São Paulo, sábado, 16 de maio de 1998

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Naquele palco, ele era tudo

LUIZ CAVERSAN
Diretor da Sucursal do Rio

A lagosta estava congelada.
Essa é sempre a primeira lembrança que vem à minha cabeça quando o assunto é o show de Frank Sinatra no hotel Maksoud Plaza em agosto de 1981.
O show foi acompanhado de um jantar de gala, o preço do ingresso era salgadíssimo, mas nele estavam incluídas as bebidas importadas e os pratos luxuosos.
Mas a lagosta estava congelada quando aterrissou no prato daquele público engalanado.
Era uma lagosta para ser servida fria mesmo, na própria casca. Mas ninguém conseguia espetar o bicho por causa da camada de gelo que persistia em cima dele. Houve gente que, na tentativa de ir à luta, viu seu crustáceo pular do prato.
Lembrança boba, ainda mais se comparada com as surpresas que se sucederam (pelo menos para mim) naquela noite.
Enquanto o jantar era avidamente consumido, o cardápio musical servido de entrada foi papa fina. Comandada pelo maestro Dom Costa, uma orquestra afinadíssima desfilou temas dos Beatles com uma qualidade que deixou críticos de boca aberta.
O prato principal, ao contrário da lagosta, veio ao ponto. Com 25 anos de idade e ligado mais no então emergente rock paulista do que naqueles velhos olhos azuis, eu fui ao Maksoud meio que a contragosto, como alguém que vai à exibição de uma ave rara, em extinção, embora não nutra predileção por penosas em geral.
Mas bastou o homem botar o pé no palco e soltar as primeiras notas para eu entender que, se até aquele momento não sabia o que significava Frank Sinatra, é porque tinha muito o que aprender.
Francis Albert Sinatra naquele palco, apesar do indefectível cabelinho alinhado, era tudo. Ao vivo, "a voz" massacrou meu ceticismo. Sinatra criou um clima mágico de canções que encerram um mundo todo particular, sinatriano, e no qual embarcaram com deleite todos os presentes.
De "Fly Me to the Moon" a "As Time Goes By", passando pelas inevitáveis, mas emocionantes "New York, New York" e "My Way", foi uma viagem deliciosa por um mundo repleto de elementos hoje de somenos importância, como a elegância, a formalidade e o charme transbordante de um senhor que canta temas românticos.
Naquele dia, diante de Frank Sinatra, eu entendi que existem artistas verdadeiramente especiais.



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