São Paulo, quinta-feira, 22 de agosto de 2002
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S.O.S. família

rosely sayão

Por que os pequenos se esgoelam na escola

O início do semestre letivo tem uma particularidade para as crianças com menos de seis anos que vão para a escola de educação infantil. Para essas, as aulas no início de agosto nem sempre significam a retomada de uma atividade que já era rotina, depois de um período de férias em casa. Muitas delas começam a frequentar a escolinha neste mês, o que significa uma grande novidade na vida delas. E, mesmo para muitas outras, que já estavam até acostumadas a ficar um período fora de casa, voltar para a escola pode ser uma experiência muito parecida com a da primeira vez. Isso quer dizer que milhares de pais com filhos pequenos sofreram -e ainda sofrem- quando têm de deixar o filho chorando, gritando, quase desesperado na porta da escola.
Por que a criança tem esse tipo de reação? Será que é porque não gostou da cara da escola, ou porque lá não recebe bom tratamento, ou porque ainda é muito pequena para desfrutar dos benefícios dessa atividade, ou por um outro bom motivo qualquer desse tipo?
Na maioria das vezes, nenhum desses motivos explica a reação da criança. Acontece que, nessa idade, separar-se da mãe, do pai, da empregada, da casa, da rotina não é mesmo fácil. A criança sente-se insegura e desamparada nesse momento. Além disso, a criança pequena ainda não tem condições de fazer uma projeção do tempo, não consegue entender que vai ficar ali por um período e que depois vai voltar a ver a mãe, o pai, a casa. Na hora da separação, ela reage como se fosse uma despedida definitiva.
Dá para entender a reação dela, não dá? Mas não é possível resolver isso? Bem, o processo começa bem antes, quando os pais decidem colocar o filho na escola. Eles precisam estar certos de que a decisão que tomaram é a melhor para a criança, considerando o contexto de vida familiar. Depois, o que mais ajuda a criança a passar rapidamente por esse período é a escolha da escola feita pelos pais. E com isso quero dizer que os pais precisam estar muito seguros da escolha que fizeram para que, na hora de deixar o filho, mesmo chorando, possam sentir-se seguros de que ele estará bem cuidado.
Considero a escola de educação infantil uma das mais importantes na vida da criança, por isso ela deve ser selecionada de modo muito cuidadoso. Não se trata apenas de um local para o filho ficar por um período, para fazer qualquer coisa e ser protegido de perigos. A criança com menos de seis anos não sabe defender-se sozinha de si mesma, dos adultos e do meio em que vive, não sabe o que é bom para ela e o que não é: são os adultos à sua volta que devem fazer tudo isso por ela e com ela. Por isso escolher uma escola que tenha um projeto claro que contemple a criança, seu modo de viver e a brincadeira, que tenha coerência com o modo de pensar da família e que forme seus profissionais para que saibam estabelecer laços afetivos positivos com a criança é fundamental. É o primeiro passo para a tranquilidade dos pais e o bem-estar do filho.
Com essa segurança, os pais vão poder confiar na escola e nos seus representantes, e vai ser menos doloroso -mas, mesmo assim, vai doer- deixar para trás o filho berrando. Nesse momento, o que ajuda é pensar que crescer, dar um passo à frente, significa deixar coisas para trás. E que isso provoca, sim, um certo sofrimento. É por isso que a criança chora, esperneia, reage.
Mas, se perceber que os pais estão seguros e confiantes nos profissionais da escola, logo estará disponível para fazer novos vínculos, divertir-se, brincar e, como consequência, aprender. Por isso a atitude dos pais é muito importante nessa hora. Mas claro que não se trata de uma confiança cega na escola. Ao contrário, deve ser uma confiança responsável e vigilante, mesmo que discretamente. E é bom lembrar que cada criança é diferente, por isso algumas demoram mais para aceitar a nova fase, e outras já se entregam com mais rapidez. Cada uma deve ser respeitada no seu tempo e no seu estilo de se adaptar.


ROSELY SAYÃO é psicóloga, consultora em educação e autora de "Sexo é Sexo" (ed. Companhia das Letras); e-mail: roselys@uol.com.br


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