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Alimento em versão funcional ganha espaço
Avani Stein/Folha Imagem
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Funcionais in natura: soja, aveia, manga e tomate |
Cresce a oferta de produtos que contêm componentes que atuam sobre o metabolismo, reduzindo risco de doenças como o câncer
ANA PAULA DE OLIVEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL
Em meio às categorias molhos, carnes, bebidas, farináceos e
achocolatados, o consumidor poderá, em breve, topar com a
estante dos funcionais, como já ocorre em supermercados no Japão, na Europa e nos Estados Unidos. Só neste semestre, estão
sendo lançados no Brasil, por algumas das maiores indústrias de
alimentos, dez produtos acrescidos de funcionais.
In natura, esses alimentos existem desde que o homem tira da terra o que come.
A novidade mesmo são os funcionais na
versão industrializada -o que pode levar você se deparar com um sorvete de
menta com fibras ou com um envelope
de sopa instantânea de soja, duas das novidades do ano.
Além da função de nutrir, os funcionais
possuem componentes que podem mudar o metabolismo do corpo e, assim,
prevenir certas doenças, como câncer ou
problemas cardiovasculares, explica Jocelem Mastrodi Salgado, pesquisadora,
professora de nutrição da Esalq (Escola
Superior de Agricultura Luiz de Queiroz), da USP, e presidente da Sociedade
Brasileira de Alimentos Funcionais, entidade criada há dois anos.
E a adição da substância terapêutica de
um funcional a um produto já conhecido
é um dos segmentos do setor alimentício
que mais crescem. Segundo pesquisa divulgada, em março, pela irlandesa Research and Market, esse mercado cresceu
60% entre 1998 e 2003 e, neste ano, deve
movimentar US$ 51,3 bilhões.
Como o europeu, o brasileiro prefere
nutrientes extras em seus alimentos, em
oposição à tendência americana de priorizar o consumo de suplementos e complexos vitamínicos, diz a engenheira de
alimentos da Unicamp Gláucia Pastore.
"É uma tendência, e o conceito agora
no país está tomando força", afirma Sandra Rietjens, da Danone. A empresa acaba de lançar o Activia, iogurte que promete acelerar em 40% o trânsito intestinal. É vendido há 20 anos na França, país
de forte consumo de funcionais, e só chega agora ao Brasil depois que pesquisas
identificaram os 30 milhões de consumidores em potencial do iogurte: pessoas
com intestino preguiçoso. "Os funcionais
são os que mais contribuem para o faturamento da Danone", diz Rietjens.
A concorrente Vigor acaba de lançar o
leite fermentado com soja, com gosto
bem próximo ao dos outros fermentados
existentes. A concorrência no mercado
de bebidas lácteas leva a indústria a se
movimentar para criar diferencial.
"O mercado de iogurtes está saturado.
Para nos diferenciarmos da concorrência, desenvolvemos um iogurte com soja", diz Vinícios Ramos, vice-presidente
da Vigor. Aliás, o composto ativo da soja,
a isoflavona, é o mais estudado entre os
funcionais. Outro, cujos benefícios são
bem conhecidos, é o grupo das fibras. A
oferta inclui margarinas, sorvete, balas e
até um salgadinho com fibras, que promete suprir 10% das necessidades diárias
dessa substância.
"Fizemos uma pesquisa e foi constatado que a mãe não tem prazer em dar salgadinhos aos seus filhos, por não ser um
produto completo na alimentação. Então, enriquecemos o salgadinho com vitaminas, ferro e adicionamos a própria fibra do milho", afirma Gabriel João Cherubini, vice-presidente da Yoki.
Apesar de vitaminado e enriquecido com
fibras, é alvo de críticas. "O problema dos
salgadinhos são as gorduras saturadas
[que elevam o colesterol "ruim']. Um
componente benéfico como a fibra não
neutraliza o efeito nocivo que elas causam no organismo", diz José Alfredo Gomes Arêas, responsável pelo Grupo de
Propriedades Funcionais dos Alimentos,
do Departamento de Nutrição da Faculdade de Saúde Pública, da USP.
Arêas compara a inclusão dos funcionais nas prateleiras com a invasão dos
produtos light. "As pessoas passaram a
consumir mais do que comiam só porque um produto tinha menos calorias. O
que me preocupa é um consumidor passar a ingerir muito mais do que o necessário de um determinado alimento, pensando estar fazendo bem à saúde. Não estará. Ele deve apenas comer aquela quantia com a qual já está acostumado."
Isso porque, como tudo, os funcionais
em excesso também podem fazer mal,
diz Franco Lajolo, professor do Departamento de Alimentos e Nutrição Experimental da USP. "Muita fibra, por exemplo, pode produzir gases." O extremo
também pode comprometer a absorção
de alguns nutrientes, como cálcio e ferro.
Já tomar probióticos demais dá diarréia.
E qual a medida adequada de consumo
dos funcionais? A que manda o bom senso, ou seja, o equilíbrio na quantidade, na
variedade e na regularidade. Afinal, as
pesquisas comprovam a eficácia dos funcionais somente quando consumidos a
longo prazo, diz Daniel Magnoni, da Federação Latino-Americana de Nutrição.
Esse mercado também produz confusão. Alimento enriquecido com ferro e
vitaminas, por exemplo, é diferente do
batizado de funcional, porque as primeiras são substâncias que estão -ou deveriam estar- presentes no organismo, o
que não é o caso dos componentes dos
funcionais, explica Magnoni.
É bom lembrar ainda que alimentos geneticamente modificados são funcionais
desde que sejam transgênicos de segunda
geração. Esses são alterados para terem
suas propriedade "turbinadas" -como
tomate com maior concentração de licopeno.
Para separar o joio do trigo, a Anvisa
(Agência Nacional de Vigilância Sanitária), em 1999, formulou regras para assegurar que o alimento cumpra a promessa
dos benefícios que vende na embalagem.
Genoma funcional
Para o futuro, a
meta é os alimentos funcionais desempenharem um papel muito mais determinante no controle e na prevenção de
doenças. A decodificação e interpretação
do genoma humano abre a possibilidade
de o diagnóstico ser feito antes de o indivíduo desenvolver uma doença. "A partir
daí, será prescrita uma dieta que previna
e até impeça a evolução do mal", diz Durval Ribas Filho, presidente da Associação
Brasileira de Nutrologia.
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