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3 - O que o Brasil deve fazer com a receita do petróleo?
SAMANTHA LIMA
DA SUCURSAL DO RIO
VALDO CRUZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Até que o primeiro barril de
petróleo das áreas do pré-sal
ainda não exploradas seja convertido em reais para os cofres
de governos e empresas, o país
deverá esperar quase uma década. Mas, ainda situadas em
um futuro distante, as receitas
do pré-sal começam a ter seu
destino selado na criação do
marco regulatório -e já são alvo de debates e disputas.
Pelo modelo que será enviado ao Congresso, o governo
proporá a criação de um fundo
para o destino das receitas do
petróleo. Uma parte será investida em títulos públicos, ações e
projetos de infraestrutura, no
Brasil e no exterior. Outra parte será usada em saúde, educação, no combate à pobreza e em
inovação. Os percentuais não
foram definidos.
O nome não está decidido,
mas deverá ser Fundo de Desenvolvimento Social. O controle e a decisão de como o dinheiro será aplicado serão entregues a um comitê gestor.
A atual forma de divisão dos
recursos do petróleo, o pagamento de royalties, será revista. O governo indicou que municípios e Estados continuarão
recebendo recursos, mas que
reduzirá a fatia hoje prevista. A
ideia é estender as receitas a todos os municípios e Estados,
em vez de concentrá-las só onde há atividade petrolífera.
Um dos pontos de controvérsia refere-se ao "carimbo" de
recursos. O coordenador do
curso de geologia da Universidade Federal da Bahia, Doneivan Ferreira, acredita que seja
necessário criar mecanismos
para assegurar que os recursos
não tenham outra finalidade.
"Poderia ser criada uma espécie de multa, por exemplo.
Devemos evitar o uso para pagar despesas do governo", diz.
Opinião diferente tem Renato Bertani, ex-presidente da
Petrobras América e sócio da
consultoria Thompson Knight.
"Não precisa ter destinação fixa. Pressupondo-se eficiência
do governo, o dinheiro pode entrar no caixa e ser destinado
conforme as necessidades", diz.
Aplicar em área social e no
exterior não tem apoio unânime. "O maior problema do país
é infraestrutura. Receita para
gastos sociais já é prevista por
lei e cresce automaticamente
quando a economia vai bem.
Investir no exterior é outra bobagem", diz o ex-presidente do
BNDES Carlos Lessa.
Investir parte do dinheiro no
exterior é apontado por outros
especialistas como medida para evitar uma entrada excessiva
de dólares no país e a consequente valorização do câmbio
-o que pode liquidar a competitividade dos exportadores.
"A medida nos protege contra a "doença holandesa'", diz o
senador Delcídio Amaral (PT-MT), referindo-se ao termo
usado para a perda de competitividade em países que descobrem grandes reservas de recursos naturais. Surgiu quando
o fenômeno foi verificado na
Holanda, cuja economia foi "vítima" da descoberta de reservas de gás, nos anos 60 e 70.
"O excesso de dinheiro na
economia também traz risco de
inflação, como na Venezuela",
diz Lisa Viscidi, especialista da
consultoria americana Energy
Intel. "Mas parte dos recursos
deve ser usada, em velocidade
adequada, para resolver problemas sociais e cobrir parte da
dívida pública." Para especialistas, a aplicação em ações, títulos e projetos de longo prazo
ajuda a preservar os recursos
para gerações futuras.
Riscos
A revisão dos royalties já cria
polêmica. Municípios do Rio de
Janeiro campeões no recebimento dessas receitas criticam
a possibilidade de mudança,
defendida pela maioria dos especialistas. "A União deve ficar
com a maior parte do dinheiro
por ser dona das reservas e precisa levá-lo até a população do
Acre, que não tem petróleo",
afirma Lessa.
Primeiro presidente da
Agência Nacional do Petróleo,
o consultor David Zylbersztajn
considera as discussões prematuras. "Isso é debate para depois que a Petrobras concluir
seus testes e avaliar de fato o
potencial do pré-sal, ainda pouco conhecido. Até lá, estamos
discutindo a quem dar um cheque pré-datado que não sabemos se terá fundos."
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