São Paulo, quinta-feira, 22 de abril de 2004
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Estômago é vítima das drogas antiinflamatórias

Medicamentos funcionam bem para acabar com a dor, porém, sem orientação médica, podem causar de úlcera a sangramento

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O remédio que você tomou ontem, por conta própria, para se livrar daquela dor de cabeça persistente poderá ser o responsável pela dor de estômago que você sentirá amanhã. A médio e longo prazos, usar antiinflamatórios como analgésico pode afetar o sistema gastrointestinal, causando problemas que vão de dor de estômago até úlcera.
Em todo o mundo, mais de 30 milhões de pessoas recorrem diariamente aos antiinflamatórios não-esteróides tradicionais (Aines) para combater dores crônicas, muitas vezes praticando a automedicação e sem conhecer os riscos desse tipo de medicamento. Entre os brasileiros, não é diferente. Pesquisa realizada recentemente no Brasil e no México com 392 pessoas de ambos os sexos constatou que quase metade dos entrevistados (44%) recorria aos Aines para aliviar a dor, e um quarto deles não sabia que essas drogas podem prejudicar o sistema gastrointestinal. O estudo foi realizado pelo laboratório multinacional de origem norte-americana Merck Sharp & Dohme e pelo instituto de pesquisa Taylor Nelson Sofres, com sede em Londres (Reino Unido).
Drogas como o ácido acetilsalicílico, o naproxeno e o diclofenaco fazem parte do grupo dos antiinflamatórios Aines e são populares porque funcionam bem como analgésicos. Para os médicos, porém, são uma faca de dois gumes, porque, ao mesmo tempo que agem contra a dor, também causam uma série de estragos silenciosos. "Eles não só lesam o estômago como todo o tubo digestivo", diz o gastrenterologista da USP Decio Chinzon, presidente da Sociedade de Gastroenterologia e Nutrição do Estado de São Paulo. Essas lesões ocorrem porque os medicamentos inibem a ação da ciclooxigenase, enzima fundamental na produção das prostaglandinas (substâncias que protegem a mucosa gástrica).
Com a diminuição de prostaglandinas, segundo Chinzon, a mucosa fica exposta a substâncias que são importantes para o processo digestivo, mas podem agredir o estômago, como o ácido clorídrico e a pepsina, enzima responsável pela digestão de proteínas.
Em 2000, Chinzon realizou uma pesquisa em dez centros médicos das regiões Sul e Sudeste. Das 337 pessoas que foram aos prontos-socorros por causa de problemas gástricos, 41,6% usavam antiinflamatórios Aines. Nesse grupo, 59% já tinham úlcera, e 39% apresentavam sangramento. "Em grande parte dos casos, os sintomas de dor e mal-estar demoram para aparecer", afirma o especialista. Sem nenhum sinal de que há algo errado, o paciente continua tomando o antiinflamatório, permitindo que o problema evolua.
Entre as complicações mais graves que podem ser provocadas pelo uso indiscriminado de antiinflamatórios Aines estão as úlceras (lesões na parede estomacal ou na primeira parte do intestino delgado), perfurações (orifícios na parede do estômago causados por fluidos e ácidos estomacais se uma úlcera não é tratada), obstrução (fechamento da saída do estômago por causa do inchaço e das cicatrizes de uma úlcera) e sangramento no estômago ou no duodeno.
Embora a probabilidade de lesões aumente de acordo com a freqüência do uso do medicamento e a dosagem, um único comprimido já pode afetar o sistema gastrointestinal. Segundo Chinzon, tomar o antiinflamatório com leite ou nas refeições não reduz os riscos. A melhor maneira de evitar problemas é utilizar esses remédios só sob orientação médica.
Existe uma outra classe de antiinflamatórios que, de acordo com as pesquisas, produz menos efeitos colaterais. Os chamados inibidores seletivos de COX-2 não agem sobre as enzimas que protegem a parede do estômago, reduzindo o risco de complicações gastrointestinais, explica Chinzon. (KARINA KLINGER)


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