São Paulo, domingo, 17 de junho de 2007

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ARTIGO

Patrocínio esportivo, muito a explorar, muito por fazer

MARCO AURELIO KLEIN
ESPECIAL PARA A FOLHA

EM 1904, nos EUA, a fabricante de bolas Spalding patrocinou um almanaque da Olimpíada de Saint Louis _‘‘Spalding’s Official Athletic Manual’’_, com nada menos do que 19 páginas de anúncios. Antes, em 1864, John Wisden, o jogador de críquete mais famoso da Inglaterra, criara o ‘‘Wisdens’s Cricketer’s Almanak’’, editado até hoje e espécie de bíblia do tradicional esporte britânico.
Nos Jogos de 1912, em Estocolmo, Suécia, diversos direitos foram vendidos a nove empresas. O esporte como espetáculo crescia e já estava descoberto como veículo para a comunicação de propaganda.
Duas guerras mundiais e a interrupção na realização de grandes competições internacionais contribuíram para certo atraso no desenvolvimento dessas ferramentas.
No pós-guerra, durante os anos 50, aconteceu a retomada das principais competições e o surgimento de outras, como a F-1, por exemplo.
Aqui e ali, diferentes iniciativas de patrocínio. A maioria só divulgação de marcas.
O patrocínio no automobilismo não era permitido na F-1, porém, em 1968, importantes fornecedores, como Shell, BP e Firestone, ameaçaram sair caso não pudessem expor suas marcas. Assim começava a era do patrocínio na mais badalada categoria do automobilismo.
Na apresentação do novo carro, Colin Chapman, legendária figura da F-1, numa entrevista no GP de Mônaco, mostrava seus carros pintados no vermelho e branco dos cigarros Gold Leaf, primeiro patrocinador oficial no automobilismo.
As imagens foram cortadas aos gritos pelo diretor de uma das TVs: ‘‘Se permitirmos imagens de propaganda nos carros, o que virá depois? Vamos acabar tendo clubes de futebol querendo propaganda nas camisas...’’.
Tinha razão: no final dos anos 70, clubes desafiavam a federação inglesa, as multas e a imprensa, indo a campo com propaganda nas camisas. TVs cancelavam transmissões de times com anúncio nas camisas.
Atualmente, nos EUA, segundo o Sponsorship Research International Worldwide, entre 60% e 70% do total de gastos com despesas de patrocínio, excluídos os anúncios tradicionais na mídia impressa e na TV, são alocados no esporte (eventos, federações, times, estádios e atletas individuais).
Nenhum tostão público.
No Brasil _que talvez tenha sido o precursor do que hoje é conhecido como "naming rights", porque, em 1933, o Palmeiras, então Palestra Itália, inaugurou seu estádio, o Parque Antarctica (hoje Estádio Palestra Itália), erguido em terreno cedido pela cervejaria Antarctica_, foi apenas nos anos 80 que o patrocínio esportivo iria prosperar.
No futebol, o Náutico do Recife, em 1982, foi o primeiro clube a ostentar um patrocínio na camisa (Novogás), embora a Ponte Preta de Campinas tenha sido a primeira a estampar a marca do fornecedor de material esportivo em 1979.
A final do Brasileiro de 1984 teve ambos os finalistas, Vasco e Fluminense, patrocinados pelo banco Nacional, que, no ano seguinte, patrocinaria um jovem piloto estreante na F-1: Ayrton Senna.
A Petrobras patrocina o Flamengo desde então.
Todavia tudo ainda era tão incipiente que clubes da importância de Santos e Palmeiras chegaram a ser patrocinados por Guarujá Veículos e Galeria Pajé, respectivamente.
Muito se faz empiricamente.
Salvo honrosas exceções, o patrocínio esportivo ainda é muito mais uma forma de mídia diferenciada e mais barata em relação a outras ações tradicionais do que decorrência de um plano estratégico _de médio ou longo prazo, com objetivos mercadológicos definidos, além da simples aparição de marcas.
O patrocínio esportivo é visto sob uma ótica assistencialista, uma maneira de ‘‘ajudar’’ um esporte, um clube ou um atleta. Vendedores e compradores de propriedades esportivas de certa forma se sentem relacionados ao conceito de benemerência.
Não por acaso existe o sentimento da necessidade do braço, ou do bolso, do governo, por meio das estatais ou de incentivos fiscais, como provedor do esporte.
É importante que se diga que o dinheiro de estatais pode, sim, ser bem aplicado, quando decorrente de decisão técnica; elas são empresas com necessidades e oportunidades mercadológicas como as outras.
Como bons exemplos, temos Banco do Brasil com o vôlei e Caixa com o atletismo. São dois patrocínios com estratégias bem definidas para as melhores possibilidades do marketing esportivo e colaboram na divulgação dessas modalidades perante a população, contribuindo para diminuir a monolítica prevalência do futebol_e a monocultura esportiva, pois_ sobre os outros esportes na disputa pelas verbas de marketing e pelo espaço na mídia.
Cabe ao próprio mundo do esporte, bem como aos profissionais do marketing e da propaganda, romper com o atual modelo empírico, ajudando na capacitação dos envolvidos para que o esporte ganhe o lugar que merece na disputa pelas verbas de marketing.
Claro está que isso passa pela qualificação do modelo esportivo brasileiro, suas entidadese competições.

MARCO AURELIO KLEIN é professor da FGV


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