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COMO FICOU - FERROVIA NORTE-SUL
Procurador vê superfaturamento, mas não faz denúncia no prazo
Caso vai a Brasília, ao RJ, volta e é arquivado
ANTONIO CARLOS SEIDL
da Reportagem Local
Com o arquivamento, em 3 de maio de
1988, do inquérito policial para apurar a
denúncia de fraude na concorrência para
a construção da ferrovia Norte-Sul, projetada para ligar o Maranhão a Brasília, ficaram impunes os responsáveis pelas supostas irregularidades ocorridas na licitação para uma das obras públicas mais caras do governo Sarney (1985-1989), avaliada em US$ 2,4 bilhões.
O caso Norte-Sul começou com reportagem sobre irregularidades no processo
de licitação, feita pelo jornalista Janio de
Freitas, na edição de 13 de maio de 1987 da
Folha, em título de primeira página, com
o seguinte enunciado: "Concorrência da
ferrovia Norte-Sul foi uma farsa".
Na reportagem, Janio de Freitas, que
hoje, além de colunista, é membro do
Conselho Editorial do jornal, qualificou
de "fraudulenta e determinada por corrupção" a concorrência para a construção
da Norte-Sul, cujos resultados o governo
divulgara no dia anterior, 12 de maio.
A revelação feita pela Folha tinha como
base o fato de o jornal ter publicado os 18
vencedores -a ferrovia projetada para
ter 1.570 km, de Imperatriz, no Maranhão, a Luziânia, em Goiás, tinha sido dividida em 18 lotes- cinco dias antes da
abertura dos envelopes com as propostas
concorrentes pela Valec, empresa estatal
vinculada ao Ministério dos Transportes,
responsável pela realização da concorrência e supervisão da construção da ferrovia.
Até hoje, do total previsto, apenas 106
km -no trecho entre Açailândia e Imperatriz, no Maranhão- foram concluídos.
Outros 120 km -entre Imperatriz e Estreito, também em território maranhense- fazem parte do programa "Brasil em
Ação", do atual governo federal.
Reagindo à repercussão da reportagem
de que os resultados já eram conhecidos antes mesmo da abertura
dos envelopes com
as propostas concorrentes, o então
presidente da República, José Sarney, hoje senador
(PMDB-AP), determinou a abertura de inquérito
pela Polícia Federal.
O então ministro
dos Transportes,
José Reinaldo Tavares, nomeou
uma comissão administrativa para
apurar "possíveis
irregularidades".
O inquérito policial concluiu pela inexistência de irregularidades, depois de
ouvir 52 pessoas, entre as quais os membros da diretoria da Valec, todos os presidentes das construtoras concorrentes, o
ministro dos Transportes e o jornalista Janio de Freitas.
Mas o Ministério Público da União, representado pelo procurador da República
Guilherme Magaldi Netto, não aceitou as
conclusões do inquérito policial.
Magaldi baseou o seu ponto de vista no
próprio inquérito da PF, que apontou que
o diretor da Valec, Francisco Cunha, revelara às empreiteiras, em 27 de abril de 87,
a pontuação por elas obtida na fase de
pré-qualificação para a construção da ferrovia.
O parecer de Magaldi, de 21 de agosto de
87, diz que essa antecipação possibilitaria
um eventual oferecimento de denúncia
pela infração penal ao artigo 325 do Código Penal, segundo o qual constitui infração, punida com pena de seis meses a dois
anos de detenção, a revelação de fato que
o funcionário público tem ciência em razão do cargo e que deveria permanecer
em segredo.
Embora convicto da existência de infração penal, que teria sido cometida pelo diretor da Valec, o procurador Magaldi, em
vez de oferecer a denúncia criminal, pediu
ao Procurador Geral da República na época, o ex-presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) ministro Sepúlveda Pertence, para remeter o inquérito para o Ministério Público do Rio de Janeiro.
Magaldi alegou que a remessa do inquérito era necessária porque "todos os atos
do processo licitatório se desenrolaram
na cidade do Rio de Janeiro".
No Rio, o processo ficou sob a responsabilidade do procurador Juarez Tavares,
que concluiu que os diretores da Valec
elevaram os preços das obras em 300%,
praticando assim crime de peculato contra o Tesouro.
Tavares não
apresentou denúncia criminal
contra os suspeitos dentro do prazo legal. O processo foi devolvido ao
procurador-geral
da República em
Brasília.
De volta a Brasília, o processo foi
distribuído ao
procurador Eugênio José Guilherme de Aragão,
que, em seu parecer, datado de 3 de
maio de 88, pediu
o seu arquivamento.
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