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punhos cerrados
Cuba sobe no ringue desde a infância
ESTRUTURA MANTIDA PELO ESTADO SELECIONA ATLETAS POR TODO O PAÍS E DÁ SUPORTE A CERCA DE
5.000 BOXEADORES EM ATIVIDADE NA ILHA, ENGLOBANDO TODAS AS CATEGORIAS E FAIXAS ETÁRIAS
EDUARDO OHATA
DA REPORTAGEM LOCAL
Em Cuba, desde a infância se freqüenta os ringues.
Aos oito anos, crianças que
mostram aptidão já vestem o
capacete protetor e calçam luvas, daquelas bem acolchoadas
(16 onças), que mais parecem
algodões doces, para evitar que
se machuquem.
É aí que elas aprendem a postura, o caminhar no ringue e
desferem os primeiros socos.
""As aulas de educação física
têm início aos três anos e são
voltadas ao desenvolvimento
das atividades motoras em geral. Os professores detectam e
anotam quem tem aptidão para
a prática do esporte", explica
João Carlos Soares, técnico da
seleção brasileira de boxe, nascido em Guiné-Bissau e formado em educação física em Cuba,
onde atuou como treinador.
Periodicamente, os colégios
são visitados por equipes de
captação das várias modalidades à procura de garotos de oito
anos que tenham interesse e
qualidades para algum esporte.
Com o consentimento dos
pais, as crianças passam a freqüentar academias rústicas,
sem espelhos (para a prática de
""sombra") e tampouco ringue.
Depois de um ano, quem se
destaca nos treinos permanece.
Porém, mesmo quem é dispensado tem a opção de seguir
praticando boxe, à noite, quando ex-boxeadores e o cidadão
comum têm a opção de treinar.
""Cuba produz muitos treinadores, então a demanda é sempre bem-vinda", diz Soares.
Os períodos matutino e vespertino, no entanto, são reservados a crianças e adolescentes,
que, às centenas e divididos por
grupos etários, vão ocupando
as academias em turnos.
Três ou quatro técnicos e
mais um coordenador acompanham as atividades dos garotos,
que participam de competições
interacademias dentro de seus
próprios municípios. Todos os
resultados são observados. São
esses torneios que definem
quem será encaminhado à Eide
(Escola de Iniciação Esportiva), presente em cada Estado.
Além dos resultados dessas
competições, que contam com
olheiros, membros das Eides
definem os selecionados com
os treinadores das Províncias.
A partir daí, participam de
torneios de base, em diversas
categorias. Até o técnico da seleção nacional costuma acompanhar algumas dessas lutas.
Alguns juvenis são escolhidos para treinar com a seleção
principal na capital, Havana. E
não são necessariamente os
campeões dos torneios. Não é
raro serem chamados até pugilistas que não medalharam, porém que apresentam maior potencial de evolução.
No alto nível, o colchão de
proteção estatal se sofistica.
O número de integrantes das
comissões técnicas que acompanham as seleções de Cuba,
mesmo as de juvenis, supera o
de boxeadores.
Roupeiros, cozinheiras e demais membros das delegações,
além de executarem suas funções, registram as performances dos cubanos e as características de seus adversários para
alimentar um banco de dados.
O Estado cubano intervém
em todas as modalidades, porém é o boxe que é logo lembrado quando se fala da excelência
esportiva do país, controlado
por uma ditadura há 49 anos.
""O sangue quente do povo
cubano, a tradição no país e a
constituição física definem o
sucesso do boxe", afirma o cubano Otílio Toledo, 46, coordenador técnico da seleção brasileira de boxe amador.
""Como não há profissionalismo em Cuba, os melhores estão
concentrados na seleção nacional. Nosso Nacional é mais forte do que um Mundial. Imagine
que todos os jogadores brasileiros de futebol que estão fora se
reunissem para disputar o Brasileiro. Isso é uma realidade para o boxe cubano ", finaliza ele.
É nesse cenário que se originam e são mantidos os cerca de
5.000 pugilistas amadores em
atividade na ilha e que geram
preciosas ""peças de reposição"
à seleção nacional.
Desde dezembro de 2006,
Cuba viu desertarem quatro
ouros olímpicos e um campeão
mundial -cinco medalhas quase certas em Pequim. As baixas
diminuíram o favoritismo cubano, mas os substitutos classificaram dez boxeadores (de 11
possíveis) para os Jogos nos
Pré-Olímpicos das Américas.
Cuba terá de superar a Rússia, atual campeã mundial, a renovação dos EUA e os países do
Oriente, encabeçados pela China, o que aumentará a pressão
sobre o técnico Peter Roque.
Talvez essa situação tenha sido o motivo de o governo cubano ter vetado a presença da reportagem da Folha no país.
Mesmo após cerca de dois
meses de negociações em que
funcionário da Embaixada de
Cuba chegou a fixar data para
emissão do visto, ele foi vetado
sob a alegação de que a reportagem ""atrapalharia a preparação da equipe olímpica".
HOMOSSEXUAL
NÃO PÔDE
COMPETIR
FORA DO PAÍS
Uma das maiores promessas
do boxe cubano na década de
70 foi um meio-médio-ligeiro,
da Província de Pinar del Rio,
que chegou a ser campeão
nacional. Apesar disso,
foi impedido de competir
internacionalmente por
conta de sua orientação
sexual. Após a aposentadoria,
virou zelador de um ginásio
CAMPEÃO
MUNDIAL FEZ
CAMINHO
ALTERNATIVO
Manuel Mantilla, ouro no
Mundial-97, não freqüentou
Eide. Abandonado pelo pai e
criado pela avó, nutriu fortes
laços afetivos com o técnico,
que preferiu mantê-lo
próximo e, sob seus cuidados,
finalmente chegou à seleção
Teófilo Stevenson
O cubano foi campeão dos pesados nas
Olimpíadas de Munique-72, Montréal-76 e
Moscou-80, esta última boicotada pelos EUA.
Perdeu a chance do tetra quando Cuba boicotou
Los Angeles-84 e Seul-88. Stevenson, que se
aposentou em julho de 1988, aos 36 anos,
recusou ofertas milionárias que o colocariam
frente a frente com o campeão mundial
profissional Muhammad Ali em 1978
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