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O bagunçado - Caracas - 1983
Bagunça na Vila e obras atrasadas afastam país de grandes eventos
DA REPORTAGEM LOCAL
Caos foi o termo mais
usado para definir o
que ocorreu no Pan
de Caracas-1983. As
delegações que foram à competição não lembram com saudade das condições oferecidas pelo Copan, o
Comitê Organizador do Pan.
Os primeiros a chegar à Vila
Pan-Americana encontraram
as instalações inacabadas e em
condições precárias. Os quartos ainda não tinham portas
nem armários. As roupas ficaram amontoadas pelo chão.
Muitos banheiros tiveram
problema de infiltração. Isso
no momento em que a água
apareceu, já que nos dias iniciais houve desabastecimento.
Para dar condições mínimas
de moradia, vários atletas tiveram que pegar balde, esfregão e
rodinho para fazer faxina.
André Richer, chefe da missão brasileira, tentou comprar
800 cabides em um supermercado. A intenção era distribuí-los entre os membros da delegação. Mas a empreitada não
foi bem-sucedida -conseguiu
comprar apenas 200 itens.
Insatisfeitos, os norte-americanos realojaram seus representantes em hotéis de luxo.
Mesmo destino tiveram as seleções nacionais de vôlei e o nadador Ricardo Prado, principal
estrela do Brasil em Caracas.
O tratamento desigual gerou
ciumeira entre os brasileiros.
"Superamos as dificuldades
encontradas nos alojamentos e
não precisamos dar luxo aos
atletas", disse Tsutomo Nitsuma, chefe da equipe de judô.
Projetada por uma empresa
privada para seus apartamentos serem negociados após o
evento, a Vila também sofreu
com a falta de planejamento.
O acesso a ela se dava por
uma estreita ponte, que ficava
congestionada de atletas nos
momentos de pico, no início da
manhã e no final da tarde.
O transporte foi outro item
problemático. Para não perder
as competições, os atletas chegavam a deixar a Vila até três
horas antes de suas disputas.
Além disso, os hóspedes também conviviam com o barulho,
já que muitas obras estavam
sendo concluídas. Foi o caso do
centro de entretenimento e lazer, finalizado durante os Jogos -nos primeiros dias, muitos reclamaram de que não havia nada para fazer na Vila.
O Estádio Olímpico, local das
cerimônias de abertura e encerramento e das provas de
atletismo, também foi aprontado às pressas. Os operários dobravam turno inclusive de madrugada, quando trabalhavam
com os refletores acesos.
Crise e intervenção
O atraso nas obras se deveu
principalmente a dois problemas, um de ordem política e
outro na área econômica.
No primeiro caso, houve disputa interna entre o governo
federal e os dirigentes do Comitê Olímpico Venezuelano.
Insatisfeito com o trabalho
do COV, o governo federal determinou a intervenção no comitê e prometeu rigorosa investigação a respeito dos gastos
com o Pan logo após os Jogos.
O Copan passou a ser gerido
por um grupo nomeado pelo
Estado, com a ajuda de cinco
dirigentes da Organização Desportiva Pan-Americana: um
cubano, um panamenho, um
colombiano e dois mexicanos.
Desgostosos, os dirigentes do
COV ameaçaram até com um
inédito boicote aos Jogos em
seu próprio país. "Esse é um escândalo sem precedentes no
mundo", disse Flor Izava, dirigente do comitê venezuelano.
A economia também não ia
bem. Os ganhos com a venda de
petróleo já não bastavam para
equilibrar as contas públicas e o
país vivia crise econômica gerada pelo crescimento da dívida
externa e pela desvalorização
do bolívar, a moeda local. A demora na liberação de verbas
atrasou várias obras do Pan.
De volta à cena
O fiasco de 1983 afastou a Venezuela de grandes eventos esportivos por vários anos. Com o
governo Hugo Chávez, eleito
em 2002, isso mudou. O presidente do país segue a receita do
regime de Fidel Castro e investe pesado em esporte em busca
de dividendos políticos e repercussão internacional favorável.
No mês passado, Barquisimeto foi sede da segunda edição dos Jogos da Alba (Jogos
Esportivos da Alternativa Bolivariana para os Povos da América), que serviu como preparação de vários países para o Pan.
Cerca de 4.000 atletas de 31 nações participaram do evento.
Neste ano, o país será a sede,
pela primeira vez, da Copa
América de futebol, principal
torneio entre seleções sul-americanas, que terá início daqui três dias. O Estádio Olímpico, usado no Pan-83 passou por
reformas e será reaproveitado.
Outras arenas foram construídas especialmente para a
competição, a um custo total
de US$ 700 milhões (cerca de
R$ 1,336 bilhão), segundo números dos organizadores.
O país também pretende ser
candidato a sede de algum
Mundial de base. Outro projeto, mais ambicioso, é abrigar
novamente um Pan. Juana
Suárez, vice-ministra do Esporte da Venezuela, já anunciou candidatura aos Jogos de
2015 -a edição de 2011 já está
programada para Guadalajara.
"Podemos organizar um Pan,
pois estamos entre os cinco
países do mundo com melhor
infra-estrutura esportiva."
Outra iniciativa prevista é a
candidatura a sede do Mundial
masculino de basquete de
2014.
(ADALBERTO LEISTER FILHO)
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