São Paulo, quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CINE & MODA

"Atriz" usa os filmes em proveito próprio

CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA

Na comparação entre Madonna, 50, e as grandes estrelas de cinema, o que existe mesmo de mais profundo é o abismo geracional.
O que a diva pop soube fazer de melhor foi assimilar imagens glorificadas num passado suficientemente longínquo para ser considerado mítico e lançá-las em seu caldeirão pop.
Para lembrar algumas: a Gilda de Rita Hayworth contrabandeada nas luvas da Madonna de cabelos castanhos da primeira fase, depois a Marilyn Monroe explicitamente reencarnada na descida de degraus do clipe de "Material Girl" (85), substituída em seguida pela Madonna de "Erotica" (92) que recuperava para as multidões o fascínio secreto de Dita Parlo [atriz alemã; 1906-1971].
Sob tantas camadas, o que sobra da própria Madonna quando se expõe às câmeras do cinema? Como nas versões musical e cênica, nos filmes também não existe essa Madonna residual, essa essência imutável por trás de sua sucessão de simulacros.
O que o cinema melhor capturou dela (ou, para ser mais adequado, o que ela soube explorar dos filmes em proveito próprio) foram os próprios personagens, quase sempre em perfeito ajuste com um momento de sua persona.
A Susan de "Procura-se Susan Desesperadamente" (85) e a Nikki de "Quem É Essa Garota?" (87), por exemplo, que ajudaram a firmar a figura despachada e serelepe dos primeiros álbuns.
Enquanto a Rebbeca de "Corpo em Evidência" (93) apenas cumpre a função de manter vendáveis as "transgressões" de "Sex"/"Erotica", muito mais arriscado e menos calculado é o jogo de submissão da atriz/personagem com o diretor Abel Ferrara em seu ótimo "Olhos de Serpente" (93).
Quando ela deixa seus fantasmas de cinema "interpretarem", o desastre é inevitável. Exemplos? "Surpresa em Shanghai" (86); "Dick Tracy" (90); "Evita" (96) e "Destino Insólito" (02). Em todos, Madonna se torna atriz e o resultado é tão sem interesse como quando ela tenta nos convencer de que é cantora.


Texto Anterior: Eu odeio: Tudo parece óbvio demais
Próximo Texto: As marcas se estapeiam pela cantora
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.