São Paulo, segunda-feira, 28 de outubro de 2002

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Até agora calada, esquerda do PT reivindica espaço

PATRICIA ZORZAN
DA REPORTAGEM LOCAL

Estrategicamente calados até a eleição, representantes da esquerda do PT prometem iniciar uma disputa no partido na tentativa de evitar que o governo do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva seja caracterizado pela moderação demonstrada na campanha.
"Ninguém quer atirar pedras, mas o país está em uma situação em que não há como ser moderado", afirmou o ex-prefeito de Porto Alegre Raul Pont, um dos principais líderes da corrente de esquerda Democracia Socialista.
"O PT mudou seu programa e quebrou a resistência de setores da burguesia ao Lula. Eleitoralmente, funcionou. Vamos ver como vai ser governando. As pessoas querem paz, mas com melhoria de vida", disse a deputada federal eleita Luciana Genro (RS).
Integrantes da esquerda petista pretendem não apenas cobrar de Lula o cumprimento de questões programáticas mas também reivindicar participação nas equipes de transição e de governo.
"Não aceito que o Campo Majoritário [ala moderada da qual fazem parte, entre outros, Lula e o presidente nacional da sigla, José Dirceu] indique o governo. O partido quer continuar sendo ouvido", declarou Pont. "O governo tem de sair de um processo de maioria e de consenso. O partido como um todo deve estar no governo e nós somos o partido."
Embora controle apenas cerca de 30% do Diretório Nacional, principal órgão decisório do PT, a esquerda terá seu poder ampliado no Congresso com o aumento proporcional e em números absolutos de seus deputados eleitos.
Dos atuais 12 parlamentares, segundo cálculos feitos pelo deputado Luciano Zica (SP), a ala contará agora com 28 representantes na Câmara dos Deputados, o equivalente a 31% da bancada, se contabilizados também os representantes da extrema-esquerda.
"Vamos ter de disputar o rumo do futuro governo e a posição da esquerda é importante para fortalecê-lo programaticamente", afirmou Zica. "Vamos puxar o governo para a esquerda. Caso contrário, corremos o risco de fazer algo convencional. O Campo Majoritário é mais sujeito às pressões e tem defendido posições menos mudancistas", completou ele.
O deputado Milton Temer (RJ), um dos líderes da corrente de esquerda Força Socialista, disse não acreditar que Lula será moderado, mas avalia que caberá ao PT o contraponto de esquerda entre as forças que apoiaram a legenda.
"O PT tem de ser o pólo radical da frente. O governo não tem de ser um governo para impor as bandeiras do PT, mas elas têm de estar hasteadas e pressionando os outros da frente para convencê-los do que achamos melhor", declarou. "E a esquerda tem de ser um problema para os que impuserem moderação ao Lula."
Entre as questões que causarão polêmica dentro da sigla, está a anuência do presidente eleito ao acordo com o FMI. "Temos de criar um ambiente para que a população entenda que o FMI é um inimigo", afirmou Genro. "Priorizaremos o acordo, o superávit, ou as demandas do povo?"
Apesar do tom crítico adotado desde já, todos são unânimes ao declarar que os prováveis confrontos internos não inviabilizarão o governo. "Sabemos que, quando perdermos [internamente], temos que aceitar. Aceitamos o jogo democrático", disse Zica.


Colaborou FÁBIO ZANINI, da Reportagem Local

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