São Paulo, quarta-feira, 04 de dezembro de 2002

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ADOÇÃO TIRA PRAÇAS E ESTÁTUAS DO ABANDONO

RICARDO WESTIN
DA EQUIPE DE TRAINEES

Da janela de seu restaurante, Carlos Beutel fica incomodado com a gente largada nos cantos e com a barulhenta feira livre em que os camelôs transformaram a rua Barão de Itapetininga. Em dez anos, seu estabelecimento foi assaltado três vezes. Mesmo assim, Beutel nunca deu ouvidos à insistência da mulher para que deixasse o centro de São Paulo.
"Você não vai abandonar sua família só porque ela é complicada, vai?", compara ele, que há quatro anos preside, como voluntário, a Ação Local Barão de Itapetininga, uma ONG formada por comerciantes da vizinhança.
Diante da falta de segurança, eles superaram a concorrência do dia-a-dia e se juntaram para instalar uma câmera na rua e outra na vizinha 7 de Abril. Nos próximos meses, mais dez câmeras deverão vigiar a região inteira.
Beutel diz que a atitude é uma reação à "inatividade do poder público". E ele não está só. A Barão é uma das 43 Ações Locais que atuam na área, como franquias da Associação Viva o Centro, criada há 11 anos por empresários, instituições e profissionais liberais com a ambiciosa meta de reverter a degradação da região central.
"Trazer suas atividades é o primeiro passo que a iniciativa privada pode dar para requalificar a área", diz Marco Antonio de Almeida, diretor da Viva o Centro.
A iniciativa privada, porém, faz mais que isso. Na velha rua do Pátio do Colégio, o embrião da metrópole, a Ação Local Boa Vista, com a contribuição de prédios comerciais, tem seis zeladores que consertam as calçadas, varrem a rua e limpam os postes históricos.
O lado novo do Anhangabaú tem iniciativas parecidas. A rua Xavier de Toledo só espera a prefeitura concluir o alargamento das calçadas para que uma empresa reforce a limpeza pública e oito seguranças façam a vigilância dos 700 metros entre o Teatro Municipal e a Biblioteca Mário de Andrade. Para isso, 50 edifícios se comprometeram a dar todo mês cerca de R$ 500 cada um.
Algumas ações são mais perceptíveis. Jardins bem cuidados e fontes jorrando água limpa fazem a área que corta o Anhangabaú lembrar o outrora orgulhoso centro paulistano. Esse oásis existe por causa de acordos da prefeitura com empresas, que adotam praças e monumentos em troca de uma plaquinha no local.
Quando se instalou na pça. Antonio Prado, há 16 anos, a BM&F padronizou as bancas de jornal e criou quiosques para engraxates. Em frente, o Banco do Brasil mantém o primeiro canteiro da São João. O Anhangabaú é cuidado pelo BankBoston. Na esplanada do Municipal, a pça. Ramos exibe placas da Votorantim e da Klabin, que apadrinharam respectivamente os jardins e as estátuas.
Nada sai dos cofres públicos. E das empresas, relativamente pouco. A manutenção do vale, por exemplo, custa R$ 15 mil por mês.
As quantias podem ser bem menores. Como ilustração, a conservação da pça. Visconde da Cunha Bueno, no Real Parque (zona sul), sai por cerca de R$ 10 mensais para cada apartamento do entorno.
"Ninguém se importa quando é a prefeitura que conserva", diz Nair Fiorot, da Ação Local Praça Roosevelt. "Mas se é você que cuida, você aprende a amar. É como se virasse o quintal da sua casa."
Dos 180 monumentos do centro, apenas 16 têm padrinho. E só 11 das 160 áreas verdes são adotadas. Quem quiser cuidar desses "órfãos" deve procurar as subprefeituras e o DPH (Departamento do Patrimônio Histórico).


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