São Paulo, terça-feira, 29 de junho de 2010
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Slow food é pra quem pode

VINICIUS TORRES FREIRE
COLUNISTA DA FOLHA

Imagine aquelas cidades lindas do interior da Itália ou da França, as Disneylândias da civilização ocidental. Prédios velhos bonitos, jardins, vida pacata e rica. Nos arredores, os agricultores são artesãos da terra de onde tiram produtos frescos da estação para cardápios de uma culinária burguesa velha ao menos de 150 anos. A classe média ainda tem tempo de almoçar em casa. Isso é slow food: é para quem pode.
O movimento slow food surgiu no final dos 1980, em vilarejos elegantes do norte da Itália. Terra de trufas, grandes vinhos e vegetais, bois e queijos de primeiríssima, massas com ovos etc.
Slow food é uma óbvia ironia para fast food: prega uma vida sem pressa, a começar pela mesa. Tornou-se um grupo internacional de defesa da "educação do gosto", da pequena agricultura, sua diversidade de produtos, de culturas orgânicas e do "comércio justo".
É um movimento antiglobalização, contra hábitos e comidas padronizados, industrializados, "multidões".
Surge num momento em que voltam a se reafirmar identidades locais europeias e a defesa de patrimônios "imateriais".
Mas os "jardins da Europa" não são para todo mundo. A agricultura e as pequenas cidades sobrevivem com subsídios do governo.
A tradição do pequeno produtor artesão não é "milenar", mas surgiu com reformas agrárias. Dependeu de uma classe média antiga, que sabia pagar cozinheiros para aproveitar os produtos da terra e exigir seu aperfeiçoamento.
A maior parte do mundo depende da agroindústria para ter o que comer, se come.
Mas até na Europa, dada a concorrência de "emergentes" e asiáticos, slow food é privilégio, que mal resiste à globalização econômica e cultural. Parisienses e romanos almoçam "paninis" na rua, como se comem pizzas ou saladas plastificadas nas escadas de Wall Street.


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