São Paulo, terça-feira, 29 de junho de 2010
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NEURO

SUZANA HERCULANO-HOUZEL suzanahh@uol.com.br

Aos vencedores, testosterona


Humanos adoram se meter em disputa de dominância para determinar quem manda e quem recebe


ÀS VEZES são as perguntas simples das crianças que nos dão perspectiva. Semana passada foi um "Mãe, por que tem Copa do Mundo?". Hmm.
Ensaiei algo como "para descobrir qual país tem o melhor time de futebol", mas sem muita convicção; não acredito que mera curiosidade mova os bilhões de dólares envolvidos no assunto.
Uma resposta melhor seria "porque seres sociais como nós adoram se meter em disputas de dominância para determinar quem manda e quem obedece".
Ao ver o gramado com seus 11 representantes uniformizados de cada equipe se enfrentando, horda ululante ao redor, não consigo deixar de pensar que isso é a versão moderna, "pacífica", de um campo de batalha onde exércitos inimigos, encharcados de testosterona, defendem seus líderes respectivos (esses protegidos sobre seus cavalos, digo, bancos).
A testosterona é fundamental. Esse hormônio sexual age sobre o cérebro e o impele a confrontos, deixando-o mais agressivo e disposto a correr riscos. Em embates entre humanos, e também entre camundongos, tem mais chances de vitória aquele que entrar na briga com o nível mais alto de testosterona.
Disputa encerrada, quem vence leva de quebra uma dose a mais de testosterona, encomendada por seu cérebro. Seja em guerra por território, briga de rua, jogo de tênis, xadrez ou cara e coroa, a elevação da testosterona no vitorioso está ligada a atitudes de dominância, como mudanças na postura e no tom da fala, e mais agressividade.
Tudo isso também aumenta as chances de o vencedor querer uma nova disputa e ainda sair vitorioso dela -no que depender só dele, claro. O curioso é que a testosterona também aumenta nos fãs que veem seu time vencer, sem participar da luta.
Um estudo mostrou que meros 20 minutos após o fim da Copa de 1994, decidida nos pênaltis, brasileiros que viram na TV seu país se tornar tetracampeão tiveram a testosterona elevada em 25%. Os italianos, que viram seu time derrotado, sofreram queda de 25% do hormônio.
Quem ganha a batalha e a testosterona, ou apenas se identifica com o vencedor, sai de cabeça erguida, batendo no peito e querendo mais, e tem mais chance de continuar ganhando. Quem perde se recolhe e evita novas disputas. E se consola dizendo que o importante é competir.

SUZANA HERCULANO-HOUZEL, neurocientista, é professora da UFRJ e autora de "Pílulas de Neurociência para uma Vida Melhor" (ed. Sextante) e do blog www.suzanaherculanohouzel.com



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