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ALIANÇAS
Coalizão de FHC começou e terminou com o Plano Real
Alan Marques - 17.set.2002/Folha Imagem
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MANDATO DUPLO O presidente desce rampa no Palácio da Alvorada, no final
de seu segundo mandato; o Real permitiu sua eleição em 1994 e sua recondução ao
cargo; a desvalorização da moeda em 1999 derrubou a taxa de aprovação de FHC
e prejudicou o desempenho dos partidos governistas nas eleições de 2000 e de 2002
FERNANDO RODRIGUES
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A coalizão que sustentou o presidente Fernando Henrique Cardoso começou com o Plano Real, em 1993. Terminou agora, em 2002, quando a moeda passa pela sua maior crise, com a inflação chegando à casa dos 10%. No campo político, a aliança fernandista tem uma uma outra coincidência: começou e terminou com e por causa do PFL (Partido da Frente Liberal),
egresso da antiga Arena (Aliança
Renovadora Nacional), que deu
sustentação ao regime militar
(1964-1985). "O PFL foi a primeira
força que decidiu, de forma orgânica, apoiar o Plano Real, ainda
em dezembro de 1993", relata o
presidente nacional do PSDB, deputado federal José Aníbal.
No ano seguinte, em 1994, o PFL
também entrou na candidatura
de FHC na frente dos outros. Ganhou a vaga de candidato a vice-presidente, que ficou com o pernambucano Marco Maciel.
Em 2000, foi o PFL que começou a se afastar da aliança fernandista por causa dos desentendimentos entre o então senador Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA)
e FHC. A coalizão nunca mais
funcionou como no início, até que
acabou em definitivo na disputa
presidencial deste ano.
Há controvérsia entre os políticos sobre se o PFL se afastou, foi
afastado ou um pouco das duas
coisas. Há quase um consenso,
porém, sobre o fato de as disputas
pelas presidências da Câmara e
do Senado, em fevereiro de 2001,
terem funcionado como a ignição
definitiva para a crise política na
coalizão que sustentou FHC.
PFL, PMDB e PSDB não se entenderam em 2001. Havia um
acordo tácito entre essas siglas. O
PSDB, por ter o Palácio do Planalto, sempre se afastava das disputas pelas presidências da Câmara
e do Senado, que eram ocupadas
em rodízio por PFL e PMDB.
Como no Senado houve um desentendimento sobre quem seria
o presidente da Casa (ACM defendia o ex-presidente da República José Sarney; a cúpula do
PMDB desejava o então senador
pelo Pará Jader Barbalho), o equilíbrio político se desfez. Para vencer com Jader -que depois renunciou ao mandato, enredado
em acusações de corrupção-, o
PMDB fez um acordo com o
PSDB. Essas duas siglas alijaram o
PFL. Jader ganhou a presidência
do Senado. Na Câmara, venceu o
tucano mineiro Aécio Neves.
Foi uma humilhação para ACM
e para o PFL, cujo líder na Câmara, Inocêncio Oliveira (PE), teve
uma derrota não programada.
Depois dessa disputa, a coalizão
nunca mais foi a mesma. Transformou-se em uma sombra do
que havia sido nos quatro primeiros anos de mandato de FHC.
A maior aliança
Em 1994, FHC teve três partidos
principais ao seu lado: PSDB, PFL
e PTB. Foi suficiente para vencer
no primeiro turno. Em 1998, o tucano montou a mais ampla coalizão da história moderna brasileira. Além de ter PSDB, PFL, PTB e
PPB oficialmente, conquistou o
apoio informal da maioria do
PMDB. Dessa forma, FHC teve a
seu lado tanto os principais partidos surgidos da Arena (PFL e
PPB), como os grupos mais fortes
saídos do MDB (PMDB e PSDB).
Em São Paulo, propagandas impensáveis eram vistas em 1998.
Em alguns outdoors, FHC aparecia ao lado do candidato do PPB
ao governo paulista, Paulo Maluf.
E outros cartazes, o tucano ficava
com o concorrente de Maluf, o
candidato do PSDB, Mário Covas.
"Em 98, o presidente Fernando
Henrique praticamente obrigou o
PFL a apoiar Paulo Maluf para o
governo de São Paulo. Pediu a
mim e ao Bornhausen. Acertou
tudo com Maluf em um jantar no
Alvorada", relata ACM. Interessava a FHC em 1998 ter o mínimo de
candidatos competitivos na disputa presidencial. A rigor, só foram três: o tucano, Lula (PT) e Ciro Gomes (PPS). Foi o suficiente
para repetir a vitória no primeiro
turno, como ocorrera em 1994.
Uma característica do presidente surgiu desses episódios. Para
muitos, FHC não cumpria suas
promessas políticas. "Ele me traiu
no segundo turno de 1998. Gravou uma declaração de apoio vigoroso ao Covas. Não recomendo
a ninguém fazer um acordo com
FHC sem ter, no mínimo, 30 testemunhas. Com todas as testemunhas assinando", diz Paulo Maluf.
