|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros
Marina quer priorizar educação e evitar temas mais polêmicos
Ao se aproximar de economistas
como Eduardo Gianetti, candidata
assumiu compromisso com a
austeridade fiscal ; cortes
financiariam obras que sigam
modelo de descarbonização
MARINA TAMBÉM PROMETE AUMENTAR FUNDOS E SERVIÇOS EM SAÚDE E SEGURANÇA SEM ESCLARECER BEM DE ONDE SAIRÁ O DINHEIRO
MARCELO LEITE
DE SÃO PAULO
O Brasil de Marina Silva
será um país austero. Sob vários aspectos, até mesmo
conservador. Não, porém,
convencional, como se espera de uma presidente verde.
Sua prioridade estará na
educação, não no ambiente.
Em lugar de um Plano de
Aceleração da Sustentabilidade, quer marcar sua eventual gestão por um PAE, com
"e" de educação e alvo na
inovação tecnológica.
O conservadorismo religioso da candidata do PV
pouco ou nada influenciará
suas políticas. Confrontada
com questões sensíveis como liberalização do aborto,
ela sai pela tangente com a
proposta de plebiscito.
Em 125 proposições apresentadas por ela durante
dois mandatos no Senado,
nenhuma parece obviamente relacionada a igrejas evangélicas, como a sua Assembleia de Deus.
AUSTERIDADE FISCAL
É na gestão da macroeconomia que se revelará sua face mais conservadora.
Assessorada por economistas como Eduardo Giannetti da Fonseca, Marina assumiu compromisso com a
manutenção da política econômica de FHC e Lula, calcada em metas de inflação,
câmbio flutuante e independência do Banco Central.
O passo adiante será deslocar a ênfase da taxa de juros para o controle do gasto
público. Um dos raros compromissos quantitativos nas
diretrizes para um programa
de governo é a meta de restringir o aumento da despesa
a 50% do avanço do PIB.
Fala-se, também, em reduzir o número de cargos federais de livre provimento. Na
mesma linha, as diretrizes
prometem rever "programas
extraordinários de anistia
fiscal", como o Refis.
A obtenção de altos superavits primários não terá por
objetivo financiar o consumo, e sim aumentar a capacidade de investimento do Estado. Não em um rol de obras
de interesse de oligarquias
estaduais e empresários apadrinhados pelo BNDES, como no PAC, mas com planejamento balizado pela descarbonização da economia.
ENERGIA E PRÉ-SAL
Este é o sentido mais profundo em que o novo governo seria conservador, o da
sustentabilidade. Em lugar
de dissipar recursos naturais
num crescimento a qualquer
preço, a gestão verde prescreve parcimônia, para preservar condições de desenvolvimento no longo prazo.
Subsídios para vendas de
veículos, só contra compromissos de redução no consumo de combustíveis e emissão de poluentes.
Crédito para aumentar o
produto da agropecuária
com ganhos de produtividade e conversão de pastos degradados, não para mais desmatamento.
Uma administração Marina Silva decerto não contribuirá para construir as 4 a 8
usinas atômicas programadas por Lula. Pode até criar
caso com Angra 3, além da
hidrelétrica Belo Monte.
Não abrirá mão, porém, do
pré-sal, ainda que a queima
de derivados do petróleo seja
a maior fonte planetária de
gases do efeito estufa.
O programa Marina Silva
prevê combate ao aquecimento global, inclusive com
a criação da Agência Nacional do Clima.
Para conciliar uma coisa e
outra, propõe utilizar a renda
presenteada pelo pré-sal para financiar a transição para
uma economia sem petróleo,
ou, no jargão verde, sem
"carbono".
Aqui, também, a gestão
verde poderá frustrar o ambientalista mais crédulo no
poder verde. Além da falta de
espaço para manobrar uma
marcha à ré nos transgênicos, em Angra 3 e Belo Monte, Marina Silva terá de planejar a construção de hidrelétricas na Amazônia.
Nem mesmo uma política
agressiva de fomento às fontes alternativas renováveis,
como energia eólica (ventos)
e biomassa (bagaço de cana)
permitiria abrir mão desse
potencial.
Terão licenças ambientais,
contudo, só aqueles empreendimentos -como as
usinas do rio Madeira aprovadas pela então ministra-
com equação econômico-ambiental mais favorável.
UM ITA PARA O NORTE
O norte de seu programa
não está nas matas do Acre
nem nos assentamentos de
reforma agrária. O Brasil desenhado pelos verdes combina mais com o Instituto Tecnológico Vale (ITV) que a mineradora ergue em Belém,
espécie de ITA amazônico.
Recursos naturais -terras
cultiváveis, água, biodiversidade, insolação, minérios,
petróleo etc.- são as vantagens comparativas do país
na economia do século 21,
mas nada valerão sem tecnologia para explorá-las de forma sustentável.
Daí a prioridade para reverter o apagão de recursos
humanos, aumentando o investimento em educação para 7% do PIB.
O Bolsa Família prosseguirá, mas com atenção para a
"porta de saída": qualificação. Como todo candidato,
Marina também promete aumentar fundos e serviços em
saúde e segurança pública
sem esclarecer bem de onde
sairá o dinheiro.
Ao menos no caso da qualificação, a proposta é reproduzir a experiência com o
programa de combate ao
desmatamento da Amazônia: reunir verbas e pessoal
já disponível em outros ministérios e níveis de governo.
Levantamento preliminar
indicou haver cerca de 320
mil agentes de campo no
país, do Programa de Saúde
da Família aos extensionistas e professores rurais.
Marina quer que eles passem a encaminhar beneficiários do Bolsa Família para os
cursos e outras oportunidades de qualificação disponíveis na sua região.
FALTA O MAPA
O Brasil de Marina Silva
está até que bem esboçado,
mas verde.
Falta-lhe um roteiro para
contornar os obstáculos que
serão erguidos por ocupantes da máquina pública alérgicos a cortes de gastos e cargos, agroempresários consumidores de florestas, capitais
viciados em carbono e um
Congresso Nacional avesso a
qualquer inovação.
O mais convencional do
programa verde está nas prometidas reformas política,
tributária e previdenciária.
Com muito mais cacife político, FHC e Lula avançaram
pouco. Falar em Constituinte
exclusiva para desatar esses
nós é tão evasivo quanto propor plebiscitos para questões
sobre aborto e drogas.
Marina Silva tem um plano B, contudo: fazer mudanças operacionais sem ter de
aprovar novas leis.
No campo tributário, por
exemplo, cogita tornar a
apuração do valor devido em
cada imposto uma responsabilidade do Fisco. Ao contribuinte competiria só fornecer as informações e pagar o
indicado, como no caso do
imposto de renda. Seria uma
inovação e tanto.
Texto Anterior: Campanha em 5 momentos Próximo Texto: Campanha em 5 momentos Índice | Comunicar Erros
|