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HISTÓRIA
Governos autoritários
Alemanha de Hitler e Brasil
de Vargas realizam modernização conservadora aliada a projeto
nacionalista
MARIA CELINA D'ARAÚJO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Vargas assume o poder em 1930, e Hitler em 1933. Vargas chega à
presidência
através de uma revolução civil-militar, e Hitler apoiado em uma vitória
eleitoral de seu partido. Ambos têm em comum a época, o culto à
personalidade, um projeto nacionalista, estatizante e autoritário.
Os dois países, por sua vez, partilham o fato de terem iniciado um
processo
de industrialização com o apoio político e econômico das oligarquias
rurais
_a chamada modernização conservadora_, sem passar, portanto, por um
conflito
aberto entre interesses burgueses e agrários.
Embora esses sejam aspectos importantes, as semelhanças são menores do
que
normalmente se pensa quando se consideram os dois estadistas e os dois
países em uma perspectiva mais longa.
Quando Hitler começou seu governo, a Alemanha era um país destroçado
pela
humilhação da derrota na 1ª Guerra Mundial, pelo pacto de Versalhes de
1919,
por desemprego, perdas territoriais e militares e por uma crise
econômica e
inflacionária inédita.
A radicalização entre direita e esquerda era expressa através de atos
de
violência e terrorismo. Um país considerado ingovernável pelos
conservadores
que se opuseram à experiência democrática da República de Weimar,
iniciada
em 1919.
A vitória de Hitler foi associada à reconstrução de uma grande
Alemanha via
industrialização, mas principalmente através de um projeto
expansionista e
imperialista. Foi uma política de conquista territorial, de busca de
hegemonia econômica e política, na Europa e no mundo, que não media
escrúpulos do ponto de vista de alianças e métodos militaristas e
(des)humanos. A sociedade alemã foi contagiada por esse projeto, que
acabou
por impor ao país nova derrota ao fim da 2ª Guerra.
A vitória de Hitler expressa o conservadorismo alemão, o nazismo
reflete a
crueldade do poder discricionário, mas a derrota em 1945 deve ser
entendida
como vitória. Desde então a Alemanha se pauta pelo respeito à
democracia e
aos direitos humanos. Segundo os indicadores, é uma das melhores
democracias
do mundo, apesar dos problemas econômicos que se tornaram mais graves
após a
reunificação em 1989.
Vargas chega ao poder refletindo uma demanda por mudanças moderadas
mas sem
aspectos belicistas. O Brasil, entre 1930 e 1945, fez a opção
definitiva
pelo mundo industrial, por uma legislação social urbana parecida ao que
a
Alemanha fizera no século 19. Não contrariou os privilégios da terra no
que
toca a tributação ou a mão-de-obra. O Brasil era e continuou sendo
conservador. Numa perspectiva histórica, Vargas pode ser mais comparado
a
Bismark que a Hitler. Implantou um projeto nacional autoritário,
conteve as
forças sociais, instalou um sistema de previdência, incentivou as
vocações
industriais do país.
Vargas ditador deixou o poder em 1945, após Hitler se matar e o
nazismo
começar a ser execrado pela história. Voltou ao poder em 1951, pelo
voto
popular de uma democracia que nunca teve o vigor nem o compromisso
alcançado
pela alemã do pós-guerra.
As elites alemães desde então se pautaram por manter compromissos com
valores democráticos. Criou-se uma federação vigorosa e cooperativa que
viabiliza a igualdade social e regional. Vargas mudou o país mantendo
compromissos conservadores que seus sucessores não desautorizaram
completamente.
Maria Celina D'Araújo é doutora em ciência política pelo
Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro e pesquisadora
da Fundação Getulio Vargas
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