Hegemonia tucana
Com FHC reeleito, parecia que
estava a pleno vapor a idéia de
manter os tucanos por 20 anos no
poder, como imaginara Sérgio
Motta, ministro das Comunicações de FHC que morreu em abril
de 1998. Mas fatos imprevistos,
dificuldades econômicas e falta de
habilidade política de integrantes
da aliança acabaram impedindo o
plano tucano de ir em frente.
Apesar da reeleição, em 1998 já
havia um prenúncio forte de problemas. Um fato inesperado em
abril daquele ano: morreram Sérgio Motta e o deputado federal
Luís Eduardo Magalhães (PFL-BA). Luís Eduardo era a grande
perspectiva de poder dos pefelistas. Sua morte deixou um vácuo
político nunca preenchido no
partido. Abriu-se espaço para o
PSDB avançar sua pretensão de
hegemonia dentro da aliança.
Quando FHC tomou posse, em
1999, o real foi desvalorizado e a
economia passou a ser um problema, não mais uma solução para os políticos. Em 2000, o PT teve
ampla vitória nas eleições municipais, ficando com seis capitais
(São Paulo, Recife, Porto Alegre,
Belém, Goiânia e Aracaju).
A popularidade do presidente
arrastou-se em patamares inferiores aos do primeiro mandato.
A aprovação do governo FHC,
que havia alcançado 47% em dezembro de 1996, caiu para 13% em
setembro de 1999 e nunca superou os 31% no segundo mandato.
Quando 2002 chegou, PSDB sofreu com uma cizânia interna a
respeito de quem deveria ser o
candidato à Presidência. Venceu a
parada o senador José Serra (SP).
Nunca conseguiu unificar a sigla
em torno do seu nome. A conjuntura também não ajudava.
No final de 2001, o PFL defendeu que os partidos fernandistas
fizessem uma prévia interna para
escolher o melhor presidenciável.
A reação tucana foi de desdém.
"O critério do PFL pressupunha
candidatos de fora do PSDB. Eu
sempre deixei claro para eles que
era impensável o PSDB não ter
candidato a presidente", diz o
presidente tucano, José Aníbal.
O PSDB passou também a demonstrar uma preferência por
um candidato a vice-presidente
do PMDB: o PFL ficaria de fora.
Os pefelistas reagiram. Lançaram
a candidatura de Roseana Sarney,
inviabilizada quando surgiu a
acusação de desvio de verbas.
José Aníbal nega ter havido preferência pelo PMDB. "Só houve
um desgaste na relação com o
PFL", diz. Para o deputado federal
Roberto Brant (PFL-MG), um ex-tucano e hoje um dos nomes relevantes dentro do mundo pefelista,
ocorreu algo diferente: "Foi uma
marcha da insensatez. Os tucanos
nasceram do PMDB e achavam
que a aliança com esse partido seria mais apropriada no jogo das
aparências, mais chique".
Para o pefelista, o presidente da
República foi omisso durante o
processo de deterioração da aliança: "É claro que ele se omitiu. Ainda quando eu estava no PSDB sofri uma humilhação. Fizemos um
bloco com o PTB. Sérgio Motta e
Luís Eduardo Magalhães foram a
FHC e o presidente desfez o bloco
em seis horas para não atrapalhar
o equilíbrio da coalizão. No caso
da candidatura do Aécio a presidente da Câmara, fomos ao presidente e ele não fez nada, disse que
era tarde demais. Mas não era".
Maioria episódica
Apesar de ter tantos partidos
pendurados a seu lado no governo, FHC só teve maiorias episódicas no Congresso. Sempre negociava no varejo, deputado a deputado, senador a senador, para
conseguir aprovar reformas polêmicas. Em 1997, quando ficou conhecida a compra de votos de deputados para a aprovação da
emenda da reeleição, foi preciso
impedir a instalação de uma CPI.
Os deputados envolvidos no caso renunciaram. A CPI nunca foi
instalada e não se sabe até hoje, de
forma definitiva, quem comprou
os votos. Os deputados citavam o
então ministro Sérgio Motta, que
negou o envolvimento à época.
Para abafar o problema, não
bastou ter a maioria teórica no
Congresso. O PMDB teve de ser
trazido oficialmente para o governo tucano, ganhando dois ministérios: a pasta da Justiça (que foi
para o senador goiano Iris Resende) e a dos Transportes (para o
deputado gaúcho Eliseu Padilha).
"O país é tecnicamente ingovernável, pois os partidos não são organizados. Não adianta negociar
posições com os líderes partidários", diz o deputado federal eleito
Luiz Carlos Santos (PFL-SP), que
foi ministro de Assuntos Políticos
de FHC. "A cada votação importante é necessário construir uma
nova maioria. Você entrava no
plenário e já apareciam os deputados com um papelzinho na mão
perguntando: "Já resolveu isso?".
Enquanto não se resolvessem esses problemas de interesse pessoal dos deputados, não se votava
nada", relata Luiz Carlos Santos.
A aliança de FHC sobreviveu
enquanto o Real, em alta, ajudava
a administrar o varejo congressual. Quando os políticos farejaram o fim, ela se desfez. Quem resume o quadro é Aécio Neves:
"Toda coalizão sobrevive por causa da perspectiva de poder. Muitos não enxergaram na candidatura Serra essa perspectiva".
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