São Paulo, terça-feira, 28 de maio de 2002 |
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MÉXICO 70 Obrigado, doutor
O diagnóstico de um médico definiu a escalação e acabou com a última dúvida de Zagallo na linha de frente de uma das mais espetaculares seleções de todos os tempos. A menos de um mês do início da campanha rumo ao tricampeonato em 70, o médico Roberto Abdalla fora chamado às pressas pelo técnico da seleção para dar uma última opinião sobre o jogador que havia operado. A escalação do artilheiro do Brasil nas eliminatórias dependia da recuperação de sua visão, afetada por um deslocamento de retina causado por uma bolada, em setembro de 69. Além da lesão, a substituição de João Saldanha por Zagallo, às vésperas do Mundial, sinalizava a possível dissolução da dupla de ataque, onde ele já havia se mostrado o companheiro ideal de Pelé. Para Zagallo, o meia do Cruzeiro teria de disputar posição justamente com o antigo parceiro. Relegado ao posto de suplente, uma hemorragia pós-operatória aumentaria as dúvidas em relação às suas reais condições. O "100% positivo" dado pelo médico, aliado ao poder de influência do meia Gérson, a quem Zagallo respeitava como líder dentro de campo, definiu a equipe com cinco "camisas 10". A escalação do "Mineirinho de Ouro" foi mais uma das muitas improvisações bem-sucedidas de Zagallo. Meio-campistas em seus clubes, Rivellino e Jairzinho atuaram como "pontas falsos", e Wilson Piazza recuou à zaga. Não só as improvisações funcionaram, como justamente o alcance da visão colocada sob suspeita acabou sendo determinante em duas partidas consideradas como as mais difíceis da Copa. Contra a Inglaterra, na primeira fase, persistia o 0 a 0 com ligeiro domínio dos campeões mundiais. Ao notar o atacante Roberto no aquecimento, o meia cruzeirense partiu para sua melhor jogada no torneio. Depois de se livrar de três adversários, com direito a uma bola entre as pernas de Bobby Moore, cruza, sem olhar, direto nos pés de Pelé, de quem saiu o passe preciso para Jairzinho marcar. Esse gol suado garantiu a vitória num dia em que o inglês Banks efetuou uma histórica defesa após cabeçada de Pelé. O feito do goleiro foi apenas uma amostra da dificuldade que o Brasil enfrentava em campo para ampliar a vantagem sobre os rivais. Contra o Uruguai, em situação igualmente delicada, saiu dos pés do mineirinho, então com 23 anos, o passe milimétrico para Clodoaldo, que, na corrida, empataria o jogo aos 44min do primeiro tempo. Mais solto, o Brasil acabaria fazendo 3 a 1. Além de comprovar a recuperação da sua visão com assistências e dois gols, o atacante se superaria na final contra a Itália, quando serviu também aos olhos de Pelé. No quarto gol, quando Carlos Alberto Torres descia desmarcado em disparada pela lateral direita, Pelé, de costas, foi alertado pelo parceiro -que vislumbrava todo o lance- para que rolasse a bola para a conclusão do capitão brasileiro. Novamente, o que se viu foi a capacidade de observação, dessa vez tática, do atacante em uma jogada ensaiada. O então preparador físico Carlos Alberto Parreira costumava fotografar as atuações dos adversários e mostrara como Jairzinho poderia atrair a marcação em busca de espaço para o avanço de Carlos Alberto. Funcionou. No final, por ter enxergado tanto, Tostão não guarda mais a medalha do tri. O prêmio foi dado como presente e se tornou a mais valiosa prova de reconhecimento da vida do doutor Abdalla. Texto Anterior: Inglaterra 66: 'Bestial' e 'besta' Próximo Texto: Alemanha 74: Marca da vaidade Índice |
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