|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Sobra sexo no imaginário e falta na vida
Vida íntima de brasileiros sem parceiro fixo não é assim aquela loucura que se poderia esperar
BIA ABRAMO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Talvez não seja impossível
ser feliz sozinho, nem o amor
seja mais tão fundamental assim. Tom Jobim escreveu os famosos versos de "Wave" (""fundamental é mesmo o amor, é
impossível ser feliz sozinho")
em 1967, na aurora da revolução sexual. Depois, vieram a pílula e a lei do divórcio; a moral
afetiva e sexual liberalizou-se.
Nesse ambiente menos reprimido, era de se esperar que
homens e mulheres adultos e
livres tivessem mais oportunidades de fazer sexo. Será?
Nem tanto: o número de brasileiros sem parceiro fixo chega
a 28%, diz o Datafolha. Mais:
23% dos entrevistados não tinham mantido nenhuma relação sexual entre janeiro e setembro de 2009.
Há sexo demais no imaginário e menos na vida das pessoas? A psicanalista Maria Rita
Kehl acha que sim: "O modo como a publicidade e o espetáculo
em geral se apropriaram de
imagens eróticas, sugestões sexuais e apelos ao gozo como "valor agregado" de todas as mercadorias acabou por tornar o
sexo obrigatório", diz ela.
Segundo a psicanalista,
quando o sexo vira dever -tanto faz se dever conjugal ou dever de preservar uma imagem
de acordo com a norma vigente- ele, em primeiro lugar, padroniza-se, em segundo lugar,
amesquinha-se. "E, por fim,
deixa de ser interessante."
Entre os sem parceiro, as
mulheres são maioria expressiva: 62% contra 38% dos homens. O psiquiatra Luiz Cuschnir, especialista em questões de
gênero, oferece uma explicação: ""O homem tende a buscar
uma parceira, mesmo que não
se complete com ela afetivamente, e a manter esse relacionamento por um tempo
maior", diz.
Os homens sozinhos estão
em casa, ou isolados ou já comprometidos, continua. "As mulheres tendem a se expor mais a
encontros sociais que podem
levar a relacionamentos, mas,
com uma alta frequência, reclamam que saem dessas exposições sociais sem a companhia
de um homem", diz Cuschnir.
Se a vida sexual contemporânea não é assim tão auspiciosa
em termos quantitativos, também não o é em termos qualitativos, sobretudo para aqueles
que passaram por uma separação ou divórcio.
Separados e divorciados avaliam menos bem sua primeira
experiência sexual: 23% avaliam como péssima, contra 12%
entre os casados; aqueles que
avaliam com ótima/boa são
54% contra 65% dos casados.
Outro dado do Datafolha:
quando solicitados a dar uma
nota de zero a dez para o parceiro atual, 43% dos casados
atribui a nota máxima, enquanto que apenas 20% dos separados/divorciados o fazem.
Da mesma forma, mais casados do que separados/divorciados acham que a vida sexual
melhora depois de ter filhos
(31% contra 25%) e mais separados/divorciados afirmam
que piora (23% contra 14%).
Para Maria Rita Kehl, a vida
amorosa contemporânea está
cercada de expectativas altas
demais -e, quando vem a separação ou divórcio, produz-se
uma espécie de choque de realidade. ""Não há separação sem
dor, mágoa, desencanto e outras feridas difíceis de cicatrizar", explica ela.
"O amor é um ideal muito
grande em nossa cultura, e seu
fracasso tende a ser um golpe
narcísico imenso. Sofre-se não
apenas da saudade ou da perda
de quem se ama ou se amou,
mas do sentimento de fracasso
em relação a um empreendimento no qual se aposta sempre alto demais."
Texto Anterior: Ser fiel é essencial. Mas o que é trair? Próximo Texto: O pênis do vizinho é sempre maior... Índice
|