São Paulo, quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008
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alimentação

Decifre-me ou não me devore

Você não precisa ser especialistaem nutrição; mas entender o significado de alguns termos nas embalagens dos alimentosé fundamental para fugir de "armadilhas" nas prateleirase preservar a sua saúde

DANIELA TALAMONI
COLABORAÇÃO PARA FOLHA

Perder alguns minutos tentando decifrar a embalagem dos alimentos é um hábito cada vez mais comum. Até há pouco tempo, a maioria dos consumidores se preocupava só com duas informações dos rótulos: o preço e a data de validade. "A atitude do consumidor mudou. Ele está mais consciente de que suas escolhas alimentares podem interferir em sua saúde", diz Jocelem Salgado, presidente da Sociedade Brasileira de Alimentos Funcionais.
Na prática, além de decidir se é melhor colocar no carrinho a versão diet ou light de um alimento, ele também está interessado em comparar produtos com certas palavras-chave no rótulo, como "sem colesterol", "0% de gorduras trans", "baixo teor de gorduras"...
O problema é que, segundo especialistas, essa enxurrada de informações novas tem causado confusão.
Por falta de orientação, há quem poderia fazer escolhas mais inteligentes. Para o nutrólogo e cardiologista Daniel Magnoni, do Instituto Dante Pazzanese e do Hospital do Coração de São Paulo, as pessoas estão mais antenadas e se guiam pelo que é divulgado na mídia para decifrar os rótulos. Mas, quando essa "tradução" exige um pouco mais de conhecimento, começam os equívocos. É o que comprova uma pesquisa realizada pelo médico em 2007.
De 1.500 entrevistados, das classes A, B e C, 64% afirmaram, por exemplo, consumir azeite de oliva pelo menos três vezes por semana. Em compensação, só 8% compram o óleo de canola, que é tão saudável quanto o azeite e mais barato. Segundo Magnoni, isso mostra que muita gente já leu que o azeite tem uma gordura boa que previne doenças cardíacas. Mas, como não sabe que gordura é essa, a maioria nem nota, na tabela que traz a informação nutricional do produto -e que, desde 2006, passou a ser obrigatória-, que o óleo de canola perde por pouco para o azeite no volume de gorduras monoinsaturadas (as aliadas do coração).
As armadilhas na hora das compras podem não afetar apenas o bolso, como nesse caso. Estratégias de marketing e até má-fé de alguns fabricantes têm feito muita gente levar gato por lebre nos carrinhos.

 


Light ou Diet
Tradução:Os dois termos não são sinônimos de alimentos para emagrecer. As versões light precisam ter no mínimo 25% a menos de calorias em relação ao produto convencional. Já o alimento diet deve estar isento de algum nutriente -não necessariamente de açúcar.
Armadilhas: Dificilmente um produto diet deixa explícito qual nutriente foi cortado. O ideal é ver a lista de ingredientes. Quanto aos alimentos light, não há um produto de referência único, em cada categoria, em que a versão mais "magra" se baseia. Ou seja, um achocolatado light de uma marca pode ser mais calórico do que o de outra, por exemplo.

Selo da SBC
Tradução: Em formato de coração, é a garantia de que o alimento foi avaliado e aprovado por médicos e nutricionistas da SBC (Sociedade Brasileira de Cardiologia), especialmente quanto aos teores de gordura, colesterol e sal. Cerca de 150 produtos no Brasil são certificados com o selo.
Vale lembrar: Um produto pode não ter o selo e ser tão saudável quanto aquele que foi avaliado e certificado pela SBC.
Armadilha: "Alguns fabricantes de alimentos com alto teor de sal e de gordura têm colocado um coração em suas embalagens. Isso pode confundir", denuncia Malachias.

Sem colesterol
Tradução: O alimento não contém uma substância que, em excesso, pode formar placas e entupir as artérias. Ocorre que apenas 30% do colesterol vem da alimentação -o restante é fabricado pelo fígado. "Para a saúde do coração, mais vale investir no corte de gorduras saturadas", alerta o cardiologista Marcus Bolivar Malachias, diretor do Instituto de Hipertensão de Minas Gerais.
Armadilha: Não é vantagem encontrar essa informação na embalagem de um produto de origem vegetal, como óleo de soja. O colesterol só existe em produtos de origem animal. Pela lei, os fabricantes devem esclarecer por escrito quando a ausência ou a presença de um componente for uma característica natural.

Sem glúten
Tradução: O termo interessa a quem sofre de doença celíaca -uma reação a essa proteína (o glúten), que é encontrada em produtos à base de centeio, trigo, aveia, malte e cevada.
Vitaminas e minerais, ômega 3, rico em fibras
Tradução: Desses termos, talvez só o ômega 3 ainda cause alguma estranheza. A expressão se refere a um tipo de gordura importante para as funções orgânicas e que só é obtido por meio da alimentação (em óleo vegetais, nozes e peixes gordurosos). Entre os benefícios do consumo de ômega 3, está a redução dos triglicérides e do colesterol.
Armadilha: Se depender apenas da quantidade desses nutrientes encontrada em alguns produtos industrializados, nosso organismo não sentirá nenhum efeito. A maior fonte de consumo ainda deve ser frutas, legumes, hortaliças e peixes gordurosos de águas frias. Além disso, nem todas as opções industrializadas são saudáveis só porque oferecem essas informações no rótulo. Muitos alimentos voltados para crianças, por exemplo, estampam a presença de vitaminas e minerais, mas, por outro lado, têm açúcar em 80% da fórmula e mais corantes e outros componentes sintéticos.

Sem lactose
Tradução: O aviso é típico de alimentos que não contêm leite de vaca ou derivados. A lactose é um açúcar que deve ser evitado por pessoas com intolerância a ela.
Armadilha: Muitas mães alimentam crianças pequenas com produtos sem lactose, para evitar o açúcar e o excesso de peso. No entanto, a maioria desses produtos é pobre em cálcio, essencial para o desenvolvimento dos ossos.

O% de gordura trans
Tradução: A trans, tipo mais maléfico de gordura, é resultado de um processo chamado hidrogenação, que transforma a gordura vegetal líquida em sólida. Por muito tempo, foi assim que produtos industrializados ganhavam consistência ou textura crocante. Hoje, tem sido usado o óleo de palma, que dispensa a hidrogenação.
Armadilhas: Segundo o cardiologista Marcus Malachias, a mudança já é um passo importante, mas não é o ideal. "O óleo de palma tem muito mais gordura saturada (o segundo tipo mais nocivo) do que os outros óleos vegetais." E mais: a expressão "0% de gordura trans" nem sempre tem significado literal. O engenheiro de alimentos Thiago Costa, da Pro Teste (Associação Brasileira de Defesa do Consumidor), revela que a lei permite que produtos com até 0,2 grama de gordura trans em cada porção declarem que têm "0% de gordura trans". O problema é que as pessoas não costumam ingerir só uma porção.

Nas letras miúdas
>> A lista de ingredientes está em ordem decrescente de quantidade. Ou seja, se o primeiro item for açúcar e o último fibras, você não está levando um alimento saudável para casa

>> Um fabricante não pode mencionar possíveis benefícios do produto à saúde. Ou seja, pode colocar o aviso "sem colesterol", mas nunca dizer que "consumir três vezes por semana reduz os riscos de infarto"

>> O item "gordura total" equivale à soma de todos os tipos, os bons e os ruins

>> A quantidade dos nu-trientes considera o volume encontrado em apenas uma porção do alimento, nunca no produto inteiro

Fonte: THIAGO COSTA, engenheiro de alimentos e pesquisador da Pro Teste


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