar videogame", e
assim por diante. Creio que esses exemplos
devem ter atingido a maior parte dos pais e
mães em cheio, não é? Tem sido muito difícil
escapar dessas ameaças. Mas é possível e é
preciso e vamos ver alguns dos motivos mais
importantes para isso.
Em primeiro lugar, ameaça não funciona,
pelo menos não para o que os pais pretendem.
Até pode funcionar em um determinado momento e situação em que os pais se vêem apertados para convencer o filho a fazer ou não determinada coisa, mas esse é um efeito efêmero
e nada educativo.
O que provoca a ameaça? Em geral, o medo.
Mas jamais a responsabilidade. E nunca é demais lembrar que educar é preparar para a autonomia, portanto, para a responsabilidade.
Além do mais, o medo nunca foi empecilho
para ninguém. Quem quer muito uma coisa
faz enfrentando o medo e os riscos. Se um
adulto, que é capaz de avaliar antes as consequências, age assim, imaginem então uma
criança ou um adolescente, que só avaliam
-quando o fazem- depois de agir?
Em segundo lugar, ameaças não dão alternativas de escolha para a criança ou para o
adolescente: ou o filho atende, ou vai para o
castigo. E castigo não é visto como consequência de um ato, e sim como punição pessoal. De
novo, essa dinâmica não é educativa. Ensinar
a fazer escolhas avaliando as consequências
que podem surgir faz parte da responsabilidade da educação.
Por fim, o ponto em geral mais delicado:
nem sempre os pais cumprem as ameaças que
fazem. Às vezes porque a ameaça foi feita na
impulsividade e depois, pensando melhor, os
pais acham que a consequência prometida seria severa demais. Outras vezes -pode parecer incrível, mas não é- porque os pais simplesmente se esquecem do que falaram. E tem
mais: os pais ameaçam achando simplesmente que é o que basta, que cumprir o prometido,
na verdade, nem está em jogo.
Acontece que é assim que os pais perdem a
autoridade moral perante os filhos em seu trabalho de orientação e também de contenção,
que significa educar. E os filhos, por sua vez,
perdem muito mais: a sensação de segurança
que os pais deveriam lhes transmitir se dilui
com essas atitudes que eles tomam. E o que
resta de deseducativo para o filho é a idéia de
que as consequências de seus atos nem sempre virão.
O problema é que a vida não é assim.Os pais
-e professores- deveriam se observar um
pouco mais para perceber o quanto usam dessa estratégia de ameaçar para tentar persuadir
as crianças e os adolescentes a seguir por determinado caminho, porque isso acontece
muito mais do que eles próprios imaginam. Só
depois de aceitar que fazem isso é que poderão
mudar. E, para a educação democrática e que
busca a autonomia e liberdade possível, essa
mudança é essencial.
ROSELY SAYÃO é psicóloga, consultora em educação e
autora de "Sexo é Sexo" (ed. Companhia das Letras); e-
mail: roselys@uol.com.br
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