São Paulo, quinta-feira, 07 de dezembro de 2006

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Auro Lescher

Psiquiatra vê na arte uma poderosa aliada terapêutica

"Boniteza e decência" oferecem cidadania a jovens

RENATA DE GÁSPARI VALDEJÃO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

O psiquiatra paulistano Auro Danny Lescher, 44, percebeu cedo que tinha a sensibilidade à flor da pele. "Tive uma infância muito bela, sem privações, mas psiquicamente dolorosa", diz.
Começou a fazer psicoterapia com 11 anos e só parou aos 31. "A psiquiatria foi o caminho mais instigante que encontrei para me aprofundar na subjetividade humana e ajudar as pessoas a aliviar suas dores psíquicas e conquistar autonomia".
A tendência reflexiva, aliada a um grande gosto pela arte, acabou forjando o caráter de um psiquiatra que, hoje, vê na manifestação artística uma poderosa aliada terapêutica.
A primeira centelha do que viria a se transformar no Projeto Quixote apareceu quando Lescher fazia residência no Hospital São Paulo (SP). Observando pacientes da ala feminina da psiquiatria, ele percebeu que havia entre elas uma dinâmica semelhante à da história de um mito grego. Decidiu montar uma peça teatral.
"Isso aproximou familiares, pacientes e funcionários e acelerou o processo terapêutico", conta.
Mais tarde, ele criou o Grupo Biruta de Artes Cênicas, na comunidade do entorno de um hospício desativado, o que reforçou em sua mente a importância da arte na vida.
Outro elemento entrou em cena quando ele participou da Comunidade Terapêutica Enfance (criada pelo psiquiatra Oswaldo Di Loretto, hoje supervisor do Projeto Quixote), que oferecia práticas terapêuticas a crianças e adolescentes pobres com distúrbios mentais.

Busca do belo
Em sua investigação acerca da "subjetividade humana", o psiquiatra acabou topando com crianças e jovens que vivem nas ruas e sofrem com dependência química, violência e falta de vínculos e referências. Assim nasceu o Projeto Quixote.
Inspirados pela idéia de Paulo Freire, de que a educação deve oferecer "boniteza e decência", Lescher e alguns amigos criaram um espaço para várias oficinas, entre elas, as de artes plásticas, trabalhos em madeira e grafite. "A arte aumenta a propensão à busca do belo", diz.
Os participantes _crianças e jovens em situação de risco_ e seus familiares recebem atendimento psicossocial e clínico. O sucesso foi tanto que surgiram a Agência Quixote Spray Arte (de grafite), a Oficina de Mães e várias outras atividades. A agência de grafite é profissionalizante: os participantes recebem bolsa de R$ 100. Seus produtos, principalmente objetos de decoração e roupas, são vendidos. Auro diz ainda ter um sonho: de que, um dia, seu projeto não seja necessário.


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