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Rosely Sayão
Os pais e a escola sob medida
Uma leitora enviou
correspondência em
que comenta as reuniões de pais nas escolas. Disse que vai a todas e
que sai horrorizada porque alguns pais se acham no direito
de cobrar da instituição escolar
atitudes educativas que ela
considera dever da família. Outro leitor contou que ouviu pais
se manifestarem totalmente
contrários às posições da escola
e que não entende como eles
podem manter o filho na mesma. Já é hora, portanto, de
avançarmos na reflexão da delicada relação escola-família.
Esses nossos leitores, muito
sagazes, constataram que há
um grande número de pais, notadamente entre os que matriculam os filhos em instituição
particular, que acreditam poder exigir uma escola sob medida para seus filhos.
Isso leva a pedidos ou exigências dos mais absurdos, como a
troca de turma para o filho estar com amigos, troca de professor de sala ou de disciplina,
maior ou menor quantidade de
lição a ser feita em casa etc. Isso
sem falar da relação pouco respeitosa que os pais mantêm
com as regras de funcionamento da escola, tais como horário
de chegada e de saída, datas e
prazos, uso de uniforme, uso de
telefone celular etc.
Por que tais solicitações são
absurdas? Porque a escola é o
lugar de transição entre família
e mundo em que os alunos
aprendem, entre outras coisas,
a viver sem escolher. Essa é
uma das características da vida
pública: não escolhemos os colegas com quem iremos trabalhar, as pessoas que estarão ao
nosso lado no trânsito, as datas
para pagar contas e tributos e
as leis que temos de respeitar.
Precisamos nos lembrar
sempre de que a escola tem o
dever de preparar os mais novos para a cidadania. Por isso,
demandas dos pais que privilegiam o âmbito privado não fazem sentido algum quando
consideramos esse exercício
que os filhos devem fazer ao
freqüentar a escola.
Esse aprendizado também
tem sido dificultado pelo constatado declínio do trabalho
educativo das famílias. Os alunos chegam à escola muitas vezes sem o processo básico de
educação em curso. Mas, ao
contrário do que muitos professores pensam, isso se deve
pouco ao descaso ou à ausência
dos pais e mais à nossa cultura
que "juveniliza" os adultos. É
que os jovens -não me refiro à
idade cronológica- têm dificuldades de estabelecer relações educativas com os filhos.
Tal fato tem gerado muitas
reclamações por parte da escola, porque os mestres, tanto
quanto os pais, também estão
submetidos a essa cultura. Uma
coisa é certa: pais e professores
têm objetivos comuns e precisam constantemente recordar
que é a educação dos mais novos o foco de sua tarefa educativa. A maioria dos conflitos entre eles não considera esse ponto, e sim anseios próprios de cada um deles.
Enquanto tivermos pais aflitos com o que consideram sofrimento dos filhos na escola e
em busca de soluções fáceis e
escolas mais comprometidas
com novas metodologias e com
a busca de determinados perfis
de alunos em vez de com o uso
do rigor e da exigência para alcançar um ensino de qualidade,
a relação entre ambos será, necessariamente, conflituosa e
desastrosa. Quem perde são os
mais novos, que deveriam nortear todo nosso trabalho.
ROSELY SAYÃO é psicóloga e autora de "Como Educar Meu Filho?" (ed. Publifolha)
roselysayao@folhasp.com.br
blogdaroselysayao.blog.uol.com.br
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